Quais são as razões do alto número de mortos por conta da gripe espanhola?
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A gripe espanhola causou muito terror nas pessoas pelo seus sintomas fatais e pela facilidade de morte pela pandemia, a falta de cuidado dos Governos também facilitou o alto número de mortos.
Resposta: a gripe espanhola invadiu o Brasil. A violenta mutação do vírus da gripe veio a bordo do navio Demerara, procedente da Europa. Em setembro desse ano, sem saber que trazia o vírus, o transatlântico desembarcou passageiros infectados no Recife, em Salvador e no Rio de Janeiro.
No mês seguinte, o país inteiro já está submerso naquela que até hoje é a mais devastadora epidemia da sua história.
A gripe espanhola, como indicam os discursos acima, domina os debates do Congresso Nacional. As falas dos parlamentares integram o acervo histórico do Arquivo do Senado e do Arquivo da Câmara, em Brasília, e mostram como o Brasil de 1918 se comportou diante da doença.
Assim como outros prédios públicos do país, o Senado e a Câmara, no Rio (que tem o status de Distrito Federal), passam vários dias fechados. Não há funcionários suficientes para tocar as atividades burocráticas no auge da epidemia. Muitos convalescem e outros tantos morreram.
— Tendo sido também vítima da espanhola e seriamente, Sua Excelência está aí rijo, cumprindo seus deveres com aquela atividade rara que todos lhe reconhecemos — diz, num discurso de boas-vindas, o senador Victorino Monteiro (RS).
Nem mesmo o presidente da República é poupado. Rodrigues Alves, eleito em março de 1918 para o segundo mandato, cai de cama “espanholado” e não toma posse. O vice, Delfim Moreira, assume interinamente em novembro, à espera da cura do titular. Rodrigues Alves, porém, morre em janeiro de 1919, e uma eleição fora de época é convocada.
Entre as vítimas ilustres, também figura Olympio Nogueira, estrela do teatro e da música no Rio, bem no auge da carreira.
— Todas as classes, desde os humildes trabalhadores até aqueles que gozam do maior conforto na vida, foram alcançados pelo flagelo terrível, que bem parece universal — constata o deputado Sólon de Lucena. — Dir-se-ia que a morte, não satisfeita com a larga messe de vidas ceifadas nos campos de batalha europeus, quis, na sua ânsia de domínio, estender até nós os seus tentáculos.
Lucena (avô de Humberto Lucena, que seria senador nas décadas de 1980 e 1990) se refere à Primeira Guerra Mundial. Em outubro e novembro de 1918, as manchetes dos jornais brasileiros se alternam entre a gripe espanhola no país e as negociações de paz na Europa. É justamente o vaivém de soldados que faz o vírus mortal tocar todos os cantos do planeta.
Em todo o Brasil, os hospitais estão abarrotados. As escolas mandaram os alunos para casa. Os bondes trafegam quase vazios. Das alfaiatarias às quitandas, das lojas de tecido às barbearias, o comércio todo baixou as portas — à exceção das farmácias, onde os fregueses disputam a tapa pílulas e tônicos que prometem curar as vítimas da doença mortal.
— Nos subúrbios do Rio de Janeiro, as ruas ficam cheias de cadáveres porque as famílias ficam com medo de serem infectadas pelos mortos dentro de casa. Além disso, a medida facilita o trabalho de remoção das carroças da limpeza pública — explica a médica e historiadora Dilene do Nascimento, da Casa de Oswaldo Cruz.
Os parlamentares apresentam uma série de projetos de lei com o objetivo de, em diferentes frentes, combater a doença e amenizar seus efeitos. Uma das propostas determina a aprovação automática de todos os estudantes brasileiros, sem a necessidade dos exames finais.
Citando sua própria experiência como professor da Escola Politécnica (atual escola de engenharia da UFRJ), o senador Paulo de Frontin defende o projeto:
— O momento em que se exige do estudante o máximo esforço são os últimos três meses do ano letivo, quando ele se prepara para o exame final. Exatamente nessa época, grande parte dos alunos foi atacada pela epidemia reinante e muitos falecerem. Na Escola Politécnica, choramos a perda de mais de um. Aqueles que se salvaram estão em uma convalescença que se pode considerar longe de ser completa.
O senador Mendes de Almeida (MA), dono da Escola Técnica de Comércio Cândido Mendes (hoje Universidade Cândido Mendes), no Rio, acrescenta:
— Só na minha escola, mais de 35 professores não têm podido dar as suas aulas por motivo de saúde.
Como 1918 já está chegando ao fim, o presidente interino Delfim Moreira acha mais prudente não esperar as votações do Senado e da Câmara e baixa em dezembro um decreto batendo o martelo de uma vez: aluno nenhum repetirá o ano letivo.
Em outra linha, o deputado Celso Bayma (SC) redige um projeto de lei ampliando em 15 dias o prazo para o pagamento das dívidas que vencem em plena epidemia. De acordo com ele, a moratória é necessária porque muitos comerciantes baixaram as portas, deixaram de lucrar e, por tabela, ficaram impossibilitados de honrar seus compromissos com bancos e outros credores.
— Os que vivem estes dias angustiosos sabem que a capital do país [Rio] tem necessidade de feriados, o mesmo sucedendo com a praça de São Paulo. Por esse meio, poderão os negociantes encobrir a situação aflitiva em que se encontram — acrescenta Bayma, sem, contudo, conseguir a aprovação do projeto.