Tristeza! É o que sinto quando abro meus olhos e vejo a mais terrível escuridão,
que não cessa. O único remédio é fechá-los e deixar-me levar pelas lembranças.
Lembro-me como se fosse ontem: bem cedinho, o sol não havia nem acordado ainda,
eu já estava na estrada da minha cidade Santa Branca que nem asfaltada era, pura terra,
com uma brochura e alguns lápis dentro de uma sacolinha de arroz – pois nossa vida era
difícil e papai só ganhava o suficiente para não morrermos de fome e frio. Enquanto
caminhava, a poeira batia em meus olhos e os fazia ficar cheios d’água.
Eu ia cantarolando que nem um sabiá até chegar à escola Barão de Santa Branca,
hoje bem conhecida na cidade e antigamente a única. Recordo-me de que lá havia um muro
para meninos e meninas não ficarem misturados. Bobagem! Ai de nós se tentássemos olhar
para elas... A régua cantava na palma de nossas mãos, parecia que os professores sentiam
prazer em fazer isso, eram rígidos demais.
Assim que saíamos da escola, eu e meus amigos íamos nadar atrás da fábrica de
trigo, que hoje não existe mais – nem a fábrica, nem as águas limpas. Depois íamos jogar
bola atrás do mercado municipal, onde hoje é o posto de saúde. Ficávamos parecendo tatus,
a terra grudava nas roupas e na pele molhada. Depois disso dávamos mais um pulo na
cachoeira, pois se chegássemos assim em casa a vara de amora era o presente para nossas
pernas.
O mais engraçado era ver d. Dolores dirigindo. Se surgia uma nuvem de poeira,
podíamos ter a certeza de que era ela com seu Chevrolet. Afinal, era a única mulher de
Santa Branca que dirigia.
Não posso me esquecer dos cortejos: a cidade inteira seguindo um caixão, sem saber
quem estava dentro. Havia uma banda que tocava para o defunto e ele tinha direito até a
foto. Dá para acreditar nisso? Mamãe me dizia para não dar risadas nem ir ver o rosto do
morto, principalmente se fosse gente ruim, senão ele poderia voltar para assombrar. O sino
da delegacia tocava pontualmente às 21 horas para todos se recolherem, era uma época
bem perigosa. De noite a cidade era iluminada por lampião de querosene – isso a deixava
mais sombria.
Foi minha melhor época, mas hoje sou velho, e a cegueira tomou conta dos meus
olhos.
Tenho saudade do colorido que hoje só vejo em minha mente através das lembranças
do passado. Escuridão é o que eu vejo, mas jamais sairá de mim a magia de recordar.
(Texto baseado na entrevista feita com o sr. Sarkis Ramos Alwan, 41 anos.)
Após reler o texto com atenção, copie e responda em seu caderno:
1. O texto está narrado em qual pessoa do discurso?
2. A autoria é da mesma pessoa sobre a qual se conta a história? Justifique.
3. O texto foi construído a partir de coleta de dados. Qual foi o recurso usado para isso?
4. De que fase da vida o narrador se lembra no texto?
5. Na infância do narrador, há mais momentos felizes ou tristes? Retire do texto um
episódio que justifique sua resposta.
6. Qual a importância das lembranças para este entrevistado em especial?
7. Qual detalhe mais lhe chamou a atenção sobre o que foi contado?
8. Justifique o título do texto.
9. “Tristeza!” é:
a) Frase
b) Oração
10. “De noite a cidade era iluminada por lampião de querosene...” temos:
a) Frase
b) Oração
11. “ Eu ia cantarolando que nem um sabiá...”, identifique qual o sujeito e o predicado
presentes nesta oração.
Soluções para a tarefa
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Explicação:
1- Primeira pessoa. Eu
2- Não, pois a pessoa a qual se trata a história, apenas concedeu a entrevista, não fora ela que produziu e bolou as perguntas.
3- Uma entrevista.
4- Da sua infância.
5- Há mais momentos felizes. "Foi minha melhor época."
6- Antigamente ele podia enxergar e agora tudo é escuridão.
7- A parte em que podia se tirar uma foto do defunto.
8- O entrevistado encontra-se muito nostálgico, relembrando os momentos bons de sua vida e toda a jovialidade e saúde que tinha. Tudo isso era muito importante, principalmente agora que se encontra cego.
9- Frase, pois não tem verbo. ( Oração )
10- Oração, pois tem verbo. ( Era )
11- Sujeito = eu. Predicado = ia cantarolando que nem um sabiá.
claudiashultz:
obrigado
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