Qual a importância da preservação e só acesso livre aos babaçuis pelas mulheres quebradeira para a garantia de qualidade de vida dessa comunidade tradicional.
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Quebradeiras de coco babaçu Foto: Carolina Motoki
Quebradeiras de coco babaçu
Barradas ao tentar entrar nas fazendas onde fazem a colheita tradicional do coco, maranhenses discutem território
Por Xavier Bartaburu
Colaboraram Ana Mendes e Carolina Motoki
27 de janeiro de 2018
COMUNIDADE DE QUEBRADEIRAS DE COCO BABAÇU
Onde estão: nos estados do Pará, Tocantins, Maranhão e Piauí. Na chamada Mata dos Cocais, área de transição entre a Caatinga, o Cerrado e a Amazônia
Atividades: coleta de coco babaçu e seu beneficiamento em óleo, sabão e farinha. Coleta de alimentos na mata, roçado, criação de pequenos animais
Por que lutam: pelo livre acesso aos babaçuais e se inicia discussão sobre direitos territoriais como comunidades tradicionais
Ameaças: cercamento do território por fazendeiros e grileiros; avanço do agronegócio; envenenamento das palmeiras de babaçu; violência
Como se organizam: em associações, cooperativas e articulações locais; Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu - MIQCB
Do babaçu, nada se perde. Da palha, cestos. Das folhas, o teto das casas. Da casca, carvão. Do caule, adubo. Das amêndoas, óleo, sabão e leite de coco. Do mesocarpo, uma farinha altamente nutritiva. “A gente diz que a palmeira é nossa mãe”, resume Francisca Nascimento, coordenadora-geral do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu. O tempo que o cacho com os cocos leva para cair é de exatos 9 meses. E é quando caem que entram em ação as quebradeiras de coco babaçu, grupo de cerca de 300 mil mulheres espalhadas em comunidades camponesas do Maranhão, Piauí, Tocantins e Pará, em uma área de convergência entre o Cerrado, a Caatinga e a Floresta Amazônica, especialmente rica em babaçuais. Há gerações essa tem sido a rotina dessas trabalhadoras: passar o dia coletando os cocos e quebrando-os ao meio para extrair sobretudo suas amêndoas, da qual se produz um dos óleos mais versáteis da natureza.
No entanto, a maior parte dos babaçuais está em grandes fazendas. As quebradeiras estão dispostas a mudar esse quadro. De violências sofridas durante décadas por essas mulheres, e resultado da sua ampla organização, foi criada a Lei Babaçu Livre, implantada pela primeira vez em 1997 no município maranhense de Lago do Junco. Outros municípios seguiram o exemplo e o Tocantins aprovou a lei em nível estadual. Basicamente, ela proíbe a derrubada de palmeiras e garante o acesso e o uso comunitário dos babaçuais por parte das quebradeiras, mesmo se estiverem em terras privadas. São raros, porém, os municípios nos quais a lei é cumprida – além dos esforços em revogá-la por parte de fazendeiros. “Eles estão dizendo que babaçu é praga”, ironiza Francisca.
Cenas de violência se repetem em todas as comunidades: as quebradeiras saem de casa para coletar os cocos e se deparam com uma cerca que as separa dos babaçuais. Quando a cerca não é eletrificada, há um capanga cobrando o acesso às terras. O pagamento pode ser metade das amêndoas colhidas. Não raro, a intimidação inclui ameaças de morte e outras formas de violência, inclusive sexual.
As cercas foram erguidas nos últimos 40 anos por fazendeiros interessados em usar aquelas terras para a criação de gado e o cultivo de soja e eucalipto, muitas vezes por meio de incentivos públicos. Quanto às palmeiras, ou são derrubadas para a abertura de pastos e lavouras, ou permanecem ali, cercadas e inacessíveis às quebradeiras. “Eles fazem por maldade mesmo”, argumenta Francisca. “Não é porque precisam do babaçu, é porque não querem deixar a área aberta.”