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Durante o governo de Leopoldo II, as mulheres, crianças e idosas eram tradas como?
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AMPUTAÇÕES, ESTUPROS E ASSASSINATOS: O HORROR DO CONGO BELGA
Com sua participação na colonização da África, o rei belga Leopoldo II se tornou um dos menos falados genocidas da História
FERNANDO DUARTE PUBLICADO EM 16/01/2020, ÀS 17H00
Funcionário colonial e vítima de mutilação, 1911 - Wikimedia Commons
Funcionário colonial e vítima de mutilação, 1911 - Wikimedia Commons
Localizado na requintada cidade de Tervuren, a uma curta viagem de trem de Bruxelas, o Museu Real da África Central é uma atração turística recomendada por inúmeras fontes de informação sobre a Bélgica. Nos últimos anos, porém, o palacete construído em 1910 se transformou num ícone do confronto de ideias que marca as tentativas belgas de reexaminar sua participação na chamada colonização africana do século 19.
Ao mesmo tempo que uma determinada exposição promoveu ciclos de debates e pesquisa com críticas sobre a participação belga na colonização africana, o site do museu é permeado pela versão idealizada de uma empreitada cujos tons de crueldade e insanidade ainda têm reflexos em vários aspectos da vida africana. Contradição expressada, por exemplo, por uma estátua onde há um homem negro aos pés de uma escultura dourada com traços ocidentais.
O ponto focal da polêmica atende pelo nome de Estado Livre do Congo, batismo bonito dado a uma horrorosa empreitada escravagista e genocida promovida entre 1895 e 1908 pelo então rei belga Leopoldo II.
Leopoldo II / Crédito: Wikimidia Commons
Foi por lobby do monarca que, em 1876, Bruxelas sediou uma conferência geográfica internacional na qual os anfitriões propuseram o que no papel seria uma expedição multinacional, humanitária e científica para explorar a região da África Central, quase desconhecida.
Na prática, Leopoldo II estava lançando os alicerces da apropriação de um latifúndio cuja extensão territorial superou em dezenas de vezes a da Bélgica, passando por cima das populações locais.
O problema é que Leopoldo II era um monarca constitucional. E o governo belga, sensatamente, não quis se envolver com aventuras na África. O rei, então, resolveu o problema de maneira insólita. Se a Bélgica não queria o Congo, ele assumiria a região, como se se tratasse de uma enorme fazenda — em vez de ser colônia de um país, Leopoldo transformou a área em sua propriedade particular.
De olho em produtos como o marfim e a borracha, o rei foi aos poucos criando uma rede de patronato e influência que na Conferência de Berlim (1885) teve papel preponderante nas discussões da partilha europeia da África. No ano seguinte, Leopoldo II foi agraciado não apenas com uma imensidão de terras de 2 milhões de km², mas também com o controle sobre a vida de milhões de pessoas.
Exploradores belgas posam com presas de elefantes Reprodução / Crédito: Wikimidia Commons
Tudo isso diante de uma série de compromissos, como lutar contra a escravidão e promover o livre comércio na colônia, incluindo a isenção de impostos sobre produtos importados.
Em menos de dez anos, a realidade já estava marcada por uma enxurrada de decretos que não poderiam violar mais os termos dos acordos firmados em Berlim. Além de confiscar terras e aldeias inteiras de congoleses, o rei fez da escravidão a principal forma de trabalho em seus domínios.
Logo Leopoldo II aumentaria a carga de tributos e literalmente se tornaria dono de toda borracha e marfim extraídos no Congo. Suas vontades foram garantidas com a ajuda da Força Pública, um temível corpo de soldados reforçado por mercenários.
Quando não coagia líderes tribais a fornecer escravos para as atividades extrativistas, invariavelmente sequestrando mulheres e crianças como forma de garantir o cumprimento de cotas de produção, a Força Pública tinha carta branca para retaliar casos de desobediências e revoltas. Assassinatos, amputações, estupros e saques eram comuns em casos de cotas não cumpridas.
Tentativas de resistência mais veementes eram contidas com violência tão brutal que contribuiu generosamente para um total de mortos estimado por acadêmicos em 8 a 10 milhões de pessoas, ou o equivalente a quase metade da população congolesa de então.