O QUE DIFERENCIA O PROLETARIADO DO PRECARIADO?
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O que há em comum os distribuidores de pizza que ganham 1 euro e 17 cêntimos por cada entrega e que se mobilizaram recentemente contra a redução desse valor para metade (e ganharam!), os voluntários que esta semana começaram a trabalhar à borla na feira do livro, os trabalhadores de call center que, há alguns meses, fundaram um novo sindicato e os estagiários do IEFP que se organizaram recentemente numa assembleia para combater os abusos? Serão eles o “precariado” emergente?
No final da década de 1990, o sociólogo francês Robert Castel utilizava pela primeira vez este conceito. Observando as mutações na produção, a multiplicação de estatutos entre emprego e não-emprego e a expansão de formas “atípicas” de trabalho, Castel constatava a emergência de uma “condição precária entendida como um registo próprio dentro dos trabalhadores assalariados”. Essa precariedade deixava de ser excepcional ou provisória e surgia, para um grupo cada vez maior de pessoas, como um estado permanente. Castel chamou a esse estado de “precariado”. Uns anos mais tarde, um economista inglês, Guy Standing, escreveu um livro polémico (publicado no final do ano passado em Portugal), chamado “O Precariado: A Nova Classe Perigosa”. A sua tese é clara: estamos perante a emergência de uma nova classe, definida pela insegurança laboral, pela dependência do salário direto e pela ausência de uma “identidade baseada no trabalho”, que precisaria de encontrar a sua agenda política e formas próprias de representação.
No início dos anos 2000, primeiro em Milão e depois por toda a Europa, surgia um movimento que dava expressão autónoma a estes trabalhadores. Juntando precários e migrantes, o MayDay era uma manifestação peculiar, com uma estética visual pop que a aproximava mais das Love Parades do que dos tradicionais desfiles sindicais. Em apenas dois anos, a parada dos precários ultrapassava, em dimensão, os desfiles organizados pelas centrais sindicais italianas.
Nos últimos anos, muitos observadores olham para o precariado como o grande protagonista das mobilizações sociais que percorreram o planeta desde o final de 2010. Também por isso, têm chamado a esses protestos “a rebelião do precariado”. Nas recentes eleições espanholas, o terramoto provocado pelos indignados e a mobilização política e eleitoral do “precariado” são dois dos factores que têm sido utilizados para explicar os resultados do Podemos e das alianças da esquerda alternativa.
Mas fará sentido falar em “precariado”? Será o seu crescimento uma tendência incontornável da economia? Trata-se de uma nova classe? E residirá no precariado a chave para as transformações políticas do futuro?
Mais do que uma classe à parte, o precariado é uma parte da classe trabalhadora. Qual? A que está mais exposta às mutações do mundo do trabalho e à sua desregulação. Também por isso, está mais distante das formas clássicas de representação e organização, como os sindicatos e os partidos. Com vínculos instáveis, empregos periféricos no sector informal da economia, trabalho não declarado, as atividades do precariado exercem-se à margem da proteção social e, muitas vezes, da própria cobertura legal. E a experiência subjetiva do precariado extravasa o domínio laboral. Constitui-se, para alguns, como um modo de vida marcado pela insegurança e pela imprevisibilidade relativamente ao futuro.
No precariado que se tem mobilizado encontram-se os vestígios de uma classe operária afetada pela subcontratação da mão-de-obra, pelo aumento do desemprego e pela precarização dos vínculos (em Portugal, se somarmos os trabalhadores da indústria e da construção, temos 20% da força de trabalho, segundo dados do Banco de Portugal de maio deste ano). Mas encontra-se também grande parte dos trabalhadores “imateriais” e do “conhecimento”, da chamada “classe média” (conceito problemático) vítima da precarização, da austeridade e do empobrecimento. E ainda o novo “proletariado dos serviços” – da caixa do supermercado ao call center –, que partilha os salários baixos, a instabilidade profissional, as tarefas rotineiras, os horários longos e instáveis. A esses, devem somar-se os 70 mil estagiários, os cerca de 50 mil contratos emprego inserção, os bolseiros e o falso voluntariado. Se lhes acrescentarmos os desempregados, temos bem mais de metade da classe trabalhadora do país.
