Relacione a nova ordem mundial com a guerra na Ucrânia
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Um dos legados que Vladimir Putin deixara à Rússia é o resgate de uma tradição de realpolitik. Sua geopolítica tem bases profundas no expansionismo territorial fundada por Pedro, o Grande (1672-1725) e consolidado por Catarina, a Grande (1729-1796) – ainda que seja, de certa forma, fruto direto da modernização tecnoindustrial conduzida pela URSS.
Amparado pela longa história de expansionismo imperial sob o czarismo e o comunismo, ele considera a Europa Oriental, o Cáucaso e os Balcãs áreas de influência natural da Rússia no seu front ocidental. O Kremlin ambiciona recuperar ao menos parte dos territórios perdidos pela Rússia com o fim da União Soviética.
Seus alvos são a Ucrânia e a Moldávia no Leste Europeu, a Lituânia, a Letônia e a Estônia no Báltico, e a Geórgia e a Armênia no Cáucaso. A invasão da Geórgia e a incorporação das províncias da Ossétia do Sul e Abecásia em 2008, a anexação da Criméia em 2014, a intervenção militar na Síria a partir de 2015, e a atual invasão da Ucrânia são partes dessa meticulosa política de segurança nacional.
A inserção dos Estados Unidos no jogo das grandes potências levou à primeira crise de legitimidade da raison d’état desde a Paz de Westfália. A hegemonia da corrente democrática liberal americana, que resultou na criação da Liga das Nações e da ONU, tornou primitiva e obsoleta a velha racionalidade de Estado europeia.
Mas, ironicamente, o que o mundo tem visto em mais de cem anos de internacionalismo legalista é que a defesa de um sistema internacional baseado na concepção de paz perpétua tem sido usada de legitimar a guerra e o terror de Estado. E que o poder irrestrito dos Estados Unidos tornou inevitável o escancaramento da conduta hipócrita do mundo ocidental.
O uso cínico da Guerra ao Terror, a partir de 2001, para avançar e consolidar os interesses geoestratégicos de Washington foi fundamental para a eclosão de tensões e conflitos entre novas e velhas potências. É dos escombros de toda essa tragédia moral que renasce na Europa do Leste a velha razão de Estado.