Português, perguntado por Claudinhuo, 1 ano atrás

Redação sobre propostas para melhorar a saúde pública

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Respondido por laayaraujo
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“Aguardei mais de 15 horas em um corredor para ser internada”



Maria das Neves Costa, de 70 anos, se move em passos lentos até o sofá de sua casa no bairro de Guaianases, extremo leste da capital paulista. Diabética e com pouca visão, ela carrega desde criança uma ampla barriga d’água, sintoma da esquistossomose, uma doença causada por um parasita que aparece especialmente em áreas pobres.


Já sentada, ela começa a elencar sem dificuldade a série de problemas que enfrentou com a saúde pública brasileira. Só nos últimos anos, ela esperou 15 horas por uma internação acomodada em uma cadeira de rodas no corredor de um hospital; foi amarrada em uma maca num setor de internação superlotado e com poucos profissionais para evitar que não caísse da cama; esperou cinco anos para conseguir uma consulta com um nefrologista, mesmo após uma médica suspeitar de uma insuficiência renal crônica; e passou noites acordada em filas dentro de unidades de saúde para conseguir agendar consultas pela manhã.


“A coisa mais triste que existe é chegar em um pronto-socorro, com a sua mãe que está muito mal, e ficar horas e horas esperando. Você se sente impotente”, desabafa a filha Iolanda, de 34 anos, um dia depois de ter passado na emergência de um hospital público com a mãe. Ela, também diabética, já têm sua coleção própria de histórias tristes para contar: aguarda desde janeiro uma consulta com uma nutricionista, marcada pelo posto para o próximo mês de outubro, consequência da enorme quantidade de pedidos médicos que esperam na fila - 653.000, segundo dados da prefeitura.


A mesma demora para conseguir um médico pode ter contribuído para a morte do pai dela no ano passado. Em 2005, em um exame de rotina pedido pelo clínico geral do posto de saúde, ele descobriu alterações nos níveis de uma substância produzida pela próstata, o que poderia indicar a existência de um câncer. Ele tentou marcar uma consulta com o urologista, entrou na fila de espera do posto, mas só foi chamado quatro anos depois. Quando refez o exame, os níveis da substância tinham quadruplicado. Ele já tinha um tumor na próstata e metástase nos ossos. O tratamento não fez efeito e ele morreu três anos depois.


A família de dona Maria é usuária do SUS, o maior sistema de saúde pública do mundo, disponível para todos os mais de 200 milhões de brasileiros. Criado pela Constituição de 1988, ele sofre as mazelas da falta de financiamento, na opinião de estudiosos da área. Atualmente, o país gasta pouco mais de 7% de suas Receitas Correntes Brutas com o sistema, um total de 93 bilhões de reais em 2013. Para o Movimento Saúde Mais Dez, que reúne mais de cem entidades do setor, seria necessário elevar esse valor para 10%, um acréscimo de 40 bilhões de reais. “O SUS é um sistema de saúde universal, que faz o maior número de transplantes do mundo, por um custo de 2,60 reais por habitante. Que plano de saúde privado oferece uma cobertura como essa por menos de 70 reais ao mês? O que se faz com os recursos é um milagre”, afirma Ronald dos Santos, coordenador nacional do movimento.


Dona Maria concorda que, apesar dos problemas, o sistema tem muitas vantagens. Ela, por exemplo, não paga por nenhum dos sete medicamentos que toma diariamente. Tudo é entregue gratuitamente no posto de saúde. “Já foi pior. Antes, a periferia não tinha nada”, lembra ela, ao contar que tinha que levar os filhos pequenos até um bairro vizinho, distante 12 quilômetros, para conseguir atendimento médico.


No entanto, apesar dos avanços, para a maioria dos cidadãos a área ainda é considerada a pior do país, liderança que mantém desde 2008 em inúmeras pesquisas de opinião. A percepção também é contaminada pela má qualidade da saúde privada. Duas pesquisas recentes do Instituto Datafolha apontam que a avaliação da área é pior entre os usuários de plano de saúde. Aqueles que pagam por atendimento particular, a um custo médio de 200 reais por mês, também não estão isentos de sofrer longas esperas por atendimento. As operadoras de saúde têm atualmente 50,9 milhões de beneficiários, um crescimento de 16% nos últimos quatro anos que não foi acompanhado pela ampliação da rede.


A família de dona Maria também foi vítima do descaso na saúde privada. Um de seus sete filhos, que possuía um convênio médico da empresa em que trabalhava, caiu quando jogava bola com amigos do bairro. Com o fêmur fraturado, foi levado a um hospital do plano de saúde. Morreu no começo de 2013, depois de esperar quatro dias por uma vaga para realizar uma cirurgia emergencial.


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