Questão adaptada do livro Novas palavras: português, volume único. Emília Amaral... [et al.]. 2ª ed. São Paulo. FTD, 2003.
Ler um texto não é somente de extrair informação, decodificando palavra por palavra. Uma boa leitura implica estratégias de seleção, de antecipação, de verificação e de inferência, sem as quais não é possível uma leitura proficiente.
Leia os textos 1 e 2 para responder à questão.
Texto 1
Isto
Dizem que finjo ou minto
Tudo que escrevo. Não.
Eu simplesmente sinto
Com a imaginação.
Não uso o coração.
Fernando Pessoa
Texto 2
E o trabalho, este nosso trabalho de escrever? Meu Deus, como às vezes chega a ser sórdido! Aquele riscar, aquela grosseria do texto primitivo, aquele tatear atrás da palavra desejada e, ainda pior, da combinação de palavras desejada! A guacherie do que sai escrito - tanta beleza que a gente sonhou, depois de posta no papel como ficou inexpressiva, barata e normal! Já dizia tão bem o velho Bilac: “A palavra pesada abafa a ideia leve! - e não é mesmo?
Rachel de Queiroz
Gaucherie - falta de jeito. Do francês gauche: esquerdo; canhoto.
Os textos têm assunto comum, pois discutem:
a dificuldade de expressar de forma escrita comum a todos os escritores, que têm que idealizar um texto sem saber de que forma ele será interpretado pelo leitor.
O argumento da criação artística do escritor, que sofre severamente com a imposição do leitor a despeito das obras originais.
a própria linguagem na questão da criação artística, da forma como o escritor idealiza e materializa o seu texto.
a importância da crítica literária e do leitor para que o escritor idealize e materialize seus textos, criando uma forma produtiva e agradável.
o argumento de que os textos literários dependem única e exclusivamente da inspiração dos grandes escritores.
Soluções para a tarefa
a própria linguagem na questão da criação artística, da forma como o escritor idealiza e materializa o seu texto.
Ambos podem ser apresentados como textos de caráter metalinguísticos, isto é, a linguagem tem grande relevância para a composição dos mesmos, sendo por isso um fator determinante.
Os textos apresentam, ainda que de formas distintas, os pontos de vista do eu lírico acerca do processo da escrita, que por vezes pode apenas representar um fazer inerente à inspiração, mas também pode ser árduo e difícil.
Resposta: c
Os dois textos, de natureza metalingüística, focalizam
o ato de escrever, a escrita artística. O fragmento do
poema de Fernando Pessoa retoma a teoria estética
dos antológicos “Autopsicografia” (“O poeta é um fingidor”) e “Ela canta, pobre ceifeira” (“Tudo o que em
mim sente ‘sta’ pensando”). É comum a estes metapoemas a noção da poesia como “representação”
artística, a dessacralização da teoria romântica da
“poesia de inspiração”.
O texto de Rachel de Queiroz fala das dificuldades do
trabalho de escrever na mesma direção de “O lutador”, de Carlos Drummond de Andrade (“Lutar com
palavras/ é luta mais vã”).
As alternativas a, d e e são ineptas, pois envolvem a
recepção da obra pelo leitor ou pela crítica, e os textos
não falam disso. A alternativa b é o oposto daquilo que
dizem Fernando Pessoa e Rachel de Queiroz, pois
traduz exatamente a concepção romântica da escrita
literária, tida como fruto da inspiração, como um
“dom” do artista, obra do “gênio” criador