Geografia, perguntado por anabeatrizamaralcoel, 5 meses atrás

como a geografia se torna importante nesse momento de pandemia de coronavírus?

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Respondido por fergalhardopires
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Por muitos anos se falou da geografia como uma disciplina enfadonha e decorativa, sem lugar fora das salas de aula. Mesmo após a ebulição teórica que foi o movimento da Geografia Crítica, foi esta a visão, a de uma Geografia que não teoriza, apenas descreve, a que prevaleceu na recente reforma educacional brasileira, que estabeleceu os BNCC (Base Nacional Comum Curricular), onde praticamente a importância desta disciplina encontra-se reduzida ao mapa e a geograficidade é tratada como raciocínio geográfico e/ou mero jogo de localizações. Mas a Geografia contemporânea e sua multiplicidade teórica e metodológica lhe permitem ir muito além desta visão simplista, em quem o geográfico se reduz ao mapa e seu ensino.

Isto porque a Pandemia permite observar claramente os diversos cortes que fraturam a sociedade e as múltiplas espacialidades dos sujeitos que não apenas jogam, mas lutam pela vida. Assim, enquanto alguns aparecem defendendo a continuidade de um sistema esquizofrênico no qual a solidariedade é reduzida a ações de caridade, outros estão, efetivamente, utilizando a pandemia para refetir sobre nossa vulnerabilidade de espécie. Além disso, a pandemia do Coronavírus evidencia a quebra final de paradigmas, já que tem o potencial catastrófico das grandes epidemias históricass, como a gripe espanhola (sec. XX) ou a peste bulbônica (sec. XIII) e a tuberculose (século XIX).

Particularmente, observa-se que as determinações territoriais, a que o geógrafo Milton Santos chamava de formações socioespaciais, nos permite considerar a posição dos sujeitos no interior da geometria social (para utilizar o termo de Massey) de uma dada sociedade. Assim, por exemplo, fatores como a precarização territorial contemporânea, o direito diferenciado à cidade ou ainda as diferenças ambientais cidade x campo estabelecem condições diferenciais para a propagação do virus, ao mesmo tempo em que demonstram com gravidade e acidez a vulnerabilidade destes grupos, factualmente vulnerabilizados pela precarização de seuss espaços de vida, ausência de condições sanitárias e alimentares mínimas. Poder-se-ia ainda abordar a vulnerabilidade dos povos indígenas, diante de uma pandemia tão grave.

Embora a Geografia tenha sua identidade associada ao registro cartográfico, o mapa deve ser tomado como um meio para demonstrar a geografia concreta ou imaginária de um fenômeno pensado ou vivido. O mapa é sempre uma representação da realidade e, portanto, fruto da inteligência geográfica que consiste na apreensão, recorte e universalização de um mundo que, no entanto, é sempre pessoal e subjetivo, é sempre uma percepção do mundo. Entrada para as chamada geografia fenomenológica e ambiental, a percepção, para os geógrafos, é um conceito elástico que permite como observar como um mesmo fenômeno pode ser compreendido de múltiplas formas, por diferentes sujeitos. Caso do próprio território, que pode ser apreendido de distintas maneiras conforme o grau de intimidade e envolvimento com ele. Seria possível mesmo afirmar que, quanto maior o des-envolvimento, menor a relação de intimidade com o território. Quantas pessoas na megalópole paulistana conseguem pisar um pedaço de chão sem asfalto?

O mapa é, deste modo, apenas o local onde os geógrafos registram a ocorrência de determinados fenômenos de maneira didática. Sua existência no mapa, contudo, está – ou deveria estar – atrelado a sua existência (ou possibilidade de existência) concreta no espaço geográfico. Isto implica que o mapa está a serviço seja da projeção de determinado fenômeno, possibilitando sua análise em relação a outros; quais sejam as escalas de sua projeção. Ora, quando se fala em escala, não se está a falar exclusivamente da escala cartográfica, aquela que caracteriza o produto da cartografia técnica e geralmente aparece na parte inferior dos mapas, uma régua velha conhecida de todos; mas, da escala geográfica dos fenômenos, que delimita sua existência ou possibilidade de existência concreta, de modo que no mapa, a escala cartográfica, está a serviço da segunda, a escala geográfica. Isto se exemplifica facilmente: a escala de expansão da Covid-19 viu-se ampliada rapidamente à escala do milionésimo  e, com a mesma velocidade, atingiu a escala de 1 para 5 e de 5 para 15 milhões. Enquanto em Wuhan, na China, ela poderia ser representada numa escala talvez de 1:50mil, agora a pandemia atinge o mundo todo e é representada acima da escala ao milionésimo. Para que fique ainda mais claro, a escala ao milionésimo foi escolhida ainda no século XIX por geógrafos e cartógrafos do mundo inteiro (mas principalmente europeus) para representar um país com a dimensões similares à França, Alemanha ou Espanha. No Brasil, ela representa uma área próxima à área dos estados de Minas Gerais ou Bahia. Quanto maior o denominador, maior a área abrangida pela escala.

Abraços : )

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