o tempo do conto da igreja do diabo ?
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Resposta:O conto “A Igreja do Diabo” foi publicado em 1884 no livro Histórias sem data. O nome é bastante justo pois, logo ao ler este conto pela primeira vez, o leitor se fascina com a abordagem do tema de maneira tão atemporal.
A narrativa de “A Igreja do Diabo” conta do dia em que o diabo, sempre cúpido de poder e cansado da desorganização histórica em que vivia, resolve fundar sua própria igreja, com suas próprias regras. E regras muito atraentes para as pessoas: transgredir todas as leis, em especial, as leis divinas. O inimigo de Deus visava conquistar a hegemonia entre as religiões do mundo inteiro, prometendo infinitos lucros aos afiliados. Praticar o bem seria então condenável e fazer o que todos sempre tiveram que reprimir seria sublime. Resumindo: a eterna relação de Deus/religião, homem/razão.
A crítica e a irreverência se apresentam a todo momento ao longo da narrativa. Machado põe como a realização de nossos íntimos desejos a alegria do Diabo, em atitudes como praticar os sete pecados capitais, trapacear, cometer adultério ou mentir. Para a oficialização da decisão do diabo, mostra uma conversa entre o próprio e Deus, que o recebe pacificamente. Neste momento o demônio, com bastante ironia compara a religião a um comércio, dizendo a Deus: “Não tarda muito que o céu fique semelhante a uma casa vazia, por causa do preço, que é alto.”, ou seja, dizendo que paga-se caro para viver de acordo com as leis da Igreja. E também, é claro, fazendo uma alusão à questão da Igreja com o dinheiro de seus fiéis em troca da suposta salvação.
Ao longo da leitura vemos muitos exemplos de intertextualidades, o que veremos melhor adiante, mas a bíblia é a principal referência.. Porém, diferentemente do que possa parecer, a religião não é o tema central, pois, também vale citar o contexto histórico em que o conto foi publicado, em 1884. Na época, a decadência do Império era evidente, devido à propagação dos ideais positivistas que conclamavam a criação da República e, um dos alvos das críticas dos positivistas era a Igreja Católica, um dos pilares do regime monárquico.
Na realidade o tema central é a humanidade e suas contradições. Após serem apresentados a uma religião em que seriam contemplados por praticarem suas vontades sem terem que pensar em consequências, as pessoas começam aos poucos a praticar boas ações, ajudarem uns aos outros discretamente, como que parecessem não resistir a fazer o que, a partir de então, se apresentava como o proibido. Este súbito comportamento deixa satanás atônito, sem saber o que levava aquele povo a cometer tais condenáveis atitudes. Sente-se traído e procura Deus que dá o fechamento da estória, dando-lhe apenas, de maneira muito serena, a seguinte declaração: “É a eterna contradição humana.”
Um detalhe muito importante de se perceber na leitura é o fato de que Deus é apresentado com sabedoria, paciência e conivência com o livre-arbítrio: em nenhum momento se opunha às atitudes do diabo ou das pessoas, a exata imagem que nós fazemos de D’Ele. No entanto, o texto que faz uma crítica à humanidade, apresenta o diabo com características essencialmente humanas. Ele sente inveja e aspira ao poder e à dominação a todo momento, sentimentos extremamente humanos. A aplicação dessa personalidade ao diabo reforça o retrato que o autor faz de nossa natureza que é dividida entre o bem e o mal, o que podemos observar, por exemplo, no comportamento de crianças pequenas. Ao fazerem coisas que julgamos erradas, pode-se ver em seus rostos que sabem que estão fazendo algo que não devem e estão desfrutando da sensação de fazer algo proibido. A obra machadiana sempre evoca a reflexão da questão de nascermos com o bem e o mal e a questão de sermos corrompidos pelo meio em que vivemos, a nature X nurture. Vê-se também em todas as obras de Machado, sua maneira negativa de enxergar a alma humana, como corruptível e, não importando como ou com o quê, nunca se sente satisfeita.
O diabo, retratado de maneira extremamente alegórica, propõe uma doutrina muito semelhante à de Deus,a única diferença é que acaba por ser sua mais profunda negação. O diabo se propõe a negar o que reflete, mostrar o contrário, o que nos remete à citação de Santo Agostinho: “A igreja do Diabo imita a igreja de Deus”.
Os diálogos que o conto faz são fundamentais para sua composição e para a compreensão do mesmo. A começar pelo título que por si só já é uma paródia entre o divino (Deus) e o profano (Diabo), o primeiro uso de carnavalização. É parodiado também o confronto Escritura X Escritura, pelo fato de o diabo copiar os rituais da Igreja divina, e também a pedra fundamental, que o Diabo cita quando anuncia a criação da sua Igreja: “Vou lançar a minha pedra fundamental”.
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