Um poema cresce inseguramente
na confusão da carne,
sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto, talvez como sangue
ou sombra de sangue pelos canais do ser.
Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência ou os bagos de uva de onde nascem
as raízes minúsculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalteráveis
do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silêncio,
as sementes à beira do vento,
– a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.
E já nenhum poder destrói o poema. Insustentável, único,
invade as órbitas, a face amorfa das paredes, a miséria dos minutos,
a força sustida das coisas,
a redonda e livre harmonia do mundo.
– Embaixo o instrumento perplexo ignora a espinha do mistério.
– E o poema faz-se contra o tempo e a carne.
HELDER, Herberto. Sobre o Poema. Disponível em: . Acesso em: 16 out. 2011.
O texto anterior sugere uma reflexão sobre uma certa concepção do que seja a escrita de poesia. Fundamentado no poema, a concepção poética proposta baseia-se
A. no estado de inspiração do poeta, que escreve o poema todo de uma só vez.
B. na denúncia das mazelas do mundo circundante.
C. na crença no poder de transformação do leitor que a
arte possui.
D. na escrita da própria existência do poeta, como maneira de curar seus traumas.
E. na aceitação do poema como substância que necessita de tempo para ser processada e produzida.
Soluções para a tarefa
A. no estado de inspiração do poeta, que escreve o poema todo de uma só vez.
Falso. O autor fala que "o poema faz-se contra o tempo", o que sugere um processo mais demorado.
B. na denúncia das mazelas do mundo circundante.
Falso. A denúncia não parece ser algo central, já que o poema cresce a despeito do mundo exterior.
C. na crença no poder de transformação do leitor que a arte possui.
Falso. O autor parece estar descrevendo, na realidade, o processo criativo do poema.
D. na escrita da própria existência do poeta, como maneira de curar seus traumas.
Falso. O autor parece descrever o poema com o algo que, embora seja originado por ele, tem vida própria, já que "o poema cresce tomando tudo".
E. na aceitação do poema como substância que necessita de tempo para ser processada e produzida.
Correto. O autor aponta para as fases na construção do poema, indicando a dinâmica origem deste, e sua relação com o mundo "fora".