Você está em seu escritório e é procurado por um cliente que se identifica como servidor público federal. Ele lhe conta que recebeu uma denúncia do Ministério Público Federal pela prática do crime de corrupção passiva no período em que atuava como auxiliar no escritório consular do Brasil na Bolívia. O servidor relata que, na Bolívia, é comum que os agentes públicos sejam presenteados pelos cidadãos quando do bom atendimento, gerando resultados rápidos e eficientes para os interessados. Nesse sentido, o acusado questiona sobre a aplicabilidade do art. 317 do Código Penal sobre o fato, já que no país de sua ocorrência não é considerado crime. Mais do que isso, afirma que jamais solicitou qualquer tipo de regalo; apenas não o devolveu quando do recebimento. Assevera o valor ínfimo da situação, e questiona se é capaz de representá-lo em outro país. Diante do cenário exposto, quais são as explicações que você daria para o cliente?.
Soluções para a tarefa
Resposta:
Em primeiro lugar, é preciso lembrá-lo de que, na qualidade de funcionário público, o seu vínculo atrairá a competência para o julgamento dos fatos pela Lei Penal brasileira; tratando-se de exceção à teoria da territorialidade.
Segundo a redação dada pela Lei n.º 7.209, de 11 de julho de 1984:
Extraterritorialidade
Art. 7.º Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
I - os crimes:
c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço;
O crime será, portanto, processado no Brasil (o processo judicial tramitará na Justiça brasileira). Isso acontecerá mesmo que o ato ilícito não tenha ocorrido por requerimento expresso de vantagem pelo funcionário público, já que o verbo receber também está presente no tipo.
Em resumo aos questionamentos do cliente, pode-se afirmar que:
- Aplica-se o art. 317 Código Penal Brasileiro ao fato, pois é definido como crime no ordenamento nacional como crime contra a administração pública e foi cometido por servidor público brasileiro no exercício de suas funções. Assim, mesmo que cometido no exterior, deve ser aplicada a lei brasileira com fundamento na extraterritorialidade incondicionada, prevista no art. 7º, I, "c", do CP;
- Não há necessidade de solicitar vantagem para cometimento do crime de corrupção passiva, pois um dos verbos-núcleo do tipo penal é o de "receber";
- O valor ínfimo da situação é irrelevante, pois não é aplicável o princípio da insignificância aos crimes conta a administração pública, em regra;
- Estando o cliente em outro país e o advogado no Brasil, deve ser outorgada uma procuração, a qual deve ser lavrada em Repartição Consular brasileira. Preenchido esse requisito, o advogado é capaz para representá-lo em eventual processo;
Revisão Sobre Extraterritorialidade No Direito Penal:
A respeito da extraterritorialidade da Lei Penal Brasileira, importante esclarecer que ela existe para ampliar a proteção a bens jurídicos em situações específicas, quando tratamos de crimes cometidos fora do território brasileiro.
Para compreender melhor, é necessário fazer uma leitura atenta dos arts. 7º e 8º do CP, vamos fazer isso acrescentando algumas anotações:
Art. 7º – Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
(extraterritorialidade incondicionada)
I – os crimes:
a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República;
b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público;
c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço;
d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil;
(extraterritorialidade condicionada)
II – os crimes:
a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir;
b) praticados por brasileiro;
c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados
§1º – Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro. - incondicionada
§2º – Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições: - condicionada
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável
Entenda mais sobre extraterritorialidade no direito penal aqui: https://brainly.com.br/tarefa/16878618?referrer=searchResults