Música, perguntado por Usuário anônimo, 1 ano atrás

Qual o contexto evidenciado pelo música Opinião do compositor Zé Ketli? Explique.

Me ajudem por favor!!

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Respondido por eduardoce877139
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Segundo álbum da discografia individual de Nara Leão (1942-1989), Opinião de Nara revela uma artista atenta ao contexto político-social do país da década 1960 e interessada em divulgar um tipo de música que ela acredita ser a expressão genuína do povo brasileiro. O repertório é composto de sambas do morro carioca e cantigas regionais nordestinas.

Lançado em novembro de 1964, o trabalho anuncia o tom de protesto do show Opinião, que estreia no mês seguinte, no Rio de Janeiro, reunindo no palco do teatro Arena, Nara, Zé Kéti (1921-1999) e João do Vale (1933-1996), sob direção de Augusto Boal (1931-2009). Algumas canções do espetáculo aparecem no disco da cantora. A começar pela faixa inicial, que dá título ao disco “Opinião”, de Zé Kéti, cujos versos desafiam a ditadura militar recém-instaurada no Brasil:

“Podem me prender / podem me bater / podem até deixar-me sem comer / que eu não mudo de opinião”.

“Sina de caboclo”, de João do Vale e J. B. De Aquino, traz à tona a questão agrária do país:

“O que eu colho é dividido / com quem não plantou nada”; e “Esse mundo é meu”, de Sérgio Ricardo (1932) e  Ruy Guerra (1931), instiga à luta: “Se você não vem / eu mesma vou brigar”.  A crítica social também está presente em “Acender as velas”, que Zé Kéti, que relata o desamparo de quem vive nos morros: “Acender as velas já é profissão / quando não tem samba, tem desilusão”. O tom se equilibra entre o pessimismo e a esperança. Na súplica “Em tempo de adeus”, de Edu Lobo (1943) e Ruy Guerra, ela entoa: “Alguém escreva para mim / numa primavera qualquer / a palavra liberdade / junto ao meu desespero”. Já em “Chegança”, [Edu Lobo/ Oduvaldo Vianna Filho (1936-1974)], procura antever dias melhores: “Trazendo na chegança / foice velha, mulher nova / e uma quadra de esperança”.

Como resultado de uma viagem feita por diversas capitais do nordeste no ano interior, com o intuito de conhecer as raízes brasileiras, Nara dialoga em duas faixas com o toque do berimbau: “Birimbau” [João Mello (1921-2010) / Clodoaldo Brito (1913-1984)] e “Na roda de capoeira” (folclore). Em outras duas, investe na força rítmica da dupla Baden Powell (1937-2000) e Vinicius de Moraes (1913-1980): “Deixa” e no afro-samba “Labareda”.

No álbum, a cantora ainda revisita o passado, com a marcha-rancho “Mal-me-quer” [Newton Teixeira (1916-1990) / Cristóvão de Alencar (1910-1983)], e dá espaço ao lirismo de “Derradeira primavera” [Tom Jobim (1927-1994) / Vinicius de Moraes] em arranjo camerístico.

Embora filha de uma família abastada, tendo sido criada num apartamento em Copacabana que se tornaria famoso por abrigar reuniões de artistas da bossa nova, em Opinião de Nara ela lança seu olhar para além da elitista Zona Sul carioca, interessada em descobrir outros aspectos da vida cultural brasileira.

Em entrevista concedida à revista Fatos & Fotos, em outubro de 1964, Nara rejeita o título de “musa da bossa nova” e procura se distanciar do estilo ao qual estava ligada. “Essa história de dizer que a bossa nova nasceu em minha casa é uma grande mentira”, declara a cantora. “A turma se reunia aqui e também em muitos outros lugares. Não tenho nada, nada mesmo, com um gênero musical que, sinto, não é meu nem é verdadeiro”.

A contundência das afirmações é reflexo do posicionamento político de Nara, que se mostra alinhada aos ideais de esquerda. Convivendo e trabalhando com os diretores do cinema novo e com os artistas ligados ao Centro Popular de Cultura da União Nacional do Estudantes (CPC-UNE), a cantora entende a arte como instrumento de transformação social, além do mero entretenimento. No encarte do álbum, ela assina o seguinte texto:

Este disco nasceu de uma descoberta, importante para mim: a de que a canção popular pode dar às pessoas algo mais que a distração e o deleite. A canção popular pode ajudá-las a compreender melhor o mundo onde vivem e a se identificarem num nível mais alto de compreensão.

Nara defende a música que, a seu ver, seja original e autêntica, livre da influência da indústria cultural e feita por compositores do povo – a exemplo dos sambas assinados por autores como Cartola (1908-1980) e Zé Kéti. Essa intenção, que já aparecera em Nara (1963), seu disco de estreia, está mais evidente em Opinião de Nara, seu segundo LP.

Seu canto distancia-se do estilo contido tão característico da bossa nova – “que dá sono e não empolga”, nas palavras de Nara. Aqui, a voz de timbre delicado serve de instrumento para uma interpretação vibrante, como se a artista fosse um arauto empenhado em defender a mensagem que transmite. A própria capa do disco com layout de autoria do jornalista Jânio de Freitas, sugere essa imagem. De perfil, sobre um fundo branco, com os olhos fechados, boca entreaberta e braço estendido para o alto, Nara parece cantar – ou chamar o povo à luta.

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