O CARIOCA E A ROUPA
Deu-se comigo outro dia uma experiência engraçada: fui ao
centro da cidade de blusa, coisa que me aconteceu várias vezes,
mas só então acrescida de um pormenor que introduziu um caráter
inédito à situação: levava debaixo do braço uma pasta de papéis,
feita de nylon.
Sim, pela primeira vez fui à cidade de blusa e pasta. Qualquer
um desses fatores quase nada significa isoladamente; reunidos,
alteraram radicalmente o tratamento que me deram todas as
pessoas desconhecidasQuando tomei um táxi, vi que o motorista torceu a cara, mas não
percebi o que se passava, pois experimentei semelhante má
vontade em outras circunstâncias. Reparei também certa
estranheza do motorista quando lhe dei de gorjeta o troco, mas
permaneci opaco ao fenômeno social que se realizava. Em um
restaurante comum, sentei-me para almoçar. O garçom, que até
então eu não vira mais gordo, tratou-me com uma intimidade
surpreendente e, em vez de elogiar os pratos pelos quais eu
indagava, entrou a diminuí-los: “aqui a gororoba é uma coisa só;
serve para encher o bandulho. Não sou de raciocínio rápido mas,
em súbita iluminação, percebi, com todo o prazer da novidade, que
eu estava vestido de mensageiro: pasta e blusa. Ao longo da tarde,
fui compreendendo que, até hoje, não tinha a menor ideia do que é
ser um mensageiro. Pois eu lhes conto. Um mensageiro é, antes de
tudo, um triste. Tratado com familiaridade agressiva
pelos epítetos de “amigo”, “chapa” e “garotão”, o que há de afetivo
nestes nomes é apenas um disfarce, pois atrás deles o tom de voz
é de comando. “Quer deixar o papai trabalhar, garotão”, disse-me o
faxineiro de um banco, cutucando-me os pés com a ponta da
vassoura.
Entendi muitas outras coisas humildes: o mensageiro não tem
direito a réplica; é barrado em elevadores de lotação ainda não
atingida; posto a esperar sem oferecimento de cadeira; atendido
com um máximo de lentidão; olhado de cima para baixo; batem-lhe
com vigor no ombro para pedir passagem; ninguém lhe diz
“obrigado” ou “por favor”; prestam-lhe informações em relutância; as
mulheres bonitas sentem-se ofendidas com o olhar de homenagem
do mensageiro; os vendedores lhe dizem “não tem” com um deleite
sádico.
Foi uma incursão involuntária à natureza de uma sociedade
dividida em castas. Preso à minha classe e a algumas roupas, dizia
o poeta, vou de branco pela rua cinzenta. No fim da tarde, eu já
procedia como um mensageiro, só me aproximando dos outros com
precauções e humildade, recolhendo de meu rosto
qualquer veleidade de um sorriso inútil, jamais correspondido.
Dentro de mim uma vontade de sofrer. Por todos os mensageiros
do mundo, meus irmãos. Por todos os meus irmãos para os quais a
humilhação de cada dia é certa como a própria morte. Porque o pior
de tudo é que as pessoas não sorriam. O pior é que ninguém sorri
para os mensageiros.
A) Em sua opinião, qual público o autor espera atingir com seus textos?
B) O que em sua opinião, torna a crônica um gênero atraente para o seu
público? Comente.
C) Estar “vestido de mensageiro” corresponde a que profissão hoje? Se
considerar necessário, pesquise na internet.
D) Por que não existe mais essa profissão? Explique.
Soluções para a tarefa
Respondido por
10
letra A) a população como um todo
letra B) a firma como foi escrita,chama a atenção dos leitores!
letra c) Essa profissão corresponde à profissão de office boy, boy (há também a forma aportuguesada “bói”) ou contínuo. Hoje. Normalmente, quem realiza as funções do mensageiro é o motoboy
D) porquê o mundo se modernizou,evoluiu!!!
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