TÊNIS
Antigamente o tênis era um calçado modesto, de desenho tão simples que passava despercebido. Mas então o tênis mudou: nova tecnologia, novo design (só a Nike tem 300 modelos), formas e cores arrojadas, preços correspondentemente elevados. Símbolo de status, inclusive, o tênis cresceu em importância. Até o trágico: já se mata por um par de tênis, como aconteceu com o garoto Fábio Comune, 14 anos, baleado por um marginal em São Bernardo, porque não quis entregar seu tênis.
A primeira reação diante de um caso destes é pedir a pena de morte. É o que faria qualquer pai ou mãe, principalmente tendo filhos nesta idade. Isto se não pensasse em fazer justiça com as próprias mãos. Mas, depois desta primeira reação, que é automática, convém pensar um pouco, com menos automatismo.
O caso do infeliz Fábio não é o único. O roubo de tênis é um evento muito frequente, assim como é o roubo de mochilas, de relógios, de roupas. Ao redor das escolas, privadas ou públicas, gravitam bandos de pivetes, que, nessa terra de ninguém, se iniciam na criminalidade. A reação de pais responsáveis tem sido uniforme: mais guardas, mais muros, mais grades, mais advertências aos filhos. Que assim estão verdadeiramente sitiados e amedrontados.
Mas será que não está na hora de pensar em outro tipo de solução? Será que não é tempo de pensar nos pivetes como crianças, que querem exatamente o que outras crianças querem, só que sem a esperança de consegui-lo? Lembro-me da frase de um amigo, o microbiologista Jorge Os sanai, referindo-se às bactérias que causam intoxicação alimentar, ele dizia: o problema é que esses micróbios gostam dos mesmos alimentos que nós. A questão é partir do problema para a solução. Por que não falar com os pivetes? Por que não convidá-los, eventualmente, para a escola? Por que não lhes oferecer os tênis - e os brinquedos, e as revistas em quadrinhos – que as crianças de classe média tantas vezes jogam fora?
Esta idéia pode ainda não ter chegado a seu tempo. Mas, no conflito com o outro, o jeito é se colocar nos sapatos – ou no tênis – do outro. O que só poderá acontecer se o outro tem sapatos. Ou
tênis.
(Jornal Zero Hora- Seção “Opinião”, 5, 13 de setembro de 1991) Moacyr Scliar
Vocabulário:
gravitam – giram em torno de;
sitiados – presos em um determinado espaço.
a.
A crônica de opinião de Moacyr Scliar baseia-se em um fato ocorrido no cotidiano. Qual é esse fato?
Escreva aqui a sua resposta
b.
O texto data de 1991. Pode-se dizer que trata sobre um assunto atual? Justifique:
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suga
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