Artes, perguntado por lualecmaker, 9 meses atrás

Qual a importância do touro nas culturas atuais?

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Respondido por Usuário anônimo
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Explicação:

As Touradas fazem parte do que se chama o "ethos" português, ou seja, o caráter, a identidade do nosso povo e da nossa cultura, que nos distinguem de todos os outros no mundo.  Na verdade, a Corrida de Toiros é, antes de mais e sobretudo, uma Festa. A Corrida sempre esteve ligada à festa e a festa é, por natureza, um período de ruptura com a vida quotidiana, um momento de comemoração onde a comunidade se reencontra e se recria.  A nossa época, mais do que qualquer outra, precisa de festas. A nossa modernidade faz-nos cada vez mais individualistas, fechados sobre nós próprios, no trabalho ou em casa. Vivemos assoberbados por esta necessidade de cumprir obrigações, de respeitar códigos e regras, sobrando-nos muito pouco tempo para estarmos com a família, e menos ainda para nos inserirmos na comunidade – muitos já só o fazem através de redes sociais. E é na festa que muitos dos membros da comunidade têm essa hipótese de interagirem entre si, de se reencontrarem, porque a festa se faz na rua, em público, em conjunto.  Praticamente todas as Corridas de Toiros acontecem inseridas em festas locais. Aí, os povos habituados aos toiros exigem que se dêem Corridas de Toiros.  As Touradas têm, nessas localidades, uma importantíssima função social, funcionando como válvula de escape das tensões que se vão criando ao longo do ano. Como nota o sociólogo Luís Capucha, a festa "suspende a ordem das desigualdades quotidianas, recriando um mundo tumultuoso e caótico em que todos voltam a ser mais iguais, compensando com consumos excessivos e normalmente proibidos as penúrias do dia-a-dia. Assim se «compensam» as carências e, ao mesmo tempo, se demonstra como a vida seria impossível na desordem da festa. O momento do excesso e da excepção dá saída às tensões acumuladas e a comunidade reinstala a organização normal da vida social, incluindo as desigualdades da «vida real».  Em Portugal, a cultura taurina está tão enraizada que não se imaginam as Festas da Moita, de Alcochete, de Coruche, de Barrancos, da Ilha Terceira e de tantas outras sem Toiros. Nem o povo o permitiria. Porque a Corrida é, por excelência, o local onde o objectivo da festa mais facilmente se concretiza.  Na verdade, qualquer autarca de uma vila taurina se apercebe, em dois dias, da importância social da "Festa Brava". Com efeito, não existe, em Portugal, festa tão transversal à sociedade como a Festa dos Toiros e é, precisamente, essa característica centrípeta, que lhe permite cumprir, na perfeição, a sua função social. A Corrida de Toiros atrai pessoas dos mais variados estratos sociais, das mais variadas ideologias políticas, das mais variadas idades e das mais variadas zonas.  A arquitectura das praças de toiros é, aliás, muito reveladora acerca dos seus pressupostos e valores. Nas bancadas circulares de uma praça, em redor do redondel, não há distinções. Todos vêem tudo, tudo é visto por todos, e sobretudo, a comunidade vê-se a si própria, enquanto partilha um espectáculo comum, uma mesma cerimónia, que se desenrola segundo regras e ritmos por todos conhecidos. Esta unidade na igualdade cria uma consciência colectiva que não é a soma de várias consciências individuais, criando sentimentos comuns de identificação e contribuindo para se possa qualificar um determinado conjunto de pessoas como "povo".  E a Corrida de Toiros é precisamente, em muitas comunidades, o epicentro da criação dessa consciência colectiva, porque, como refere Luís Capucha "ao vencer o toiro, a cultura humana afirma a sua superioridade sobre a natureza animal que lhe está na base. E fá-lo afirmando o carácter colectivo dessa vitória. (...) A festa não é apenas ambivalente, por simultaneamente dar sentido à igualdade e à desigualdade, mas multivalente, por combinar as mais diversas polaridades, como as que resultam da relação contraditória entre a natureza e a cultura."  A Corrida de Toiros é, por isso, um elemento essencial das festas nas quais se insere. Aí, os membros das comunidades unem-se em torno de um mesmo objecto, criam laços que de outra forma nunca existiriam, fortalecem-se criando uma consciência colectiva, vivendo-se, em igualdade, uma experiência única e comum, que permite à comunidade perdurar enquanto tal. E permite aos seus membros continuar a festa pela noite dentro porque aquilo que afinal se viveu durante o dia foi o triunfo da vida sobre a morte.

Espero ter ajudado!

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