(Texto)
Ele se aproximou. Sua cara era um misto de angústia e maldade, por trás de
uma feiúra quase intolerável para os olhos humanos. Quando se aproximou a poucos
metros, não me contive:
"Demônio! Como ousa aproximar-se de mim? Para pagar pelo crime, sua
miserável existência teria que ser destruída mil vezes!".
E então, para minha indescritível surpresa, o demônio falou!
"Eu esperava essa reação", ele disse, com voz rouca, mas firme e afinada. "Os
homens odeiam os desgraçados, logo devo ser odiado. E devo sê-lo mais do que
todos, por ser o mais desgraçados de todos os seres vivos. Até por você, meu criador:
que está ligado à sua criatura por laços que só se dissolverão pelo aniquilamento de
um de nós."
Refeito do susto de ouvi-lo falar - e de forma tão diabolicamente articulada -,
atirei-me sobre ele, carregado de toda ânsia de vingança de que era capaz. Mas ele se
desviou com grande facilidade e continuou a falar:
"Tenha calma. Não tente de novo. Sou muito maior, mais forte e mais
resistente - você me fez assim. A vida pode ser apenas uma sucessão tristezas, mas eu
a prezo e pretendo defendê-la. Quero apenas que me ouça. Lembre-se: sou uma
criatura. Eu poderia ter sido seu Adão. Mas, em vez disso, sou apenas um anjo caído,
expulso de um paraíso onde reina a felicidade. E por quê? Pelo aspecto repulsivo com
que você me criou".
"Monstro! Assassino!", berrei. "Não o criei para provocar a morte e a
destruição!”
"Já fui benevolente e bom", ele respondeu. "Minha alma transbordava de
amor. Mas a intolerância me ensinou a odiar”. (...)
"Se meu próprio criador me abomina", disse o monstro, "o que posso esperar
dos outros? Todos me enxotam e me odeiam. As escarpas são o meu refúgio. Meu lar
são as cavernas de gelo, em que o homem não ousa penetrar. E, para mim, as
tempestades de neve são mais amigas do que qualquer humano. Se a humanidade
soubesse de minha existência, faria como você: se armaria para destruir-me”.
(...)
Mary Shelley. Frankenstein. História contada por Ruy Castro. São Paulo: Cia das Letras, 1994. p. 47-49
1. Quem é o narrador do texto?
2. A quem o narrador chama de demônio e por quê?
3. A criatura comenta que já foi boa, mas que se transformou. O que causou essa
transformação?
4. Essa história denuncia a exclusão social e a importância que a sociedade dá para o
exterior, o desrespeito com quem é diferente. Pense um pouquinho. Quem seriam os
excluídos hoje em dia?
5. Você acha que as pessoas que sofrem algum tipo de preconceito podem se tornar
violentas? Justifique sua resposta.
Soluções para a tarefa
Resposta:
1 - O criador da criatura, cujo nome é Victor Frankenstein.
2 - Frankenstein, sua criação. Porque ele matou pessoas queridas do cientista que o criou a fim de obter vingança por ter sido criado e humilhado.
3- O ódio e medo que os seres humanos desenvolviam por ele mesmo antes de conhecê-lo, apenas por causa de sua aparência.
4 - Portadores de deficiência física ou mental, membros da comunidade LGBTQ+, imigrantes, negros ou aqueles que se diferem dos outros seja no comportamento ou aparência são oprimidos socialmente até os dias de hoje, infelizmente.
5 - Sim, pois podem sofrer da síndrome do opressor e tentarem oprimir a outros ou até aqueles que são seus semelhantes objetivando inconscientemente ou conscientemente a pararem de serem oprimidos.