Texto II A família dos porquês
A lógica costuma definir três modalidades distintas no uso do termo “porque”: o “porque” causa (“a jarra espatifou-se porque caiu ao chão”); o explicativo (“recusei o doce porque desejo emagrecer”); e o indicador de argumento (“volte logo, você sabe por quê”). O pensamento científico revelou-se uma arma inigualável quando se trata de identificar, expor e demolir os falsos porquês que povoam a imaginação humana desde os tempos imemoriais: as causas imaginárias dos acontecimentos, as pseudoexplicações de toda sorte e os argumentos falaciosos. Mas o preço de tudo isso foi uma progressiva clausura ou estreitamento do âmbito do que é ilegítimo indagar. Imagine, por exemplo, o seguinte diálogo. Alguém sob o impacto da morte de uma pessoa especialmente querida está inconformado com a perda e exclama: “Eu não consigo entender, isso não podia ter acontecido, por que não eu? Por que uma criatura tão jovem e cheia de vida morre assim?!”. Um médico solícito entreouve o desabafo no corredor do hospital e responde: “Sinto muito pela perda, mas eu examinei o caso da sua filha e posso dizer-lhe o que houve: ela padecia, ao que tudo indica, de uma má-formação vascular, e foi vítima da ruptura da artéria carótida interna que irriga o lobo temporal direito; ficamos surpresos que ela tenha sobrevivido tantos anos sem que a moléstia se manifestasse”. A explicação do médico, admita-se, é irretocável; mas seria essa a resposta ao “por quê” do pai inconsolável? Os porquês da ciência são por natureza rasos: mapas, registros e explicações cada vez mais precisas e minuciosas da superfície causal do que acontece. Eles excluem de antemão como ilegítimos os porquês que mais importam. O “porquê” da ciência médica nem sequer arranha o “por quê” do pai. Perguntar “por que os homens estão aqui na face da Terra”, afirma o biólogo francês Jacques Monod, é como perguntar “por que fulano e não beltrano ganhou na loteria”. No macrocosmo não menos que no microcosmo da vida, as mãos de ferro da necessidade brincam com o copo de dados do acaso por toda a eternidade. Mas, se tudo começa e termina em bioquímica, então por que – e para que – tanto sofrimento? In: GIANNETTI, Eduardo. Trópicos utópicos. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. p. 25-26. Adaptado.7 4) A pergunta retórica é uma interrogação que não tem como objetivo obter uma resposta, mas sim estimular a reflexão do indivíduo sobre determinado assunto. Nesse contexto, qual é a crítica e a insinuação que o autor faz ao final do texto com sua indagação retórica? *
a) O autor evidencia que uma simples explicação científica para o sofrimento é suficiente para lidar com ele.
b)O autor evidencia que, na realidade, ninguém sofre com as causas de morte quando estas estão baseadas em uma explicação.
c)O autor evidencia que uma simples explicação científica para o sofrimento não é suficiente para lidar com ele.
d)O autor evidencia que todos vão morrer um dia e a pergunta retórica não condiz com a realidade que todos conhecem.
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A alternativa correta é a letra c)O autor evidencia que uma simples explicação científica para o sofrimento não é suficiente para lidar com ele.
A pergunta retórica foi usada pelo autor com o objetivo de apresentar a explicação científica não é capaz de amenizar um sofrimento de um indivíduo.
No texto, o autor relata a situação da morte de uma menina, que foi vítima de ruptura da artéria carótida interna. A notícia foi dada pelo médico ao pai da menina.
Em seguida, o pai fica arrasado ao saber que a sua filha morreu. O fato é que, mesmo relatando o motivo da morte, o pai da menina continuou sofrendo.
Por isso o autor diz que a explicação científica não é capaz de fazer com que alguém sofra menos.
Abraços!
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