Português, perguntado por julialimasimas10, 8 meses atrás

Resenha Crítica do filme zootopia

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Respondido por Adebochadah
5

Dos mesmos criadores de Frozen e Operação Big Hero, Zootopia teve a melhor bilheteria de estreia da história da Disney nos EUA. O filme é realmente muito bom e bem divertido, do tipo que tem piadas para as crianças e para os adultos. ... O filme consegue abordar questões delicadas de modo suave.

Respondido por joycesb66
14

Resposta:

Zootopia demonstra grande criatividade no desenvolvimento deste mundo animal. A trama se inicia quando predadores e presas já eliminaram seu “comportamento animalesco ancestral” para viverem em harmonia. Os diretores Rich Moore e Byron Howard se divertem com as diferentes proporções, imaginando lugares grandes demais para caberem girafas, ou pequenos demais para comportarem habitações de camundongos. As espécies funcionam como analogias claras à pluralidade étnica, de orientação sexual e de gênero existente nas grandes cidades. Mas ao invés de caminhar do caos à utopia, como na maioria das animações otimistas, essa faz o caminho inverso, iniciando pela paz absoluta até nascerem os conflitos.Sem entregar spoilers, basta dizer que o conflito principal diz respeito ao retorno de alguns animais ao comportamento selvagem de antigamente. A bestialidade, a violência e a lei do mais forte são tratados como um passado aberrante que a civilização tratou de eliminar por meio de leis e da moral. É admirável que o duelo central do roteiro se dê entre determinismo biológico e dinamismo cultural, em outras palavras, entre o que se espera de uma pessoa por sua constituição física, e o que ela é capaz de fazer para além dos moldes da sociedade.

A coelha Judy é uma metáfora perfeita para o tema, sendo ao mesmo tempo mulher, de tamanho limitado e apaixonada pela profissão de policial, tipicamente masculina. Seus colegas, a maioria homens grandes e fortes, esperam que ela seja dócil, fraca e incapaz de executar o trabalho, e mesmo os pais amorosos reproduzem o preconceito de gerações anteriores, suplicando à filha que não trabalhe como policial para se poupar dos riscos da profissão. Os preconceitos vão de níveis sutis a ofensivos, e Judy enfrenta-os com um senso de determinação exemplar. Zootopia cita explicitamente as palavras “preconceito”, “biologia”, “cultura”. Em tempos de Jair Bolsonaros e Donald Trumps, o preconceito é combatido de maneira frontal e corajosa. Mesmo a canção tema, ao invés de pregar uma paz genérica, ensina os pequenos a “tentarem de tudo”, experimentarem o que quiserem, mesmo que falhem ou mudem de ideia mais tarde.

A narrativa torna-se ainda melhor porque Zootopia busca a reflexão ao invés da doutrinação. Muitas animações limitam-se a ditar às crianças o que devem fazer: “Preserve a natureza”, “Ame sua família”, “Seja gentil com os colegas”. Mas o roteiro deste filme explica porque as crianças não deveriam ser preconceituosas, mostrando passo a passo como nascem os preconceitos, passando pela cultura do medo e pelo fantasma da tradição, além do já citado “papel biológico” de cada pessoa na sociedade. Estas discussões são embaladas pelas regras do suspense policial, com direito a uma longa investigação, sombria e cheia de significados, que rompe com o aspecto frenético e episódico que tem pautado as histórias infantis. Zootopia respeita o seu público, apostando na capacidade de acompanhar um caso parcimonioso.

Tamanho aprofundamento poderia se tornar aborrecido, mas o filme mantém seu aspecto solar e colorido com ótimo bom humor. Apesar de alguns clichês dispensáveis (o preconceito do servidor público como sinônimo de lentidão), as piadas servem para parodiar nossa pós-modernidade marcada por tecnologia avançada e dificuldades de relacionamento. As piadas são muito divertidas, os personagens principais possuem um aprofundamento exemplar e as citações a Breaking Bad e O Poderoso Chefão devem agradar aos pais. Contribuindo ao acabamento do conjunto, a dublagem brasileira é impecavelmente construída.

É claro que alguns temas não ganham o aprofundamento que mereceriam, e que a solução de ordem médica, rumo à conclusão, não representa com exatidão a aversão às diferenças. Mas numa época de discursos reacionários, é louvável encontrar uma animação infantil que debata, por meio do humor, temas como o preconceito, o machismo, o racismo, a homofobia, o consumo de drogas e as tensões entre classes sociais, sem precisar embutir artificialmente uma história de amor romântico ou familiar. Através da metáfora do comportamento selvagem, a Disney conseguiu representar os perigos que assolam as sociedades intolerantes de hoje em dia.

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