Redação sobre a IMPUNIDADE e VIOLÊNCIA.
Soluções para a tarefa
O modelo de Justiça que deveria proteger os brasileiros está enfraquecido. Nos últimos cinco anos, dos mais de 600 mil crimes registrados em 16 delegacias de polícia na cidade de São Paulo, há indicações de que só uma pequena percentagem poderá resultar em pena com reclusão do acusado. Isso porque, de um total de 338,6 mil crimes, violentos e não violentos, analisados no período, apenas 21,8 mil foram objeto de inquérito policial. Estima-se com base em outros estudos que, desses inquéritos, 40% venham a ser arquivados. Se essas estatísticas se confirmarem, apenas 13,1 mil crimes se traduzirão em denúncia encaminhada ao Ministério Público e acolhida pela autoridade judiciária. “Alguns serão desqualificados por falta de provas, por exemplo, e possivelmente algo em torno de 5% dos crimes analisados redundarão em pena”, diz Sérgio Adorno, coordenador do Centro de Estudos da Violência, um dos dez Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) financiados pela FAPESP. “Na França, em 20 crimes violentos, 19 tendem a merecer pena”, compara.
Os números que estão sendo revelados pela pesquisa Identificação e Medida da Taxa de Impunidade Penal não chegam a surpreender. Outro levantamento, sobre o assassinato de crianças e adolescentes, realizado em São Paulo entre 1991 e 1994 e já concluído, revelou taxa de conversão do crime em pena de apenas 1,72%. Esse quadro certamente é agravado pelo despreparo e falta de recursos da polícia para conduzir as investigações. “A maioria dos crimes é de autoria desconhecida”, observa Adorno. Mas pode também estar relacionado ao perfil da vítima ou do agressor, ou à natureza do crime, suspeita. “E pode ter a ver com obstáculos enfrentados pelos réus no acesso à Justiça penal, inclusive à plena garantia dos direitos de defesa. Paradoxalmente, pode ainda estar relacionado a subterfúgios processuais, como o excesso de recursos protelatórios que retardam a aplicação das sanções”, acrescenta Adorno. O resultado é que a impunidade ajuda a sustentar o crime e também alimenta o medo.
A pesquisa está em curso. É parte de um projeto ainda mais amplo desenvolvido pelo centro, em que se avalia a crise na Justiça brasileira, inclusive por meio de estudo histórico das políticas de segurança pública implementadas em São Paulo, desde 1822 até hoje, a partir de documentos normativos e oficiais. No caso da impunidade, os pesquisadores igualmente partiram de estatísticas oficiais, mas tiveram de optar por outros procedimentos metodológicos.