Porque os governos militares do Brasil fizeram um acordo com Alemanha em 1957?
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ACORDO NUCLEAR BRASIL-ALEMANHA FEDERAL DE 1957
O DESAFIO BRASILEIRO NA BUSCA DE SOBERANIA NACIONAL
O presente artigo propõe-se a analisar de forma concisa as consequências do Acordo Nuclear Brasil-República Federal da Alemanha (RFA), de 1975, na política externa do governo Geisel 2. Naquele momento, como atualmente, o debate sobre a questão energética refletia os anseios sobre a necessidade de garantia desse suprimento para o país através da diversificação e, naquele caso, investimentos para a aquisição completa de uma nova opção de energia: a nucleoelétrica. Através do Pragmatismo Responsável, o governo brasileiro conjugou a perspectiva de afirmação nacional com uma estratégia de elevação da autonomia internacional, determinando uma reavaliação das relações com os Estados Unidos. Através da “opção europeia” 3 (SARAIVA, 1990), o governo brasileiro orientou esforços para outros países de capitalismo avançado, como os da Europa Ocidental e o Japão, que ocuparam papel de destaque no processo de desenvolvimento econômico vigente no Brasil naquele período. Identificava-se um progressivo afastamento brasileiro da esfera norteamericana propiciado por uma maior rivalidade no bloco capitalista e nova localização de poder no cenário internacional.
Com uma conjuntura internacional adversa, provocada principalmente pelo impacto do primeiro choque do petróleo em 1973, que gerou recessão na economia internacional, o Brasil, baseado no projeto de potência do regime militar e motivado pelos altos índices de desenvolvimento econômico, orientou-se para uma estratégia de diversificação de parcerias acima de preconceitos ideológicos e consolidou uma atuação independente no cenário externo, processo em gradativa evolução desde o governo Costa e Silva (1967-1969) e que recuperou em parte os objetivos da Política Externa Independente, do início da década de 60, durante os governos de Jânio Quadros e João Goulart, que procurava basear a atuação diplomática do país de forma autônoma e universalista, aproximando-se, econômica e politicamente, de países asiáticos, africanos e países socialistas europeus. A possibilidade de participação na alta hierarquia do poder internacional, amparada na elevação ao “status” de potência, encontrou correspondência na cúpula do pensamento militar que, mesmo com a ampliação de relações diplomáticas com regimes contrapostos ideologicamente, foram justificados pela necessidade de obtenção de insumos fundamentais ao crescimento e ao desenvolvimento econômico brasileiro, além da conquista de novos mercados consumidores para escoamento das exportações brasileiras.
As ações e opções empreendidas no contexto internacional pelo governo brasileiro provocaram sérias tensões políticas e econômicas com os Estados Unidos, embora as divergências contribuíssem para moldar e confirmar, durante esse período, uma tentativa de atuação própria e soberana no contexto das relações internacionais. Naquele momento, a conjuntura interna nos Estados Unidos passava por um momento de grave instabilidade política em razão do conflito no Vietnã, onde suas forças armadas colecionavam sucessivas derrotas, e do escândalo de Watergate, que tornou público a espionagem republicana no Partido Democrata e levou o presidente Nixon 4 a renúncia em 1974. Tais acontecimentos geravam reflexos de fraqueza política em sua imagem internacional, além de relativo declínio econômico provocado pelo acirramento da concorrência com outras potências capitalistas como Japão e Alemanha Federal. O contexto internacional se caracterizava por uma flexibilização da Guerra Fria, apresentando uma aproximação entre os Estados Unidos e a China comunista e, antes disso, o entendimento com a União Soviética para a instauração do TNP (Tratado de Não-Proliferação nuclear), em 1967 e do SALT I (Strategic Arms Limitation Treaty), em 1972, a fim de limitar o acesso aos arsenais nucleares e abrir espaço para a contestação brasileira àquela nova ordem mundial.
Dessa maneira, a execução da política externa, sob o rótulo do Pragmatismo Responsável e Ecumênico, realizada pelo governo Geisel, acrescentou diversos pontos de conflito entre Brasília e Washington. Para o Brasil, a ambição de tornar-se detentor de tecnologia nuclear de forma autônoma, sem a interferência norteamericana que limitava as pretensões brasileiras, pode ser explicada dentro do contexto das transformações da atuação externa do Brasil, em que a perspectiva de autonomia nuclear perseguida pelo Brasil e consubstanciada, inicialmente, através do Acordo Nuclear com a Alemanha Federal, efetivou-se como o exemplo de maior impacto e evento mais representativo dos novos pressupostos da atuação independente da política externa brasileira. Historicamente, o Acordo Nuclear Brasil-RFA de 1975, e seus desdobramentos, representou o maior grau de divergência entre Brasília e Washington, com reflexos econômicos, políticos e estratégicos.