Retire do texto um verbo de ligação com seu respectivo predicativo.
Martha Medeiros: A pessoa certa
Algumas frases se propagam sem que saibamos quem é o verdadeiro autor. É o caso
de Enquanto não surge o homem certo, vou me divertindo com os errados, que eu ouvi pela
primeira vez num programa da Marília Gabriela ou será que li numa camiseta? Que a frase é
espirituosa, nem se discute, mas é uma cilada: acreditar que existe a pessoa certa é a razão
dos nossos problemas de relacionamento. Por que a gente insiste em acreditar em lendas?
Essa entidade abstrata ─ a pessoa certa ─ é aquela que vai entender todas as suas
manias, vai adivinhar quando você quiser ficar em silêncio, terá o corpo e a rosto que você
idealizou em seus delírios românticos e a sua mãe ─ a sua, não dela ─ vai aprovar sua
escolha assim que abrir a porta da sala de visita. Bastará uma rastreada com o olhar e logo
ela piscará pra você como quem diz: agora sim.
Agora sim o quê? Agora você pensa que encontrou alguém com quem não irá brigar
jamais e que vai se encaixar com perfeição na sua ambiciosa procura pela pessoa certa, esta
que (atenção, spoiler) não existe.
A pessoa certa pra você é a errada. Lembra da pessoa errada?
Morava no cafundó do Judas. Ria alto. Não entendia muito os filmes de que você
gostava, mas fazia comentários deliciosos a respeito. Era muito mais velha que você. Ou
muito mais jovem que você. Não parava em emprego algum e sua coleção de ex era
preocupante. Que saudade da pessoa errada.
Nunca acertou um único presente ─ mas lembrava de todas as datas. Depois de uma
hora e meia ao telefone, queria falar um pouco mais e ficava triste se você sugeria que
desligassem. Como amava você a pessoa errada.
Não conhecia nenhum de seus amigos. Nem você os dela. Fumava demais. Ou bebia
demais. Ou ambos. Mas nunca teve passagem pela polícia. A fissura por previsões
astrológicas era meio exagerada, e já estava na hora de aprender a arrumar a bagunça que
era seu apartamento, mas nunca deixou de sair do banho perfumada. E molhando o chão do
quarto, claro. Era a incorreção mais bem-vinda para aquele seu momento de entressafra, não
era?
Até que surgiu a pessoa certa. Toda a família comemorou e os amigos respiraram
aliviados: agora sim, você tinha alguém a sua altura, agora sim, você não precisaria mais
passar por altos e baixos, agora sim, nunca mais um barraco, nenhuma surpresa. Agora sim,
um casal padrão.
Quase posso ver você, daqui a uns meses, usando uma camiseta que diz: “Enquanto
não surge a pessoa errada, vou me entediando com as certinhas”.
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