Qual a importância da indústria na vida dos Europeus?
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O grande historiador Carlo Cipolla afirmou que a economia dos Homens atravessou dois momentos cruciais: o neolítico e a Revolução Industrial. No neolítico, os povos abandonaram a condição de “bandos selvagens de caçadores” e estabeleceram as práticas da vida sedentária e da agricultura. Entre as incertezas e brutalidades da “vida natural”, tais práticas difundiram condições mais regulares de subsistência dos povos e assentaram as bases da convivência civilizada. Podemos afirmar que ao longo de milênios as sociedades avançaram lentamente nas técnicas de gestão da terra, desenvolvidas à sombra de distintos regimes sociais e políticos e, portanto, sob formas diversas de geração, apropriação e utilização dos excedentes.
Às vésperas da Revolução Industrial os fisiocratas ainda refletiam a predominância da agricultura na economia do Ancien Regime. Consideravam “produtiva” somente a classe de agricultores. A manufatura era a atividade da classe estéril que conseguia apenas repor seus custos por meio das trocas e assim, preparar-se para o período de produção seguinte. A agricultura, além de cobrir os seus custos de produção, transfere uma parcela do produto gerado, sem contrapartida, aos proprietários da terra, paga uma renda. A agricultura era, nesse sentido, “produtiva”, ou seja, a única atividade capaz de gerar excedente.
O segundo momento, o da Revolução Industrial, subverteu de maneira ainda mais radical o modo de produzir. Não se tratava mais de administrar as cambiantes condições naturais de produção, mas de utilizar o engenho humano para transformar e, mais recentemente, reinventar a natureza. “A Revolução industrial transformou o Homem agricultor e pastor no manipulador de máquinas movidas por energia inanimada.”
A ruptura radical no modo de produzir introduziu profundas alterações no sistema econômico e social. Aí nascem, de fato, o capitalismo, a sociabilidade, a urbe moderna e seus padrões culturais. A diferença entre a vida moderna e as anteriores decorre do surgimento do sistema industrial que não só cria novos bens e os bens instrumentais para produzi-los, como suscita novos modos de convivência, de “estar no mundo”. Deste ponto de vista, a indústria não pode ser concebida como mais um setor ao lado da agricultura e dos serviços.
A ideia da revolução industrial como um momento crítico, trata da constituição histórica de um sistema de produção e de relações sociais que subordinam o crescimento da economia à sua capacidade de gerar renda, empregos e criar novas atividades. O surgimento da indústria como sistema produção apoiado na maquinaria endogeiniza o progresso técnico e impulsiona a divisão social do trabalho, engendrando diferenciações na estrutura produtiva e promovendo encadeamentos intra e inter-setoriais. Além de sua permanente auto-diferenciação, o sistema industrial deflagra efeitos transformadores na agricultura e nos serviços. A agricultura contemporânea não é mais uma atividade “natural” e os serviços já não correspondem ao papel que cumpriam nas sociedades pré-industriais. O avanço da produtividade geral da economia não é imaginável sem a dominância do sistema industrial no desenvolvimento dos demais setores.
Os autores do século XIX anteciparam a industrialização do campo e perceberam a importância dos novos serviços gestados nas entranhas da expansão da indústria. Não há como ignorar, por exemplo, as relações umbilicais entre a Revolução Industrial, a revolução nos Transportes e o transformações dos sistemas financeiros no século XIX. As interações entre a expansão da ferrovia, do o navio a vapor, o desenvolvimento da indústria metalúrgica e da metalomecânica foram decisivas para a o avanço dos bancos de depósito e para o surgimento do setor de bens de capital.
A história dos séculos XIX e XX pode ser contada sob a ótica dos processos de integração dos países aos ditames do sistema mercantil-industrial originário da Inglaterra. Essa reordenação radical da economia exigiu uma resposta também radical dos países incorporados à nova divisão internacional do trabalho. Para os europeus retardatários, para os norte-americanos e japoneses e mais tarde para os brasileiros, coreanos, chineses, russos e outros, a luta pela industrialização não era uma questão de escolha, mas uma imposição de sobrevivência das nações, de seus povos e de suas identidades.
Paradoxalmente, a especialização de alguns países na produção de bens não industriais é fruto da própria diferenciação da estrutura produtiva capitalista à escala global comandada pela dominância do sistema industrial. Este é o caso de países dotados de uma relação população/ recursos naturais favorável, como Austrália, Nova Zelândia, Uruguai, Chile. Essa especialização decorre da própria divisão do trabalho suscitada pela expansão do sistema industrial.