ENEM, perguntado por marlongalodoido, 8 meses atrás

Oq é necessário para que as religiões tenham uma vivência pautada no diálogo e paz?​

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Respondido por msilvera651
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Resposta:

Não é difícil perceber, pela via da memória, que, no nível humano, ao contemplarmos os diversos acontecimentos da história, todos perdem quando não há paz entre vizinhos, familiares, amigos, grupos, povos, nações, etnias e religiões. Perdem inclusive aqueles que saem vitoriosos de conflitos, quando os inimigos são derrotados ou massacrados e os mais fracos subjugados. Todos perdem porque a violência nos desumaniza, nos embrutece e nos empobrece. Ela cria muros, impede o desenvolvimento do senso do coletivo e o cultivo da sensibilidade para com os excluídos. Não por falta de bom senso, todo ser humano carrega potencial de agressividade para a violência.

Mas o contrário também é verdadeiro, convincente e contagiante. Todos saem ganhando quando a cultura da paz é celebrada e concretizada entre vizinhos, familiares, amigos, povos, nações, etnias e religiões. E, por mais paradoxal que seja, todo ser humano abriga profundo potencial para o compromisso ético com a paz.

Neste caso, temos que afirmar que não compreendemos a paz como a mera ausência de conflitos violentos, de guerras entre os seres humanos. É muito mais do que essa ausência. Ela implica a materialização da justiça, a delimitação clara de limites e a afirmação compartilhada consensualmente de um mínimo de princípios éticos universais. Mas, antes de pensarmos sobre a paz na convivência entre as religiões, deixemo-nos guiar por dois pressupostos.

O primeiro é deduzido de um postulado atribuído ao grande líder da África do Sul, Nelson Mandela, e que lhe fazia teimosamente acreditar no caminho trilhado por ele para a construção da paz:

Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar.

Confesso que nunca procurei as fontes dessa afirmação de Mandela, mas para quem conhece a sua trajetória não é difícil atribuir-lhe credibilidade. Não haverá paz entre nós se não nos comprometermos com o testemunho e a educação para a paz.

O segundo explicita-se de uma afirmação categórica do grande teólogo suíço Hans Küng, um homem profundamente comprometido com a cultura da paz, logo no início de seu livro “Religiões do Mundo. Em busca de pontos comuns”:

Não haverá paz entre as nações, se não existir paz entre as religiões. Não haverá paz entre as religiões, se não existir diálogo entre as religiões. Não haverá diálogo entre as religiões, se não existirem padrões éticos globais. Nosso planeta não irá sobreviver, se não houver um ethos global, uma ética para o mundo inteiro.

De fato, não haverá paz entre nós se não criarmos as condições básicas para que ela seja possível e que tenhamos horizonte esperançado de futuro.

A paz entre as religiões como utopia possível e necessária

Quando lançamos mão, aqui, do termo “utopia” não estamos olhando no retrovisor da história, pois, assim, constataríamos que a paz seria, simplesmente, reduzida a uma espécie de sonho nunca realizado entre os seres humanos. Ao contrário, estamos mirando esperançadamente para o futuro. Com rigor etimológico, a concebemos na dialética do tempo passado-presente-futuro, como aquilo que ainda não encontrou lugar pleno ou definitivo entre nós. Por se tratar de realidade dinâmica e processual, a paz pode vir a ser concretizada entre nós de forma crescente. Tudo dependerá de nossas posturas e atitudes.

Três razões que me levam a crer firmemente que a construção da cultura da paz entre as religiões é uma utopia possível.

Primeiro, porque, por experiência própria, quando a religião conserva-se exclusivamente como mediação para a experiência luminosa do amor de Deus, sem qualquer pretensão de absolutizar-se, ela favorece a experiência da universalidade da dignidade humana na singularidade de cada pessoa. Ela conserva como único centro, em torno do qual tudo gravita, o mistério luminoso e inesgotável do amor divino. Desse modo, a experiência religiosa transforma e expande o coração do fiel até que este se torne a casa de todos. Passa, então, a acolher cada ser humano, independente de quem ele seja, como hóspede da humanidade. Supera-se, assim, toda forma de preconceito. Os muros, que antes impediam a aproximação, se transformam em pontes de diálogo e partilha fraterna.

Segundo, porque a humanidade já nos ofereceu inúmeros exemplos de homens e mulheres, líderes religiosos ou não, que reconheceram a beleza da pluralidade religiosa. Tais pessoas se tornaram buscadores de diálogo fraterno e forjaram sedutores e belos itinerários inter-religiosos. Reconheceram a presença do mistério do amor de Deus em cada pessoa e em cada religião. Constataram que nenhuma religião conseguiria e nem poderia, sem apequenar-se ou deturpar-se, pretender abarcar a totalidade da beleza divina. Além disso, mostraram que todas as religiões são históricas e por isso necessitam continuamente cultivar o processo de aperfeiçoamento.

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