Surpresas no parque
Gosto dos pequenos parques. Da luz domada, do farfalhar das sombras, dos ruídos furtivos, do passo discreto dos frequentadores habituais. Nos parques onde não há espaço para bicicletas ou skates, recupera-se um pouco da calma civilizada das tarde, no estilo antigo. Comportam-se as pessoas com aquilo que se chamava bons modos. Não há grito, estouvamento, invasão de espaço. É prazer simples de estar.
Por isso estranhei aquele homem grande, magro, sujo, avermelhado de tez e de barba, que parou na minha frente. Não conhecia as regras, deveria ser de fora. Sentado no banco, a primeira coisa que vi, antes mesmo de olhar a figura, foram os pés. Grandes pés gretados, cascudos, metidos em duas sandálias de dedo, solado grosso de pneu. Chamou-me de cidadão.
__ O cidadão pode dar-me atenção?
Achei bonito aquilo, cidadão. Senti-me cidadão. E foi de cidadão para cidadão que disse pois não. O que ele queria, e desconfiei que primeiramente, era saber como saía de São Paulo. Tinha roupas encardidas, talvez menos de cinquenta anos e uma trouxa que segurava na mão calosa e forte.
__ O senhor quer ir para onde? __ perguntei, pretendendo, conforme, indicar a estação rodoviária ou ferroviária.
__ Piauí.
__ De ônibus ou de trem?
__ A pé.
E contou-me sua história. Saíra "de viagem" havia uns três anos. "Pode ser mais". Fora até o Sul, bem lá embaixo, "onde não se entende muito bem o modo de falar", e estava voltando. Não aceita carona na viagem, disse, e não promessa, mas por gosto mesmo de andar. A gente é bicho igual os outros, disse, não tem de andar rodando. Por onde passa faz pequenos trabalhos em troca de comida. Racha lenha, capina, colhe, planta, varre, carrega, limpa, cata, conserta, pastoreia, faz um pouco de tudo.
__ Há alguma coisa que eu possa fazer pelo cidadão? __ perguntou. Percebi que comer era o segundo objetivo de sua abordagem e ofereci-lhe o que havia ali ao lado, um cachorro-quente. Comeu dois,
enquanto contava mais e voltávamos ao banco. Preferiu sentar-se no chão. Imaginei que por deferência com o próximo que se sentasse ali, e percebi que era um homem civilizado como o meu parque merecia.
Chamava-se Ilalaê no Maranhão, Melquesedeque no Piauí, conhecido por Melque. Havia nascido na serra que divide os dois estados, e morava ora num, ora noutro. Confidenciou que não gostava muito do seu caráter piauiense, preferia o maranhense, "mais índio".[...]
Fiquei curioso de saber se quem estava viajando era o maranhense ou o piauiense. Que procurava ele andando pelo Brasil? Por que havia saído? Encontrara o que buscava? Perguntas metafísicas demais para se fazer a um andarilho, e preferi calar.
Não era um mendigo, era, a seu modo, um turista. Descera pelo oeste, voltava pelo leste. Achara o Rio fácil de andar, quase uma linha reta; depois avistara uma placa indicando São Paulo, e a cidade parecia que não tinha saída, não acabava nunca. Gente demais. O cidadão podia indicar o rumo da saída? Indiquei, não tinha erro. Ele se levantou, agradeceu, desejou-me saúde, e perguntou antes de sair:
__ O que essa gente toda veio fazer aqui?
Eu não soube explicar.
7. O cronista e o andarilho conversam no parque. O que o homem pede ao
cronista?
8. Italaê/ Melquesedeque faz o pedido de forma direta ou indireta? O que
isso revela acerca da personalidade do andarilho?
9. Como Italaê? Melquesedeque justifica sua ideia de voltar a pé para o
Piauí?
10. Quando a personagem declara sua preferência pelo caráter
"maranhense", o que esse dado nos diz sobre Italaê/ Melquesedeque?
11. Segundo o cronista, o andarilho "não era um mendigo, era, a seu modo,
um turista". Justifique a opinião do cronista.
12. O desfecho é aberto, ou seja, dá chance de o leitor imaginar a
continuidade do enredo. Em relação à frase final, seu objetivo é provocar
uma reflexão no leitor ou o cronista realmente não sabia o que responder?
Justifique sua resposta.
alguem pode me ajudar por favor
Soluções para a tarefa
Resposta:
7) atenção
8) direta, tinha roupas encardidas, talvez menos de cinquenta anos e uma trouxa que segurava na mão calosa e forte
9)por gosto mesmo de andar
10)diz que ele é maranhense
11)por que ele disse ( agente é bicho )
12) resposta pessoal
Após a leitura do texto é possível inferir que:
7) O homem pede ao cronista um pouco de atenção, indicando a ele o caminho para Piauí e algo para comer.
8) O andarilho faz o pedido de uma forma indireta, indicando ser uma pessoa pouco incisiva que não gosta de incomodar.
9) A justificativa de ir a pé é de que o homem gosta de andar.
10) O personagem afirma uma preferência ligada aos antecedentes do local, em que o nome apresentava uma origem indígena.
11) Segundo o cronista o andarilho seria identificado como turista por estar apenas de passagem.
12) A intenção do autor de deixar o desfecho do texto em aberto de forma a provocar uma reflexão no leitor sobre quais as finalidades nas ações diárias.
Compreendendo o texto
O texto se trata de uma cronica, onde o autor relata sobre um acontecimento em um dia que passeia no parque de sua preferência. No dia em específico, observa-se um sujeito que se destaca em meio a estética do parque, que é descrito como "civilizado", sem gritos ou confusões.
Além disso, o autor descobre no homem que encontra, que é um andarilho, e que apresenta como finalidade caminhar e ir de encontro aos locais de sua escolha, que apresenta como justificativa o fato de gostar de andar.
O andarilho se apresenta com grande serenidade e educação, e ao final do texto nota-se uma questão levantada por ele, de qual seria a finalidade de todos naquele parque, o que leva ao leitor do texto a se queixar sobre suas ações.
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