Como foi o encontro dos povos Wapixana com os brancos?
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Resposta:
Habitantes de uma fronteira, fruto de partilha colonial, os povos indígenas dos campos e serras do médio e alto rio Branco - entre eles, os Wapichana - vivenciaram um duplo processo colonizatório a partir de meados do século XVIII. Vindos do vale amazônico, os portugueses inicialmente atingiram a população indígena no rio Branco por meio de expedições para apresamento de escravos e, em fins do século, ali estabeleceram aldeamentos.
Já os holandeses, por sua vez, alcançaram a região através de uma extensa rede de troca de manufaturados por escravos índios. Após a cessão da Guiana aos ingleses, no bojo das guerras napoleônicas, o interior da colônia permaneceria, por longo tempo, intocado: sua organização administrativa viria a ocorrer apenas ao final do século XIX, a ocupação consolidando-se já no século XX.
Ao longo do século XIX, a colônia inglesa, centrada na produção de açúcar na região costeira, empenhou-se na importação maciça de trabalho indígena, em substituição ao trabalho escravo africano. Assim, a pecuária nos campos do rio Rupununi, apoiada em mão-de-obra indígena, teria início na década de 90 do século XIX, em pequena escala, atingindo moldes empresariais apenas na década de 30 do século XX.
Índios Wapichana, maloca do Tuxauá Terêncio, Rio Jaca Mirim, Roraima. Foto: IR1/SPI/Museu do Índio, 1927
Índios Wapichana, maloca do Tuxauá Terêncio, Rio Jaca Mirim, Roraima. Foto: IR1/SPI/Museu do Índio, 1927
Para o vale do rio Branco, pode-se igualmente dizer que, apesar desta primeira fase de escravização e aldeamento no século XVIII, o contato se intensifica com a ocupação fundiária, que se inicia com a chegada de colonos civis na segunda metade do século XIX. Com efeito, a colonização civil, que consolida a economia pecuária da região, inaugura a espoliação de territórios indígenas.
A ocupação de terras nesta região fez-se acompanhar de mecanismos de arregimentação da população indígena para as camadas mais baixas da sociedade regional que então se formava.
Segundo o cronista Lobo D´Almada (1861 [1787]), os Paravilhanos, Aturahis e Amaribás localizavam-se entre as cabeceiras do rio Tacutu e o Rupununi. Os Wapichana, por sua vez, ocupavam as serras vertentes do rio Mau até as do rio Parimé.
O relato do viajante R. H. Schomburgk (1903 [1836-9]), que explora a região entre os anos 30 e 40 do século XIX, fornece pistas importantes sobre as trajetórias seguidas pelos povos no rio Branco em período imediatamente posterior ao século XVIII. Depreende-se de seu relato que, nas primeiras décadas do século, os povos habitantes da área oeste do rio Branco estavam em refluxo para áreas ainda mais a oeste, em direção à bacia do rio Orinoco, e passavam por processos de absorção entre etnias, o que talvez possa responder pela desaparição de alguns etnônimos em fontes posteriores.
No leste do vale, Schomburgk igualmente observa um processo de refluxo territorial: os Wapichana e outros povos habitantes entre as serras da Lua e Carumá, tais como os Atorai e Amariba, teriam migrado para o extremo leste.
Julgava ainda, embora equivocadamente, que os Paraviana houvessem migrado em direção ao Amazonas. A menção à suposta migração dos Paraviana é, no entanto, importante pelo que atesta de sua desaparição àquela altura do século XIX, embora fossem tidos como um dos povos mais numerosos no rio Branco no século XVIII (Ribeiro de Sampaio, 1872 [1777]).
Grupo Wapixna posado, maloca Serra da Malacacheta, Terra Indígena Malacacheta. Foto: IR1/SPI - Acervo Museu do Índio, 1927
Grupo Wapixna posado, maloca Serra da Malacacheta, Terra Indígena Malacacheta. Foto: IR1/SPI - Acervo Museu do Índio, 1927
Pode-se supor que, brutalmente atingidos pela escravidão e pelo aldeamento empreendidos pelos portugueses no século XVIII, como o foram, os Paraviana cedo hajam se incorporado aos Wapichana. Tal processo parece ter ocorrido lentamente, ao longo do século XIX e início do XX, entre os povos que Schomburgk então considerava “aparentados” aos Wapichana, ou seja, Atorai e Amariba, bem como os Tapicari e Parauana, pois que, nos anos 30 do século XX, o lingüista e missionário beneditino M. Wirth a todos relacionaria como grupos dialetais dentre os Wapichana.
As epidemias, que se sucederam desde o período colonial, decerto contribuíram para uma depopulação. Sabe-se que uma epidemia de varíola, iniciada no rio Negro, na década de 80 do século XIX, provavelmente se disseminou no rio Branco, trazida pelos índios que fugiam dos batelões em quarentena. Outra epidemia, dessa vez a gripe, de grandes proporções, veio a grassar na Guiana, atingindo sobretudo a população Atorai e Wapichana, ao final dos anos 20 do século XX.
Durante o século XIX, o recrutamento forçado de mão-de-obra indígena não cessou no rio Branco, canalizado, nas primeiras décadas do século, para as povoações no rio Negro. Tal demanda tendeu a crescer exponencialmente com a exploração do caucho e da balata no baixo rio Branco, a partir dos anos 50 do século XIX.
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