Artes, perguntado por Bibols, 9 meses atrás

Quais as semelhanças e as diferenças entre as músicas "Tropicália" e "São Nossas Coisas"? ❤

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Respondido por ycarolucio
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Oswald de Andrade ocupa um lugar todo especial no cânone da literatura brasileira. A formação canônica ocorre com a recepção crítica acumulativa, com o julgamento relativo de autores e obras, e a presença deles e delas em práticas contemporâneas. No caso de Oswald, fato fundamental é a reedição das obras nos anos 60 e o trabalho crítico paralelo de Haroldo de Campos e colegas. Dali parte a re-avaliação do papel de Oswald no Modernismo, como agente de ruptura estética, como estilista radical e como pensador cultural. No processo canônico também influi o impacto de autores e de suas idéias em gerações posteriores em termos de produção textual e de poéticas explícitas ou implícitas. Assim, o extenso reconhecimento de Oswald no âmbito da lírica de 1960 para cá explica a solidificação de seu lugar no cânone. Pois os projetos dele, a Poesia Pau-Brasil e a antropofagia, são pontos de partida para discursos culturais chaves de nossos dias, na literatura e além. Ecos das metáforas oswaldianas centrais ressoam na MPB, no Tropicalismo de fins da década de 60, e em momentos privilegiados da canção de lá para cá, sobretudo no repertório de Caetano Veloso, que alguns consideram como a mais importante voz poética de sua geração. Quanto às variadas poesias e comentários críticos das geraçãos atuais, Oswald tem sido uma fonte básica. Na chamada poesia marginal, os ares oswaldianos são claros, se bem que a avaliação da qualidade do ar seja outra questão. Na produção de grupos mais “construtivistas” ou de intermídia, com certa herança da poesia concreta, a presença oswaldiana se verifica tanto na iconografia de textos visuais quanto nos dizeres de obras puramente verbais. Nesta esfera, as lições modernistas de Oswald se filtram mormente pelos olhos da crítica concretista. Entre os polos de produção “marginal” e “construtivista” das décadas 70 e 80, e em publicações coletivas e individuais, o legado oswaldiano se percebe em atitudes e opções textuais como o coloquialismo, a condensação imagética, e a observação irônica da realidade nacional. Examinar e colocar em questão os mecanismos da recente produção lírica e sígnica ajuda na compreensão dos próprios modos oswaldianos.

A mais evidente instância do ressurgimento oswaldiano desde 1965 é o já famoso tropicalismo, um movimento de pouca vida mas de tremenda influência. Caetano Veloso e sócios fizeram uma revisão crítica da cultura brasileira através da canção e ampliaram os horizontes da música popular como modo “legítimo” de expressão artística. Elaboraram tanto a inovação da Bossa Nova quanto a Jovem Guarda, e na sua música experimental os tropicalistas aplicaram conceitos literários, a partir sobretudo da fonte oswaldiana de irreverência, juxtaposição e iconoclastia. As conexões entre o Tropicalismo e o Modernismo no início foram intuitivas, mas tornaram-se deliberadas via contatos entre músicos e críticos. Em artigos sobre os festivais da música popular brasileira de 1966 e 1967, depois publicados em Balanço da Bossa, Augusto de Campos primeiro usou os termos oswaldianos deglutição e macumba para turistas em discussões de novas músicas. Após ouvir “Alegria, alegria” de Caetano, Augusto o procurou para falar sobre os caminhos da música e da poesia. Na estimativa do crítico, a marcha liricamente implodida de Caetano era construida sobre a consciência verbal de um postulado crítico: liberar a MPB de um sistema de isolamento, solipsismo e preconceito nacionalista para criar condições de livre pesquisa e experimentação. Nas palavras de Augusto, tanto Caetano quanto Gilberto Gil, com “Domingo no parque” estavam a “oswaldianamente deglutir o que há de novo” na pop música international (i.e. Dylan-Beatles- o rock) e a incorporar tudo isto em novas idéias nacionais (A. Campos, 152-153). Caetano manteve contato com Augusto e os outros poetas do grupo Noigandres, que lhe apresentaram a poesia concreta, sua crítica literária, e obras das vanguardas históricas, notadamente o caso nacional de Oswald de Andrade. As posturas e conceitos que enformam a escrita de Oswald vieram a influir no desenrolar do Tropicalismo.

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