Um amigo meu, médico, assegurou-me que desde o berço a criança sente o ambiente, a
criança quer: nela o ser humano, no berço mesmo, já começou.
Tenho certeza de que no berço a minha primeira vontade foi a
de pertencer. Por motivos que aqui não importam, eu de algum
modo devia estar sentindo que não pertencia a nada e a
ninguém. Nasci de graça.
Se no berço experimentei esta fome humana, ela continua a me
acompanhar pela vida afora, como se fosse um destino. A ponto
de meu coração se contrair de inveja e desejo quando vejo uma
freira: ela pertence a Deus.
Exatamente porque é tão forte em mim a fome de me dar a
algo ou a alguém, é que me tornei bastante arisca: tenho medo
de revelar de quanto preciso e de como sou pobre. Sou, sim.
Muito pobre. Só tenho um corpo e uma alma. E preciso de mais
do que isso. Quem sabe se comecei a escrever tão cedo na vida
porque, escrevendo, pelo menos eu pertencia um pouco a mim mesma. O que é um fac-símile
triste.
Com o tempo, sobretudo os últimos anos, perdi o jeito de ser gente. Não sei mais como se
é. E uma espécie toda nova de “solidão de não pertencer” começou a me invadir como heras num
muro.
Se meu desejo mais antigo é o de pertencer, por que então nunca fiz parte de clubes ou de
associações? Porque não é isso o que eu chamo de pertencer. O que eu queria, e não posso, é por
exemplo que tudo o que me viesse de bom de dentro de mim eu pudesse dar àquilo que eu
pertencesse. Mesmo minhas alegrias, como são solitárias às vezes. E uma alegria solitária pode se
tornar patética. É como ficar com um presente todo embrulhado em papel enfeitado de presente
nas mãos – e não ter a quem dizer: tome, é seu, abra-o! Não querendo me ver em situações patéticas e, por uma espécie de contenção, evitando o tom de tragédia, raramente embrulho com papel de
presente os meus sentimentos.
Pertencer não vem apenas de ser fraca e precisar unir-se a algo ou a alguém mais forte.
Muitas vezes a vontade intensa de pertencer vem em mim de minha própria força – eu quero
pertencer para que minha força não seja inútil e fortifique uma pessoa ou uma coisa.
Embora eu tenha uma alegria: pertenço, por exemplo, a meu país, e como milhões de outras
pessoas sou a ele tão pertencente a ponto de ser brasileira. E eu que, muito sinceramente, jamais
desejei ou desejaria a popularidade – sou individualista demais para que pudesse suportar a invasão
de que uma pessoa popular é vítima -, eu, que não quero a popularidade, sinto-me no entanto feliz
de pertencer à literatura brasileira. Não, não é por orgulho, nem por ambição. Sou feliz de pertencer
à literatura brasileira por motivos que nada têm a ver com literatura, pois nem ao menos sou uma
literata ou uma intelectual. Feliz apenas por “fazer parte”.
Quase consigo me visualizar no berço, quase consigo reproduzir em mim a vaga e no
entanto premente sensação de precisar pertencer. Por motivos que nem minha mãe nem meu pai
podiam controlar, eu nasci e fiquei apenas: nascida.
No entanto fui preparada para ser dada à luz de um modo tão bonito. Minha mãe já estava
doente, e, por uma superstição bastante espalhada, acreditava-se que ter um filho curava uma
mulher de uma doença. Então fui deliberadamente criada: com amor e esperança. Só que não curei
minha mãe. E sinto até hoje essa carga de culpa: fizeram-me para uma missão determinada e eu
falhei. Como se contassem comigo nas trincheiras de uma guerra e eu tivesse desertado. Sei que
meus pais me perdoaram eu ter nascido em vão e tê-los traído na grande esperança. Mas eu, eu
não me perdoo. Quereria que simplesmente se tivesse feito um milagre: eu nascer e curar minha
mãe. Então, sim: eu teria pertencido a meu pai e a minha mãe. Eu nem podia confiar a alguém essa
espécie de solidão de não pertencer porque, como desertor, eu tinha o segredo da fuga que por
vergonha não podia ser conhecido.
A vida me fez de vez em quando pertencer, como se fosse para me dar a medida do que eu
perco não pertencendo. E então eu soube: pertencer é viver. Experimentei-o com a sede de quem
está no deserto e bebe sôfrego os últimos goles de água de um cantil. E depois a sede volta e é no
deserto mesmo que caminho.
ME AJUDEM, EU PRECISO SEPARAR TRECHOS COM PREPOSIÇÕES, ME AJUDEM.
Soluções para a tarefa
Respondido por
1
Resposta:
entanto
Explicação:
preposição explicativo
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