Português, perguntado por chaycrystina, 1 ano atrás

Preciso de uma poesia ou poema sobre a cultura dos plebeus (civilização romana) urgente

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Respondido por nahlimapotter
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or Guilherme Duque01/04/2016GUILHERME GONTIJO FLORESABORTO, AMORES, CLÁSSICAS,ELEGIA ROMANA, GUILHERME DUQUE, LATIM, OVÍDIO, POESIA ROMANADEIXE UM COMENTÁRIO

Relevo romano, com a imagem de um parto assistido por parteira.

No par de elegias a seguir, contidas no segundo livro dos Amores de Ovídio, o poeta trata de um tema geralmente pouco associado à Antiguidade Clássica: o aborto. Conforme diz Paul Veyne no primeiro volume da História da vida privada ([1985] 2009, p. 21-25), sendo uma prática relativamente comum na época Imperial, o aborto não era visto pelos romanos como algo mais do que um método contraceptivo, como se não importasse o momento em que a mulher decidisse interromper a gravidez. Os métodos variavam desde intervenções que poderíamos chamar de cirúrgicas até o consumo de substâncias abortivas.

Referências a esta prática remontam às comédias plautinas (séc. II a.C.), mas na elegia erótica romana essas parecem ser sua única menção. Na primeira elegia, Am. II, 13, lemos que Corina encontra-se em um estado de saúde frágil após ter realizado um aborto. O poema então se segue com um apelo aos deuses pela vida da jovem, em que chama atenção a presença da religiosidade oriental no mundo romano, de que é testemunha a invocação da deusa Ísis (v. 7-17). Nos versos finais, o poeta volta as preces à deusa grega Ilitia, deusa da gestação. A postura súplice do poeta é contrastada pela elegia seguinte, Am. II, 14, em que o seu discurso toma a forma de uma crítica em alguns momentos até agressiva contra a prática do aborto. Embora existissem muitos motivos sociais, econômicos, religiosos e até mesmo políticos para se enjeitar um filho ou terminar uma gravidez (VEYNE, 2009, p. 22-23), Ovídio acusa as mulheres de o fazerem por vaidade: para não ter o corpo marcado por estrias (v. 7). Ele lembra os heróis da mitologia para afirmar que os seus grandes feitos não teriam acontecido se suas mães tivessem abortado (v. 9-17). É muito interessante notar, entretanto, que para o poeta parece existir ao menos uma justificativa legítima para realizar o aborto: a vingança contra o marido. Ele cita Medeia e Procne (v. 29-30) que se vingaram dos respectivos maridos, Jasão e Tereu, assassinando os próprios filhos – acrescente-se: já nascidos. No final fervoroso, Ovídio afirma que a prática não sai impune, mas que muitas mulheres morrem no processo (v. 37-38). Ele transmite então uma suporta opinião geral moralista de que seria merecida uma tal morte (v. 39-40), no entanto não é seguro afirmar que isto procede de fato sem o suporte de uma pesquisa mais apurada. O poema termina, enfim, com uma nova prece aos deuses, um pedido para que poupem a vida daquela que cometeu este delito (Corina?), mas sem deixar de desejar que uma eventual segunda vez seja devidamente punida (com a morte?).

Por fim, resta notar como é curioso comparar o final dos dois poemas, porque também o primeiro, apesar do formato de prece, acaba com um tom um tanto cínico: o pedido do poeta e a promessa dos votos parecem ser enfraquecidos por certa resignação quando ele diz à deusa “te baste ter lutado esta batalha” (Am. II, 13, 28). O segundo é carregado de um forte teor de censura até chegar a intercessão pela vida da jovem padecente, que também não deixa de vir acompanhada por um segundo pedido mordaz: se ela não aprender a lição agora, que venha o castigo na segunda vez (Am. II, 14, 44). Aos poemas.

Guilherme Duque

* * *

Amores II, 13

Tendo ferido temerária o ventre grávido,
fraca Corina jaz: a vida em risco.
Porque em segredo o feito executou, é digna
da minha ira, mas esta cede ao medo.
Porém de mim engravidou, ou o penso eu:            5
tomo às vezes por certo o que é possível.
Ísis, que o Paretônio e os campos do Canopo,
Mênfis e a rica em palmas Faro habitas,
onde o célere Nilo por amplos canais
desce e por sete portas chega ao mar,                      10
por teus sistros suplico e pelo horrendo Anúbis,
(assim teus ritos ame o pio Osíris,
deslize entre as ofertas a serpente lenta,
se ajunte à procissão cornudo Ápis):
volta a mim a tua face e poupa, em uma, duas,      15
pois dás a ela vida, e ela a mim.
Com frequência ela esteve devota nos dias
certos, onde os gauleses tingem louros.
E tu, compadecida por meninas grávidas,
cujos corpos latente fardo estica, 20
sê benigna e atende a minha prece, Ilitia,
ela é digna de que lhe ordenes graças.
Darei eu mesmo incenso aos fumosos altares
e levarei ofertas aos teus pés,
“Nasão” inscrito “pela cura de Corina”.                  25
Dá hoje ocasião para estes votos,
mas se entre tantos medos posso aconselhar-te,
te baste ter lutado essa batalha.



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