Geografia, perguntado por Fabiana1420, 1 ano atrás

Qual a crise humanitária dos refugiados?

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Respondido por ManuCastro3
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A grave crise humanitária internacional em curso inseriu o tema dos refugiados na agenda da alta política, para usar uma expressão cunhada pelos realistas nas relações internacionais. Fala-se em crise humanitária na Europa, como se receber refugiados fosse o maior problema.

Há um grande equívoco no tratamento desse tema pela grande mídia, cujo foco tem sido mais os discursos convenientes e as posições resistentes de governos europeus, e menos a pressão sobre os países em desenvolvimento e a condição das vítimas dos conflitos armados e de violações massivas de direitos humanos.

Nos termos da Convenção de Genebra de 1951 e da política global para refugiados sob amparo do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), as soluções para refugiados são de dois tipos: soluções temporárias e duradouras. Elas passam pelo exercício do Direito Internacional dos Refugiados e pela responsabilidade moral de países que contribuíram com a própria crise. E elas passam, também, pelo exercício do princípio da solidariedade internacional.

A opinião pública é sistematicamente induzida a acreditar que os países europeus, e do Norte Global em geral, são os que recebem mais refugiados. Essa é uma inversão perversa dos fatos. Os que mais recebem refugiados são os países em desenvolvimento, fronteiriços aos países em crise humanitária. Não há focos de refugiados europeus (salvo o caso da Ucrânia, uma exceção). Todas as crises humanitárias se desenrolam nos países em desenvolvimento: na África, no Oriente Médio, na Ásia e na América Latina.

Os países de primeiro acolhimento – na terminologia do Acnur – são sempre os países em desenvolvimento próximos àqueles afetados pelas crises. Alguns exemplos impressionantes de recepção de refugiados são o Líbano e a Turquia em relação à crise na Síria; o Irã em relação às crises do Iraque e do Afeganistão; o Quênia, em relação à crise na Somália; o Equador e a Venezuela em relação à crise da Colômbia.

O Direito Internacional dos Refugiados determina que as fronteiras devem estar abertas para a passagem de refugiados – que não podem ser devolvidos em nenhuma hipótese (princípio do non refoulement). Esses países em desenvolvimento, que não contribuíram para as crises de seus vizinhos, são obrigados a receber grandes fluxos de refugiados e o fazem sem cerimônias, cumprindo com seus compromissos internacionais e indo além, exercitando a solidariedade. Esses países de primeiro acolhimento são, de longe, os maiores afetados pela chegada de milhares e milhões de refugiados.

Para refugiados que se deslocam aos milhares e permanecem em regiões de fronteira inóspita, o Acnur tem soluções temporárias, via logística humanitária. Porém, a crise econômica mundial, desde 2008, diminuiu dramaticamente os recursos canalizados para essas ações, impactando negativamente o orçamento da Agência que depende de doações, e não recebe verbas da ONU, salvo para o pagamento de seus funcionários.

A essa situação crítica de escassez de recursos se somou a elevação de refugiados e deslocados internos, a um patamar que, após 70 anos, ultrapassou o número de migrantes forçados da Segunda Guerra Mundial. Nesse contexto de grave crise humanitária, agravada pela crise econômica, que limita a ação do Acnur nos países de primeiro acolhimento, milhares de refugiados se lançam à arriscada aventura de buscar, por conta própria, países de segundo acolhimento; a Europa tem sido seu objetivo.

Os países procurados pelos refugiados são principalmente da União Europeia (a Noruega é uma exceção). Diante do grande fluxo de refugiados, por terra ou pela via marítima, a UE tem tido uma postura que beira à ilegalidade, com o fechamento de fronteiras, ações para coibir a chegada de refugiados na origem e o estabelecimento de cotas rígidas de entrada de refugiados.

Além das obrigações legais de receber refugiados e não devolvê-los, derivadas do Direito Internacional, já reconhecidas pela Corte Europeia de Direitos Humanos de Estrasburgo, no caso em que a Itália foi condenada (2012), a Europa tem a obrigação moral de acolher refugiados.

Esse imperativo moral advém da responsabilidade histórica pelo legado negativo do colonialismo e da responsabilidade pelas intervenções unilaterais no conflito da Síria, apoiando rebeldes e mercenários com armas e recursos de outra ordem. Não é possível eximir-se dessa responsabilidade moral no momento em que as vítimas de tais ações acorrem à suas fronteiras.

Tampouco se pode imputar culpa somente a países individualmente considerados, como Grécia, Itália e Hungria, por meio do qual os refugiados alcançam a Europa. Pelo Direito Comunitário Europeu, todos os países da UE exercem controle migratório em nome do bloco, não apenas por um ato de soberania própria.

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