No Brasil existem uma infinidade de leis, mas estas leis são respeitadas e praticadas? Justifique sua resposta
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ontrariando a consagrada frase “faça uma lei apenas se estiver disposto a morrer por ela”, o Brasil tem incríveis mais de 200 mil leis. No entanto, a aplicabilidade delas é reduzida, estimulando a criação de novas legislações: um levantamento apontou que, em média, são criadas 18 novas leis por dia no país. Muitas são inconstitucionais, outras “não pegam” e parcela considerável gera consequências perversas e destoantes das intenções iniciais. Mas, afinal, por que tantas leis e por que elas são tão ruins e “doidas”?
Inicialmente, vale dizer que a maioria dos Projetos de Lei (PL) é produzida sem se analisar se respeitam ou não os princípios constitucionais. Após sancionadas, cria-se uma problemática, pois passa a ser necessária uma análise do Judiciário para declarar sua inconstitucionalidade. Isso criou uma rotina em tribunais para descartá-las, sendo mais um ingrediente dentro de um universo com mais de 100 milhões de processos em tramitação.
Muitas outras leis sancionadas não se encaixam à realidade social pela centralização de poder e pela distância dos legisladores do cotidiano das pessoas, contribuindo para a criação de “leis que não pegam”. Entre elas, temos a lei que obriga o uso de cinto de segurança em ônibus rodoviários, a lei que regulamenta os flanelinhas, que precisam se cadastrar no Ministério do Trabalho, ou a norma que obriga ciclistas a terem em suas bicicletas campainha, refletores e espelho retrovisor. Você, leitor, provavelmente não conhecia essas leis, justamente porque “elas não pegaram”. Igualmente comum é a criação de leis sem qualquer relevância, como as que tem finalidade de homenagear carreiras.
Entrementes, a culpa não é apenas dos políticos: nós também somos culpados, como aponta a Teoria da Escolha Pública. Há um senso comum entre os brasileiros de que quanto mais PLs apresentados e mais Leis aprovadas por um vereador ou um deputado, mais produtivo ele é. Rankings elaborados por mídias colocam isso como um indicador de produtividade, estimulando essa crença. Embora a quantidade de leis aprovadas possa ser um termômetro para medir o protagonismo do parlamentar (se ele consegue influenciar seus pares), não há relação entre muitas leis aprovadas e um bom mandato, até porque o legislador também tem função de fiscalizar o Poder Executivo.
A explicação está em nossas raízes: Bruno Garschagen, ao fazer uma análise histórica de nossa formação cultural, demonstrou que o estatismo brasileiro “não é um acaso, e sim uma obra de séculos”. E isso se reflete na opinião do eleitorado: se olharmos sites que pedem a opinião popular sobre proposições dos parlamentares, é comum que a maioria delas seja aprovada pelo público – e as redes sociais comprovam isso. Em suma, os legisladores ofertam o que o eleitorado demanda.
O professor da PUCPR Dean de Almeida colabora com esse entendimento: “muitas vezes o parlamentar sabe que o projeto é absurdo, mas, para não ‘passar em branco’ diante dos eleitores, propõe sugestões das mais descabidas”. Dessa forma, a associação entre aprovar inúmeras leis e ser um congressista eficiente tem sido tratada como absolutamente natural. Esse consenso do eleitorado acaba estimulando a produção delas, mesmo que inúteis, inconstitucionais, irresponsáveis fiscalmente, irrelevantes ou ruins.
Outro fator que estimula a indústria legislativa é a denominada legislação-álibi. Ela ocorre diante de certa insatisfação da sociedade perante algo, sendo uma resposta pronta e célere do ente governamental. Trata-se de uma aparente solução: transmite a mensagem de um Estado que responde normativamente aos problemas reais da sociedade, podendo, até mesmo, introduzir um sentimento de bem-estar nas pessoas, porém não costuma ter efeito prático naquilo que se propõe solucionar. Não se trata de uma exclusividade brasileira, porém podemos verificá-la com frequência por aqui.
Além da quantidade, a qualidade das leis é outro ponto a ser considerado: a maioria é inconstitucional, principalmente na esfera estadual (estima-se incríveis 80%). Isso se deve à falta de assessoria qualificada (muitas vezes, políticos “premiam” seus melhores cabos eleitorais como assessores, não tendo em sua equipe bons profissionais do direito e economia, cruciais para elaborarem estudos consequencialistas de legislações).
Assim, Projetos de Lei não apresentam argumentos ou justificativas técnicas e são, na verdade, resultado de negociações partidárias e trocas de favores políticos. Mesmo bem intencionadas, políticas públicas podem gerar resultados contraditórios ao pretendido, daí a necessidade de estudos prévios e com metodologias adequadas. O que se vê no Brasil é que raramente há alguma análise sobre os impactos delas. Vejam: Um Novo Código Comercial foi proposto e está em tramitação no Congresso, mas um estudo mostrou que sua aprovação representaria prejuízo de 182 bilhões de reais. Até a divulgação da pesquisa, os parlamentares não faziam ideia do custo que isso poderia representar ao país.