Geografia, perguntado por paulapobs123, 1 ano atrás

o ita pasava pelo litoral de quais estados brasileiros?

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Respondido por WillJhams
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Os itas,eram paquetes que faziam a navegação costeira de norte a sul do nosso vasto Brasil, parando de porto em porto. De 1910 até o começo dos anos 1950, só havia duas maneiras de um nortista ir para o sul: pegar o trem em Salvador até Juazeiro às margens do São Francisco, pelo Velho Chico ir de vapor até Pirapora e dali tomar o trem da Central até São Paulo e baldear ou não para o Rio; ou pegar um Ita e fazer toda a viagem por mar, cabotando. Acho que em cada família cearense há a lembrança de alguém que viajou num Ita, ecos de conversas com os nomes dos paquetes, idas e voltas, ou só idas e adeuses. Os Itas eram os navios da Lage & Irmãos, uma companhia fundada no Rio em 1882 por descendentes de um armador português que vieram para o Brasil e no começo tinham só quatro vapores ingleses. Em 1893 encomendaram na França e na Escócia quinze navios para compor uma linha de navegação desde Manaus até Porto Alegre. A linha Porto Alegre-Pará tinha os grandes, de cento e vinte metros, Itahité, Itaimbé, Itapagé, Itaipé, Itaquicé, e Itanagé. E havia os pequenos, de sessenta metros, Itatinga, Itaquatiá, Itaberá, Itapuca, Itagiba, Itapuhy, Itassucé, Itajubá, Itaquara. E Itapura, Itaipu, Itaguassu, Itapema, Itaúba... Claro, os navios passaram a ser chamados com intimidade, apenas por Ita. Nos anos 1950 a frota já era de mais de trinta navios. Todos de casco preto, e uma chaminé com uma belíssima cruz de Malta em bronze.

Vi num anúncio das partidas: 3 de maio, Itaquicé, Rio, Vitória, Salvador, Maceió, Recife, Natal, Fortaleza, São Luís e Belém. Câmaras frigoríficas, velocidade de 14 milhas horárias, 145 passageiros na primeira classe, quarenta na segunda e noventa na terceira. Itas recolhiam carga para todos os portos da Amazônia, com baldeação em Belém. Uns levavam melancias estivadas no convés, uma formosura por se ver. Passageiros do Norte levavam papagaios, aves canoras e outras silvestres, que ficavam expostos na popa a fim de serem vendidos. Iam animais nelore e guzerá, cavalos, grãos, de um lado a outro, diversos tipos de carregamento, além dos passageiros. Imagino os cearenses, e suas famílias, embarcando, as mulheres de chapéu florido e luvas e sombrinha, acenando o lencinho a partir do convés, as crianças assombradas, os homens em seus ternos brancos, mesmo os pobres, com chapéu de palha... adeus, coqueiros, adeus luares, adeus tapiocas... as bagagens de mudança... os sonhos na mente... no cais o povo acenando, a tristeza de quem fica e a saudade de quem vai. Partiam de manhãzinha.


Os comandantes eram todos ingleses, até 1910, e os navios iam num horário britânico, cumprindo escalas com rigor, marinheiros poliam metais o tempo todo, tudo cintilando. Um taifeiro passava com uma sineta chamando para as refeições, carne de peru era um luxo nas da primeira classe, e os copos, os talheres, tinindo. Havia quem viajasse na terceira e encomendasse a comida na segunda. Camarotes de terceira abrigavam várias famílias, e os passageiros ouviam um barulho constante de correntes se movendo dentro de um cano. Os marinheiros, em seus uniformes impecáveis, que as avós lavavam e passavam, eram educados, gentis, chegavam a ouvir mocinhas lendo livros em francês. Minha mãe foi de Ita com vovô, saindo de Fortaleza, ela ia cursar a Escola Doméstica de Natal, nos anos 1930. Ela conta que o navio estava repleto de estudantes que iam para o Rio, e ficavam zombando dos modos sertanejos da mocinha. Vovô, que era austero e altivo, a criticava com o olhar, para que se comportasse à altura do elegante navio.


Em 43 o Itapagé, pobrezinho, foi torpedeado por um submarino alemão e afundou em quatro minutos, morreu muita gente. O Itatiba desapareceu em 1919 depois de ter sido visto pela última vez saindo de São Tomé. Os demais, nos anos 1970 foram uns vendidos em leilão, e os restantes esperavam a demolição num cemitério de navios, na baía de Guanabara, enferrujados. Restaram as lembranças e a linda canção... Mamãe me deu uns conselhos Na hora de eu embarcar, Meu filho, ande direito, Que é pra Deus lhe ajudar. Ai ai, ai ai...



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