o luga onde eu vivo o texto sobre esse tema ☝️
Soluções para a tarefa
Resposta:
euuuuuuuuu queria te ajuda mas eu não entendi
Resposta:
O lugar onde (eu) vivo
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“Tenho certeza de que no berço a minha primeira vontade foi a de pertencer. Por motivos que aqui não importam, eu de algum modo devia estar sentindo que não pertencia a nada e a ninguém. Nasci de graça.”
Pertencer (Clarice Lispector)
Bianca Borgianni
Existe um planeta chamado Terra, dentro tem um continente chamado América do Sul, dentro tem um país chamado Brasil e dentro dele uma cidade chamada São Paulo; dentro da cidade tem um bairro chamado Pompeia e, dentro, tem uma ladeira de paralelepípedos. Dentro da ladeira tem um monte de casinhas coloridas coladas umas nas outras, tem um monte de árvores inclinadas e três prédios. Um dos prédios é tão baixinho que deve ser muito antigo, do tempo em que não se construíam prédios imensos em São Paulo porque não teria gente suficiente pra morar neles; outro é muito novo e tem aquele jeito meio pós-moderno sem-graça de misturar tijolo com vidro na varanda; o último é um predinho meio novo, meio velho, meio discreto, bem no fim da ladeira. Não é alto nem baixo, não é feio nem bonito, não bate muito sol e nem por isso se torna hostil. As varandas são de grade verde, algumas têm muitas plantas, mas nunca tem gente nenhuma. Dentro do prédio tem meu vizinho de baixo, que senta num banquinho pra fumar e o cheiro de cigarro sobe todo para o meu apartamento - em cima do apartamento dele tem o meu. Dentro do meu tem alguns cubos coloridos repletos de livros e lugares pra ler; no mais tem cozinha e banheiro, tudo amarelinho, meio apertadinho, mas bem que dá pra viver.
O lugar onde vivemos é bem pequeno dentro mundo, mas o mundo que ele cria é enorme dentro da gente. Fazer essa pequena descrição do apartamento onde moro há dez anos me suscitou uma série de lembranças, um emaranhado de sensações cruas e imagens poucos nítidas de uma vida bastante vivida e pouco notada. Após este momento de imersão, esse choque subjetivo com a realidade concreta, a primeira pergunta que vem à mente é a seguinte: “Mas e daí? Minha vida, minha casa, meu quarteirão... a quem isso poderia interessar?”.
O questionamento sobre o porquê de escrever é fundamental no processo de criação literária, embora seja constantemente ignorado por conta da estrutura tradicional das aulas de redação, que pressupõem que o aluno está sempre disposto a escrever e que essa é apenas mais uma de suas atividades obrigatórias. Quando esse processo adquire uma finalidade em si (ou seja, quando o aluno escreve somente porque precisa entregar), a escrita perde o poder de interferir na relação sujeito/mundo e assume predominantemente uma função burocrática externa a ele, que em nada se relaciona com a sua subjetividade.
Respondendo à pergunta feita acima, pode-se dizer que a primeira pessoa a quem a expressão literária da vida pode interessar é ao próprio autor. O mundo interior de cada pessoa é um complexo redemoinho histórico, social e particular que se realiza em tempo presente; quando alguma situação exige que nos distanciemos da nossa própria vida e a transformemos em matéria de elaboração estética, a nossa experiência inevitavelmente se submete a intensos processos de significação e ressignificação. A vivência parte do plano concreto, onde estamos sujeitos à vida, para o plano da criação, onde somos os sujeitos da vida.
O trecho da Clarice Lispector citado no início deste texto é parte de uma crônica chamada “Pertencer”. Considerando que o sujeito se realiza na linguagem, essa ideia de pertencimento está intimamente relacionada ao processo de escrita, pois ao escrever, ele adquire o poder de realizar a sua subjetividade não-palpável no mundo das palavras. Ainda que para muitos alunos ele apareça como um recurso intimidador, o mundo das palavras é a mediação da realidade comum a todas as pessoas, e conseguir reverter a própria experiência em matéria narrável significa dar um passo muito grande na constituição da própria identidade perante o mundo.
O tema da Olimpíada de Língua Portuguesa é “O lugar onde vivo”, e recentemente chegamos à conclusão de que o sujeito oculto desta oração precisa sair das entrelinhas e assumir o papel principal. É claro que isso não significa que os alunos devam escrever em primeira pessoa histórias sobre si mesmos. O protagonismo ao qual nos referimos está na noção de autoria, que precisa estar cada vez mais livre dos modelos literários e cada vez mais vinculada à experiência dos alunos. Escrever sobre o lugar onde vivemos é escrever sobre nós mesmos e escrever sobre os nossos avós é também buscar entender a nossa própria história.