No romance A caverna, narra-se a história de um artesão que passa a ter sua produção rejeitada pelo megacentro econômico que monopoliza o comércio da cidade. A anulação do trabalho manual pela tecnologia, bem como a exploração destrutiva do homem e da natureza pelo capitalismo, são temas que permeiam a narrativa. Neste fragmento, você vai acompanhar a cena em que o protagonista volta para casa, no campo, depois de viver na cidade, em busca de trabalho. A caverna Enfim, a cidade ficou para trás, os bairros da periferia já lá vão, daqui a pouco aparecerão as barracas, em três semanas terão chegado à estrada, não, ainda lhes faltam uns trinta metros, e logo está a Cintura Industrial, quase tudo parado, só umas poucas fábricas que parecem fazer da laboração contínua a sua religião, e agora a triste Cintura Verde, as estufas pardas, cinzentas, lívidas, por isso é que os morangos devem ter perdido a cor, não falta muito para que sejam brancos por fora como já o vão sendo por dentro e tenham o sabor de qualquer coisa que não saiba a nada. Viremos agora à esquerda, lá ao longe, onde se vêem aquelas árvores, sim, aquelas que estão juntas como se fossem um ramalhete, há uma importante estação arqueológica ainda por explorar, sei-o de fonte limpa, não é todos os dias que se tem a sorte de receber directamente1 uma informação destas da boca do próprio fabricante. Cipriano Algor já perguntou a si mesmo como foi possível que se tivesse deixado encerrar durante três semanas sem ver o sol e as estrelas, a não ser, torcendo o pescoço, de um trigésimo quarto andar com janelas que não se podiam abrir, quando tinha aqui este rio, é certo que malcheiroso e minguado, esta ponte, é certo que velha e mal amanhada2, e estas ruínas que foram casas de gente, e a aldeia onde tinha nascido, crescido e trabalhado, com a sua estrada ao meio e a praça à desbanda3 (...) A praça ficou para trás, de repente, sem avisar, apertou-se-lhe o coração a Cipriano Algor, ele sabe da vida, ambos o sabem, que nenhuma doçura de hoje será capaz de minorar o amargor de amanhã, que a água desta fonte não poderá matar-te a sede naquele deserto, Não tenho trabalho, não tenho trabalho, murmurou, e essa era a resposta que deveria ter dado, sem mais adornos nem subterfúgios, quando Marta lhe perguntou de que iria viver, Não tenho trabalho. Nesta mesma estrada, neste mesmo lugar, como no dia em que vinha do Centro com a notícia de que não lhe comprariam mais louça (...). O motor da furgoneta4 cantou a canção do regresso ao lar, o condutor já via as frondes5 mais altas da amoreira, e de repente, como um relâmpago negro, o Achado veio lá de cima, a ladrar, a correr pela ladeira abaixo como se estivesse enlouquecido (...). Abriu a porta da furgoneta, de um salto o cão subia-lhe aos braços, sempre era certo que seria ele o primeiro, e lambia-lhe a cara e não o deixava ver o caminho (...). (SARAMAGO, J. A caverna. São Paulo: Cia. das Letras, 2003.) 5 10 15 20 Vocabulário: 1 directamente – grafia portuguesa para “diretamente” 2amanhada – arranjada, adornada 3à desbanda – ao lado 4 furgoneta – veículo de passageiros e pequena carga 5 frondes – copas das árvores.QUESTÃO 02-No texto, o modo de organização discursiva se altera para expressar diferentes intenções comunicativas do narrador: informar, descrever ou narrar; expressar emoções, julgamentos ou opiniões pessoais; aconselhar, ordenar ou interrogar, etc. Transcreva duas passagens nas quais se faça referência à degradação do meio ambiente: uma que apresente a função referencial − própria das descrições − e outra que apresente a função expressiva − por meio da qual se emitem opiniões pessoais. QUESTÃO 01 (...) de que não lhe comprariam mais a louça (l. 20) No fragmento acima, o pronome sublinhado refere-se ao personagem principal da narrativa. Além disso, estabelece, em relação ao substantivo louça, uma determinada relação de sentido. Indique essa relação de sentido e retire do texto outro fragmento em que se utilize esse mesmo tipo de estrutura. QUESTÃO 03 Além de possuir conhecimento total da narrativa, das ações, dos sentimentos e dos pensamentos dos personagens, o narrador do texto influencia os leitores, na medida em que os convida a participar dessa onisciência, tratando-os como reais interlocutores. Transcreva os dois trechos da narrativa em que se verifica essa interlocução.
Soluções para a tarefa
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e enterresante
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muito legal coloca essa resposta
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