Fortes latidos vinham da sala, acompanhados por um farfalhar de asas e de cortinas. Corri para ver o que era. Fofita latia sem parar, acuando um pobre passarinho indefeso, que se debatia contra as persianas. Asas estendidas, tentava recuar o mais que podia, para se defender de Fofita.
"Pára, Fofita!" Gritei, o que era raro, deixando a cachorrinha com medo. Ela então saiu de perto, enquanto eu me abaixava para recolher o pássaro com as mãos.
Ele tremia. Eu mal podia acreditar que um ser tão pequeno pudesse tremer tanto. Seu coração batia forte. Devia ter um coração do tamanho daquele corpinho de filhote. Para que não temesse mais, rapidamente levei-o até a janela, estendendo os braços, com uma mão espalmada sobre a outra. Queria que soubesse que eu não lhe faria mal algum.
Olhei logo para o céu, esperando por uma explosão imediata de asas, ávidas por liberdade. Aquele céu de um azul límpido, o céu mítico, característico da nossa capital federal. Se eu pudesse, também queria voar, pensei. Mas não sou como você, passarinho...
Quando dei por mim, percebi que a avezinha não voava. Ficara ali parada, com suas garrinhas prendendo o meu dedo. Olhava fixamente para mim. Seus olhinhos negros, azulados, diziam-me algo. Pareciam agradecer-me por não tê-los capturado. Talvez não entendesse o porquê, o passarinho. Mas era certo que entendesse, sim. Só não esperava que alguém compreendesse o valor da liberdade. Forte é quem, podendo aprisionar, liberta, por amor, diziam-me os olhinhos redondos.
"E por que você não voa?" Perguntaram-me os olhinhos.
"Eu não sei voar", respondi, tímida.
"Então, veja como eu faço, e faça o mesmo, que você perderá o medo."
No mesmo instante, o passarinho voou, para baixo, em direção a uma árvore. Não era muito alta, e ficava num nível bem mais baixo que o daquele terceiro andar, em que me encontrava. Não pude mais ver o bichinho, que se escondera em meio à copa cerrada daquela pequena árvore florida. Seu vôo foi como um mergulho veloz, de um peixe, na água de um mar profundo. Durante o trajeto, nem precisou de suas asas. Depois do primeiro impulso, fechou as asinhas, e mergulhou no ar, em linha reta, decidida.
Entendi o que o passarinho queria me dizer. Algum tempo depois, era eu quem ganhava a liberdade. Tremendo de medo, arrisquei o primeiro vôo. Minhas asas doíam, lembrando-me o cativeiro. Tropeçava, ao querer voar, e caí inúmeras vezes. Debatia-me, apavorada, sentindo a dor das asas quebradas, feridas.
Mas a dor não importava. O que importava era a liberdade. Com o tempo, ensaiando vôos, consegui expandir minhas asas, e voei. Hoje, consigo até mesmo desenhar círculos no ar.
1- quais são personagens da crônica?
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as personagens são: a fofita, o passarinho e a narradora.
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