O precariado tem tido voz? Alguma, mas menos do que a que devia. Por um lado porque a precariedade do trabalho inibe a própria organização. Segundo, porque uma parte dos seus segmentos mais ativos emigraram nos últimos anos. O precariado falará neste novo ciclo político? Veremos. Mas o que é certo é que não há nenhuma solução para o país que não passe por ele.
No final da década de 1990, o sociólogo francês Robert Castel utilizava pela primeira vez este conceito. Observando as mutações na produção, a multiplicação de estatutos entre emprego e não-emprego e a expansão de formas “atípicas” de trabalho, Castel constatava a emergência de uma “condição precária entendida como um registo próprio dentro dos trabalhadores assalariados”. Essa precariedade deixava de ser excepcional ou provisória e surgia, para um grupo cada vez maior de pessoas, como um estado permanente. Castel chamou a esse estado de “precariado”. Uns anos mais tarde, um economista inglês, Guy Standing, escreveu um livro polémico (publicado no final do ano passado em Portugal), chamado “O Precariado: A Nova Classe Perigosa”. A sua tese é clara: estamos perante a emergência de uma nova classe, definida pela insegurança laboral, pela dependência do salário direto e pela ausência de uma “identidade baseada no trabalho”, que precisaria de encontrar a sua agenda política e formas próprias de representação.
No início dos anos 2000, primeiro em Milão e depois por toda a Europa, surgia um movimento que dava expressão autónoma a estes trabalhadores. Juntando precários e migrantes, o MayDay era uma manifestação peculiar, com uma estética visual pop que a aproximava mais das Love Parades do que dos tradicionais desfiles sindicais. Em apenas dois anos, a parada dos precários ultrapassava, em dimensão, os desfiles organizados pelas centrais sindicais italianas.
Nos últimos anos, muitos observadores olham para o precariado como o grande protagonista das mobilizações sociais que percorreram o planeta desde o final de 2010. Também por isso, têm chamado a esses protestos “a rebelião do precariado”. Nas recentes eleições espanholas, o terramoto provocado pelos indignados e a mobilização política e eleitoral do “precariado” são dois dos factores que têm sido utilizados para explicar os resultados do Podemos e das alianças da esquerda alternativa.
Mas fará sentido falar em “precariado”? Será o seu crescimento uma tendência incontornável da economia? Trata-se de uma nova classe? E residirá no precariado a chave para as transformações políticas do futuro?
Mais do que uma classe à parte, o precariado é uma parte da classe trabalhadora. Qual? A que está mais exposta às mutações do mundo do trabalho e à sua desregulação. Também por isso, está mais distante das formas clássicas de representação e organização, como os sindicatos e os partidos. Com vínculos instáveis, empregos periféricos no sector informal da economia, trabalho não declarado, as atividades do precariado exercem-se à margem da proteção social e, muitas vezes, da própria cobertura legal. E a experiência subjetiva do precariado extravasa o domínio laboral. Constitui-se, para alguns, como um modo de vida marcado pela insegurança e pela imprevisibilidade relativamente ao futuro.
No precariado que se tem mobilizado encontram-se os vestígios de uma classe operária afetada pela subcontratação da mão-de-obra, pelo aumento do desemprego e pela precarização dos vínculos (em Portugal, se somarmos os trabalhadores da indústria e da construção, temos 20% da força de trabalho, segundo dados do Banco de Portugal de maio deste ano). Mas encontra-se também grande parte dos trabalhadores “imateriais” e do “conhecimento”, da chamada “classe média” (conceito problemático) vítima da precarização, da austeridade e do empobrecimento. E ainda o novo “proletariado dos serviços” – da caixa do supermercado ao call center –, que partilha os salários baixos, a instabilidade profissional, as tarefas rotineiras, os horários longos e instáveis. A esses, devem somar-se os 70 mil estagiários, os cerca de 50 mil contratos emprego inserção, os bolseiros e o falso voluntariado. Se lhes acrescentarmos os desempregados, temos bem mais de metade da classe trabalhadora do país.
O precariado tem tido voz? Alguma, mas menos do que a que devia. Por um lado porque a precariedade do trabalho inibe a própria organização. Segundo, porque uma parte dos seus segmentos mais ativos emigraram nos últimos anos. O precariado falará neste novo ciclo político? Veremos. Mas o que é certo é que não há nenhuma solução para o país que não passe por ele.
angiela:
OBRIGADA ME AJUDOU BASTANTE
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