Talvez eu devesse escrever "Pensando no Brasil", significando duplamente quem, neste país, pensa, e quem pensa sobre o Brasil. Seja como for: pensamos que vimos tudo, e nos enganamos. Assim, recentemente no Rio peguei um taxista bem idoso, perto dos 80 anos. Valente, falante, devotamente dirigia seu carro aos trancos, e discorria sem parar sobre as belezas da cidade e da vida no Brasil. Nunca se discutam as belezas do Rio, mas, nesta fase de obras e manifestações pulando por toda parte, até respirar fica difícil, quanto mais se movimentar, cumprir horários e compromissos. O taxista, porém, estava numa felicidade transbordante, e dizia (cito-o com todo o respeito, e quero dizer que não são opiniões minhas, mas dele):
"Eu acho este tempo agora maravilhoso. Sou matuto, vim pra cá aos 18 anos, tenho 78, mas ainda sou um matuto. Só que hoje sou um matuto feliz, porque nos primeiros tempos de Rio eu passava dias sem comer. Hoje estou sempre de barriga cheia, e nos domingos meu filho ainda assa uma picanha". Essa obsessão pela picanha dominical perpassou todo o seu monólogo. "Gente como a madame (era eu) e a garota (era a jornalista que me acompanhava) são de outra classe, não entendem isso do povo, o povão como eu. Para nós não importa se os caras lá de cima estão roubando, se as pessoas piores vão para os postos mais importantes, se as autoridades estão mentindo, se o Brasil deve para os estrangeiros: para nós interessa que a nossa barriga está cheia e nossos filhos estão na escola". A jornalista tentou argumentar que muitas vezes a escola estava em péssimas condições, faltavam professores, cadernos, livros, até giz, mas ele não desistiu do seu entusiasmo: "Isso não importa, nem que sejam dois dias por semana, meus netos estão na escola, a gente tem a barriga cheia, e nos domingos meu filho assa uma picanha".
Pensei que da sua perspectiva ele tinha razão e talvez por isso nada mude tão cedo por aqui. A imensa maioria não lê, não só por ser analfabeta ou sem tempo para isso, mas porque pouco lhe significam ideologias ou ética, nem quer saber, por exemplo, se agora professores de faculdade de medicina vão precisar ter mestrado nem doutorado, e instituições que foram ícones começam a desmoronar também. Eles pensam em suas dificuldades imediatas, que nem sempre consigo imaginar, em suas razões que não posso contestar - é isso também o nosso país, assim pensado por tantos de seus filhos.
Minha segunda reflexão - com todo o respeito pela jovem em questão - é o fato de uma moça, cantora ou bailarina, ser considerada, numa questão dada por um professor de ensino médio, uma "pensadora no Brasil". Sou preconceituosa? Em algumas coisas, confesso que sou. Não sei se o professor quis fazer ironia ou falava sério, mostrando uma realidade tão triste quanto barrigas vazias, gente parindo ou morrendo no chão, ou assassinatos, a violência cotidiana, réus de vários processos indiciados para cargos importantes, e toda a loucura solta.
Quem profissionalmente pensa o Brasil e nos informava sobre ele, tentando nos manter lúcidos, anda aos tropeços: o Ipea era inamovível, indiscutível, mas explode no país aquele erro grotesco sobre mulheres que merecem ser estupradas. Diante da gritaria geral, volta atrás: foi um erro. Quantas informações essenciais para nossos trabalhos e estudos terão sido apenas um erro, um errinho - e baseados nele erramos também? Vejo uma notinha na imprensa dizendo que se pretende começar a cercear o IBGE: seus dados sobre o Brasil não andam agradando. E, assim, pessoas e instituições aos poucos vão-se desmanchando no ar. Quem pensa no Brasil já não sabe o que pensar, quem pensava estar certo se atrapalhou, e nós, que queremos pensar, e acertar, estamos aturdidos. Somos antipatriotas? Somos alienados, ignorantes, rabugentos? Somos provavelmente apenas brasileiros desejosos de mudanças. Talvez nada se consiga, mas sempre há aquela última esperança. E, se tudo der errado, restará a picanha de domingo.
É possível afirmar que o texto evidencia:
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eu fui nessa: a difusão do antipatriotismo,da alienação,da ignorancia,já que para a autora a esperança de mudança.......
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1-B
2-D
Explicação:
fonte: confia no pai, fiz e deu certo
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O anseio de mudança por parte daqueles que querem pensar no Brasil, entre os quais a autora se insere, muito embora por vezes estes se sintam atordoados, dadas as situações com que se deparam cotidianamente.
A realidade vivida pela parcela mais humilde da sociedade brasileira, que muito embora permaneça ignorante, se vê hoje feliz por estar de barriga cheia e por, aos domingos, poder assar uma picanha.
A incompreensão dos mais abastados em relação aos anseios dos mais humildes,