Português, perguntado por MeAjudaPfvSouBurro, 3 meses atrás

Sempre pensei que ninguém batia o brasileiro no uso do diminutivo, essa nossa mania de reduzir tudo à mesma dimensão, seja um cafezinho, um cineminha ou uma vidinha. Só o que varia é a inflexão da voz. Se alguém diz, por exemplo, “Ó vidinha!” você sabe que ele está se referindo a uma vida com todas as mordomias. Nem é uma vida, é um comercial de cigarro com longa metragem. Um vidão. Mas se disser “Ah vidinha...” o coitado está se queixando dela e com toda a razão. Há anos que o seu único divertimento é tirar sapatos e fazer xixi. Mas nos dois casos o diminutivo é usado com o mesmo carinho.

O francês tem o seu tout petit peu, que não é um diminutivo, é um exagero. Um “pouco todo pequeno”é muita explicação para tão pouco. Os mexicanos usam o poco, o poquito e – menos ainda do que o poquito – o poquetim! Mas ninguém bate o brasileiro.

Era o que eu pensava até o dia, na Itália, em que ouvi alguém dizer que alguma coisa duraria um mezzoretto. Não sei se a grafia é essa mesma, mas um povo que consegue, numa palavra, reduzir uma meia hora de tamanho – é invencível em matéria de diminutivo.

O diminutivo é uma maneira ao mesmo tempo afetuosa e precavida de usar a linguagem. Afetuosa porque geralmente o usamos para designar o que é agradável, aquelas coisas tão afáveis que se deixam diminuir sem perder o sentido. E precavida porque também o usamos para desarmar certas palavras que, na sua forma original, são ameaçadoras demais.

Operação, por exemplo. É uma palavra assustadora. Pior do que intervenção cirúrgica, porque promete uma intromissão muito mais radical nos intestinos. Uma operação certamente durará horas e os resultados são incertos. Suas chances de sobreviver a uma operação... sei não. Melhor se preparar para o pior.

Já uma operaçãozinha é uma mera formalidade. Anestesia local e duas aspirinas depois. Uma coisa tão banal que quase dispensa a presença do paciente.

- Alô, doutor? Olha, aquele meu quisto no braço direito que nós íamos tirar hoje? A operaçãozinha?

- Sim.

- Não vou poder ir, mas o Asdrúbal vai no meu lugar.

- O Asdrúbal?

- Meu assistente direto aqui na firma. Homem de confiança.

- Mas ele vai fazer a operaçãozinha por você?

- Ele é o meu braço direito, doutor.

Se alguém disser que precisa ter uma conversa com você, cuidado. É coisa da maior importância. Os próprios destinos do Pacto do Atlântico podem estar em jogo. Uma conversa é sempre com hora marcada.

Já uma conversinha raramente passa do nível da mais cândida inconsequência. E geralmente é fofoca. A hora para uma conversinha é sempre qualquer hora dessas.

Num jogo você arrisca tudo, até a hora. Num joguinho aceita-se até o cheque frio.

Entre ter um caso e ter um casinho a diferença, às vezes, é a tragédia passional.

No Brasil, usa-se o diminutivo principalmente com relação à comida. Nada nos desperta sentimentos tão carinhosos quanto uma boa comidinha.

- Mais um feijãozinho?

- O feijãozinho passou dois dias borbulhando num daqueles caldeirões de antropófagos com capacidade para três missionários. Leva porcos inteiros, todos os miúdos e temperos conhecidos e, parece, um missionário. Mas a dona da casa o trata como um mingau de todos os dias.

- Mais um feijãozinho?

- Um pouquinho.

- E uma farofinha?

- Ao lado do arrozinho?

- Isso.

- E quem sabe mais uma cervejinha?

- Obrigadinho.

O diminutivo é também uma forma de disfarçar o nosso entusiasmo pelas grandes porções. E tem um efeito psicológico inegável. Você pode passar horas tomando cervejinha em cima de cervejinha sem nenhum dos efeitos que sofreria depois de apenas duas cervejas.

- E agora, um docinho.

E surge um tacho de ambrosia que é um porta-aviões.




1.“Sempre pensei que ninguém batia o brasileiro no uso do diminutivo...” (linha 1). Sabe-se, pela leitura, que o Autor mudou esta sua opinião. O que provocou esta mudança?

Soluções para a tarefa

Respondido por poppop8
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Resposta:

Ele mudou de opinião porque ouviu alguém dizer na Itália, que alguma coisa duraria um mezzoretto.

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