Resumo do filme o plano perfeito em terceira pessoa?
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De tempos em tempos surge na frente do crítico um destes filmes que parece um verdadeiro edifício de Gaudi: ao mesmo tempo que perfeito na forma, único; ao mesmo tempo que de uma beleza estonteante, difícil sequer de entender como pode ter sido construído. Este mais recente filme de Spike Lee certamente é uma dessas obras, frente as quais há que se parar e ponderar muito antes de se escolher um caminho. Entre outras coisas pela consciência que temos, ao olharmos para ele, que há caminhos demais a seguir.
Num segundo, parece apetitoso tentar contrastar e contextualizar o filme dentro da obra do diretor (em si já bastante desafiadora, e a cada filme acentuando isso), buscando nele as matrizes temáticas e figuras de estilo que caracterizam o cinema de Lee, reparando quais novos caminhos ele aponta e quais velhos caminhos ele trilha de maneira singular aqui. Num outro momento, parece impossível se fugir da análise do filme pelos seus aspectos visuais, e especialmente sua inserção dentro de uma tradição do cinema de gênero, a qual Spike Lee honra e subverte a todo momento (um passo fascinante neste sentido é dado pelo belíssimo texto de Tatiana Monassa na Contracampo – dos mais completos que o filme pode receber). Em qualquer caminho que se opte seguir, no entanto, há a consciência total dos inúmeros que se deixou de desbravar, e se este texto começa assim é menos para se escusar de suas incompletudes e mais para deixar às claras o dilema do escritor para digitar um primeiro parágrafo sobre ele. Enfrentemos, porém, o desafio.
Como em todo grande cineasta, os filmes de Spike Lee pedem atenção aos mínimos detalhes, do primeiro ao último plano – ou melhor, até mesmo antes daquele e depois deste. Sim, porque entre o logotipo da Universal que abre a projeção do filme, e o logotipo da empresa produtora de Spike (40 Acres and a Mule – aquilo que era dado aos escravos após o fim da escravidão nos EUA) que o encerra após os créditos finais há um jogo dialético se dando no papel que Spike Lee representa com este filme – e que é muito próximo da sua narrativa. Seja na insipiente trilha étnico-funkeada que já serve de fundo ao sisudo logo do grande estúdio, ou principalmente na frase que aparece sendo escrita sobre o logo da empresa de Spike (“by any means necessary” – “da maneira que seja preciso”), o que nós vemos no filme todo é o diretor realizando aqui um dos grandes golpes de “contrabandista” (expressão usada para definir cineastas que se aproveitavam dos meios de produção dos grandes estúdios para servirem a seus fins e mensagens próprios, “escondidas” no meio de narrativas tradicionais).
Para começar a desvendar este golpe, vale pegar mais atentamente o sentido do título original: “inside man” é uma expressão que se refere, em duplo sentido, ao estado de Dalton Russell, o personagem de Clive Owen no filme (tanto por estar dentro do banco, mas também por operar por dentro das informações que os outros desconhecem). Por outro lado, parece muito mais adequada para caracterizar a situação do próprio diretor no leme desta produção – uma vez que o sentido clássico do “inside man” é o do “homem infiltrado”, o que o personagem de Owen, no sentido estrito, não é (todos sabem que ele é um assaltante). O verdadeiro “inside man” aqui, duplamente escondido (pela trama do filme e no jogo do cinemão) é Spike Lee.
Uma vez que, à maneira de Dalton Russell, desvendamos o “quem” (Spike Lee), o “onde” (o filme) e o “porquê” (fazer um filme segundo seus interesses com o alcance de público do cinema dos grandes estúdios), só nos falta também o “como”. E, assim como nos diz Russell, é aí que está toda a intriga. Se Russell monta um intrincado teatro visual para simular o que não é o seu interesse principal (e a montagem deste teatro, e suas implicações, é incrivelmente bem demonstrada no texto já citado de Tatiana Monassa), o mesmo faz Spike, com igual sucesso.
Primeiro com uma trama cinematográfica irretocável – seja no quesito da escritura do roteiro, seja na forma com que é filmada (e aqui vale um destaque mais que merecido para todo o “invisível” elenco de apoio do filme, que não por acaso é apresentado, um a um, no final do filme), e finalmente em como está amarrada pela montagem. Spike parece especialmente solto, brincando de filmar, colocando pequenas piscadelas de discussões em cada pequeno momento (como a decisão de sempre filmar as cenas violentas sem ser direto – o espancamento pelo vidro do banco, a “execução” pelo vídeo, etc), dando atenção