O professor Otair Fernandes diz que “Mesmo depois de libertos, os negros ficaram à própria sorte”. O que isso significa?
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As estatísticas de cor ou raça produzidas pelo IBGE mostram que o Brasil ainda está muito longe de se tornar uma democracia racial. Em média, os brancos têm os maiores salários, sofrem menos com o desemprego e são maioria entre os que frequentam o ensino superior, por exemplo. Já os indicadores socioeconômicos da população preta e parda, assim como os dos indígenas, costumam ser bem mais desvantajosos.
Para o professor Otair Fernandes, doutor em Ciências Sociais e coordenador do Laboratório de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (Leafro/UFRRJ), a realidade do Brasil ainda é herança do longo período de colonização europeia e do fato de ter sido o último país a acabar com a escravidão.
O professor ressalta que, mesmo após 130 anos de abolição, ainda é muito difícil para a população negra ascender economicamente no Brasil. “A questão da escravidão é uma marca histórica. Durante esse período, os negros não tinham nem a condição de humanidade. E, pós-abolição, não houve nenhum projeto de inserção do negro na sociedade brasileira. Mesmo depois de libertos, os negros ficaram à própria sorte. Então, o Brasil vai se estruturar sobre aquilo que chamamos de racismo institucional”, lembra.
Fernandes afirma que atitudes individuais não são suficientes para romper essa questão socialmente e historicamente, e ressalta a importância de políticas públicas de ações afirmativas. “É preciso pensar em políticas de afirmação do negro. Políticas de valorização daqueles que foram marginalizados e excluídos”, diz.
Para a promotora de Justiça do Ministério Público do Estado da Bahia, Lívia Santana Vaz, reconhecer que o problema existe é o primeiro passo para tentar resolver essa dívida histórica. Por isso, a consideração de cor ou raça nas pesquisas oficiais produzidas pelo IBGE é fundamental. “Há países - a exemplo de Portugal - que, a pretexto de não violarem o princípio da igualdade, proíbem a coleta de dados com base na raça e na cor das pessoas, o que tem impedido que se conheça o contexto de desigualdades raciais e a criação de políticas públicas”, ressalta a jurista, que atua em grupos de proteção de direitos humanos e combate a discriminações.