uma produção de texto falando sobre o desrespeito na sociedade
Soluções para a tarefa
Combater a doutrinação ideológica nas escolas e universidades: é esse o objetivo político do Escola Sem partido, organização responsável pela ação pública que suspendeu, a dez dias do exame, a cláusula do edital do ENEM que zerava redações desrespeitosas aos direitos humanos. No ano passado, 4.798 redações, 0,08% do total foram anuladas por esse motivo. Afinal, qual a pertinência do pedido que obteve às pressas uma decisão favorável do Supremo? Em face de especialistas, o JC jogou luz nos principais argumentos explorados pelo texto judicial. A regra viola o direito à liberdade de expressão “Quem afirma que viola está, ao mesmo tempo, dizendo algo óbvio e expressando uma má compreensão da liberdade”, explica Conrado Mendes, professor de Direito Constitucional da USP. “É evidente que restringe a liberdade de expressão dizer a um aluno racista que ele não pode proferir essa opinião numa prova. Todos os nossos direitos podem sofrer restrições. Cabe saber se elas são justificáveis ou não.” O jurista explica que se trata de uma discussão clássica de conflitos entre direitos. O artigo quinto, que protege a livre manifestação do pensamento, apenas proclama direitos. Nesse sentido, eles não podem ser todos maximizados ao mesmo tempo. Algum tipo de acomodação precisa existir, mas a sutileza está em conseguir traçar uma linha que mensure quão aceitáveis são restrições impostas ou não à cada um deles. “Direitos conflitam entre si. A liberdade, por exemplo, sempre vai estar em conflito com algum outro tipo de direito. É uma premissa conceitual básica: não há liberdade absoluta. Mas essa premissa é só o começo.” Para a professora de educação da USP, Carlota Boto, esse limite da liberdade é a própria liberdade do outro. “A ideia básica da ética é a capacidade que todo sujeito tem de se colocar no lugar do outro. Então, a boa piada é aquela que a gente pode rir com o outro, não do outro. O bom comportamento em relação aos direitos humanos, nesse sentido, tem a ver com essa alteridade.” É um critério ideológico “É óbvio que há um aspecto ideológico nos direitos humanos porque há uma tomada de posição moral”, esclarece Conrado. “A constituição não é neutra. Quando ela protege a liberdade de expressão, a dignidade e a não-discriminação, ela não está sendo neutra. Não dá pra ser neutra ao proibir a tortura, abolir a escravidão e condenar práticas violadoras de direitos humanos. Ninguém está livre da ideologia. E nada mais ideológico do que dizer que o outro é ideológico.” Frequente nos discursos da Escola Sem Partido, o tema da ideologização do ensino mobiliza um dos princípios do programa educacional proposto pela associação: a neutralidade política, ideológica e religiosa. “Um ensino neutro não é possível”, arremata Carlota. “A noção de um ensino neutro é um ensino sem valores. Mas um ensino sem valores já está assumindo um valor. E os valores são generosos ou perversos. A questão é saber quais desses escolheremos.” Há pouca clareza nos objetivos do edital O terceiro ponto que ilegitimou a regra diz respeito ao grau de subjetividade no texto do edital. De acordo com Rômulo Nagib, advogado responsável pela ação, a cartilha não oferece referenciais consistentes sobre como alunos e corretores devem se comportar em relação aos Direitos Humanos. O JC procurou saber quais são as diretrizes pelas quais são corrigidas as provas para entender se a cláusula afeta a consistência e a objetividade do ofício do corretor.