Suponha que você, sendo nordestino(a), 18 anos, com Ensino Médio incompleto, morador da zona rural, pleiteia uma vaga numa empresa de cosméticos em São Paulo. Como se expressaria diante do entrevistador, por sinal, muito exigente com o uso formal da língua. Elabore um diálogo entre ambos explorando as variações linguísticas que podem surgir nessa situação. Aproveite para deixar claras as noções de variação e do preconceito linguístico. Para elaboração do seu diálogo crie um título criativo e uma pequena introdução contextualizando o diálogo em questão.
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Soluções para a tarefa
Resposta:
A língua não é, como muitos acreditam, uma entidade imutável, homogênea, que paira por sobre os falantes. Pelo contrário, todas as línguas vivas mudam no decorrer do tempo e o processo em si nunca pára. Ou seja, a mudança lingüística é universal, contínua, gradual e dinâmica, embora apresente considerável regularidade.
A crença em uma língua estática e imutável está ligada principalmente à normatividade da gramática tradicional, que remota à Grécia Antiga, numa época em que os estudiosos estavam interessados principalmente em explicar a linguagem usada nos textos dos autores clássicos e em preservar a língua grega da "corrupção" e do "mau uso". A língua escrita - especialmente a dos clássicos - era tão valorizada que era considerada mais pura, mais bonita e mais correta do que qualquer outro tipo de linguagem.
A lingüística moderna, no entanto, prioriza a língua falada em relação à língua escrita por vários motivos, dentre eles pelo fato de que todas as sociedades humanas conhecidas possuem a capacidade da fala, mas nem todas possuem a escrita.
Analisando a nossa própria sociedade, podemos concluir que a escrita pertence a poucos, uma vez que grande parte da população brasileira é constituída por analfabetos ou semi-analfabetos e que mesmo os que tiveram acesso à escola não a usam muito.
Além da língua falada ser mais utilizada do que a escrita e atingir muito mais situações, o ser humano a adquire naturalmente, sem precisar de treinamento especial. Apenas em contato com o modelo, ou seja, apenas exposta a uma determinada língua, qualquer criança normal é capaz de falar essa língua e compreendê-la perfeitamente nas mais variadas situações e em um período de tempo muito curto. Aos três anos, mais ou menos, uma criança já adquiriu quase todas as regras de sua língua, podendo ser considerada um falante competente da comunidade lingüística da qual faz parte. Mesmo quando parece que ela não conhece a sua língua nativa, o dizer, por exemplo, "eu di" ou "eu fazi" no lugar de "eu dei" e "eu fiz", a criança está mostrando que sabe muito sobre ela, pois já compreendeu que o passado, no português, termina regularmente com "i" e está aplicando uma regra geral da língua em vez de aplicar uma particular.
O processo de aquisição da escrita difere do da fala no sentido de não ser natural. Crianças que têm mais contato com a escrita sem dúvida a aprendem mais fácil e rapidamente, mas ainda assim necessitam de algum tipo de instrução.
Quanto à homogeneidade, as pessoas de uma mesma comunidade lingüística podem até pensar que falam exatamente a mesma língua, mas isso não é verdade. As diferenças lingüísticas podem ser percebidas em todas as línguas do mundo, mesmo em pequenas comunidades de fala, nos níveis fonéticos, fonológico, morfológico, sintático ou semântico. Por exemplo, a palavra "porta" pode ser pronunciada de várias maneiras, tais como , ou ; a palavra "mulher" pode ser pronunciada "muié"; as frases "Maria assistiu ao filme" e "faz dois anos que parei de fumar" também podem ser ditas "Maria assistiu o filme" e "fazem dois anos que parei de fumar", respectivamente.
Na verdade, toda língua é um conjunto heterogêneo e diversificado porque as sociedades humanas têm experiências históricas, sociais, culturais e políticas diferentes e essas experiências se refletirão no comportamento lingüístico de seus membros. A variação lingüística, portanto, é inerente a toda e qualquer língua viva do mundo. Isso significa que as línguas variam no tempo, nos espaços geográfico e social e também de acordo com a situação em que o falante se encontra.
Podemos exemplificar a variação temporal com a forma "você", que passou por uma grande transformação ao longo do tempo. No século XII, as pessoas diziam "vossa mercê" e hoje, na linguagem falada, e mesmo na escrita informal, encontramos "cê", que não é a melhor nem a pior que "você" ou "vossa mercê", embora entre os não-lingüistas a tendência seja a de considerá-la ruim, feira ou deteriorada. Isso acontece porque a sociedade normalmente é conservadora e demora para aceitar as mudanças, inclusive as lingüísticas.
- espero ter ajudado :D