ALGUEM ME SALVA POR FAVOR
Uma das funções sociais mais importantes do cinema é criar um equilíbrio entre o homem e o aparelho. O cinema não realiza essa tarefa pelo modo como o homem se representa diante do aparelho, mas pelo modo com que ele representa o mundo, graças a esse aparelho. Através dos seus grandes planos, de sua ênfase sobre pormenor es ocultos dos objetos que nos são familiares, e de sua investigação dos ambientes mais vulgares sob a direção genial da objetiva, o cinema faz-nos vislumbrar,por um lado, os mil condicionamentos que determinam nossa existência, e por outro assegura-nos um grande e insuspeitado espaço de liberdade. Nossos cafés e nossas ruas, nossos escritórios e nossos quartos alugados, nossas estações e nossas fábricas pareciam aprisionar-nos inapelavelmente. Veio então o cinema, que fez explodir esse universo carcerário com a dinamite dos seus décimos de segundo, permitindo-nos empreender viagens aventurosas entre as ruínas arremessadas a distância. O espaço se amplia com o grande plano, o movimento se torna vagaroso com a câmara lenta. É evidente, pois, que a natureza que se dirige à câmera não é a mesma que a que se dirige ao olhar. A diferença está principalmente no fato de que o espaço em que o homem age conscientemente é substituído por outro em que sua ação é inconsciente. Se podemos perceber o caminhar de uma pessoa, por exemplo, ainda que em grandes traços, nada sabemos, em compensação, sobre sua atitude precisa na fração de segundo em que ela dá um passo. O gesto de pegar um isqueiro ou uma colher nos é aproximadamente familiar, mas nada sabemos sobre o que se passa verdadeiramente entre a mão e o metal, e muito menos sobre as alterações provocadas nesse gesto pelos nossos vários estados de espírito. Aqui intervém a câmera com seus inúmeros recursos auxiliares, suas imersões e emersões, suas interrupções e seus isolamentos, suas extensões e suas acelerações, suas ampliações e miniaturizações. Ela nos abre, pela primeira vez, a experiência do inconsciente ótico, do mesmo modo que a psicanálise nos abre a experiência do inconsciente pulsional. BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. São Paulo: Brasiliense, 1994. p. 189.
De acordo com o texto, o cinema pode ser considerado uma arte? (resposta tem que ter mais que 10 linhas)
Soluções para a tarefa
Resposta:
O autor, como evidenciado no próprio texto, evidencia o caráter libertador do cinema, responsável por emancipar o homem de sua condição nas fábricas, nos quartos alugados, em resumo, de sua vida aprisionante. Não é esse pois o papel da arte? Transpor uma realidade inatingível ou mesmo improvável como via de entretenimento ou então de crítica? Nesse sentido, o cinema cumpre seu papel com primazia, uma vez que não basta à lente da câmera o retrato objetivo do cotidiano, mas sim construir juntamente com todos os elementos da linguagem cinematográfica, uma narrativa que contemple mais do que a mesmice da vida humana, em histórias fantasiosas ou revolucionárias, a fim de retratar a realidade de um mundo fantástico e de engrandecer a alma de quem o acompanha e que reflete sobre o mesmo. O cinema revela-se tão arte como a música, a pintura ou a escultura.