Português, perguntado por Augustus8860, 11 meses atrás

O verão invadiu outubro e expulsou a primavera. Aqui estou, neste dia esplendente, reduzido a meu corpo. Sem passado, sem sonho, sem fuga. Presente em minhas unhas, em minha pele, em meus cabelos. Eu e os demais habitantes deste outubro coroado. Uma onça - não sei se já repararam - não tem costura. O verão, esta pantera, também não tem. E dentro dele estamos 5 nós, prisioneiros de uma jaula feliz. O verão não tem municípios, nem governo, nem câmara, nem eleições. Está deitado ao lado do mar e aos pés da montanha selvagem. Azul e verde, sal e clorofila. O verão é feroz. Especialmente um verão como este, ilegítimo, fora de época, produto de uma subversão planetária. Tudo nele está fora da lei, como a poesia e a paixão desvairada. Por 10 isso mesmo, tudo nele é intenso e efêmero, como se decidisse esbanjar toda a sua vida num dia apenas, com a urgência de quem vai morrer às seis da tarde, sangrando, esquartejado, sobre as montanhas do Leblon. O verão lembra uma máquina anômala cujas correias e roldanas se estendem por avenidas e rodam nas nuvens, espiralando, em câmera lenta, numa velocidade diferente dos aviões que 15 sobrevoam os quarteirões do Flamengo e o Morro da Viúva, preparando-se para descer na pista do Santos Dumont. Em meio ao verão, a chama da literatura bruxuleia e se apaga. Não se precisa de chave para abrir o mundo, quando ele se dá a nós, escancarado, sem espessura e sem sombras. O verão dos livros é eterno, pode esperar. Já o verão deste dia 25 de outubro de 2007 trepida à nossa 20 volta, urgente. Ferreira Gullar, Revista O Globo, 30/12/07 Identifique o comentário adequado a respeito da produção de sentido e da recepção do texto de Ferreira Gullar, levando-se em conta os fatores de textualidade e o conhecimento de mundo. (A) Em meio ao verão, a chama da literatura bruxuleia e se apaga. Não se precisa de chave para abrir o mundo, quando ele se dá a nós, escancarado, sem espessura e sem sombras. (linhas 17-18) Comentário: o fragmento do texto apresenta, pela intertextualidade, uma visão de contraste à seguinte estrofe de Carlos Drummond de Andrade, especialmente, na relação entre vida e criação literária: Chega mais perto e contempla as palavras. / Cada uma / tem mil faces secretas sob a face neutra / e te pergunta, sem interesse pela resposta, / pobre ou terrrível, que lhe deres: / Trouxeste a chave? (B) O verão é feroz. Especialmente um verão como este, ilegítimo, fora de época, produto de uma subversão planetária. Tudo nele está fora da lei, como a poesia e a paixão desvairada. (linhas 8-9) Comentário: O fragmento do texto, por meio da enumeração e da comparação, contraria a aceitabilidade do texto no que se refere à expectativa do leitor sobre a produção de sentido. (C) O verão lembra uma máquina anômala cujas correias e roldanas se estendem por avenidas e rodam nas nuvens, (linhas 13-14) Comentário: No fragmento do texto, o emprego do pronome relativo “cujas” institui pela catáfora, uma inadequação no mecanismo coesivo do texto. (D) Uma onça - não sei se já repararam - não tem costura. O verão, esta pantera, também não tem. E dentro dele estamos nós, prisioneiros de uma jaula feliz. (linhas 3-5) Comentário: A produção de sentido do trecho “prisioneiros de uma jaula feliz” garante a informatividade pelo uso exclusivo da linguagem denotativa. (E) O verão não tem municípios, nem governo, nem câmara, nem eleições. Está deitado ao lado do mar e aos pés da montanha selvagem. Azul e verde, sal e clorofila. (linhas 5-7) Comentário: A produção de sentido do trecho “azul e verde, sal e clorofila” se efetiva na intencionalidade do narrador em alarmar quanto aos efeitos danosos de um verão fora de época.

Anexos:

Soluções para a tarefa

Respondido por waltercaminha
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Olá, tudo bem? Vou te ajudar nessa questão:

A partir da leitura do texto de Ferreira Gullar e das alternativas dadas, podemos afirmar que a alternativa correta é a letra (A), que apresenta uma marca de intertextualidade entre este texto de Gullar e um poema de Carlos Drummond de Andrade.

A relação é de oposição, já que enquanto o poema de Drummond de Andrade exige uma chave para o mundo da leitura, o texto de Gullar aponta que não é preciso de chave para abrir um mundo já escancarado.

As demais alternativas apresentam comentários que não se articulam adequadamente com os trechos aos quais se referem.
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