Não pensa nisto, Jorge.
— Estou ficando velho, Zilda. Velho e fraco. Sinto que não vou durar muito.
— Não pensa nisto, Jorge. Pensa nas coisas boas da vida.
— Estas dores no estômago. Para mim isto é câncer. O médico diz que não, mas acho que ele está me enganando. Para mim é câncer, Zilda.
— Não pensa nisto, Jorge. Pensa nos momentos felizes que vivemos juntos.
— Eu sei que é câncer, Zilda. Já vi muita gente morrer dessa doença. É uma morte horrível, Zilda. A gente vai se consumindo aos poucos.
— Não pensa nisto, Jorge. Pensa no teu trabalho. Pensa nos teus colegas, no chefe que gosta tanto de ti.
— Primeiro a gente emagrece. Já estou emagrecendo. Perdi cinco quilos neste ano. Aliás, como passou ligeiro este ano. Como passam ligeiro os anos. Como passam ligeiro os dias, as horas. Quando a gente vê, já é noite. Quando a gente vê, terminou o mês. Quando a gente vê, acabou a vida.
— Não pensa nisto, Jorge. Pensa na tua turma do bolão, gente alegre, divertida.
— Logo terei de me hospitalizar. E no hospital a gente vai ligeirinho, Zilda. Acho que é por causa do desamparo. O desamparo é horrível.
— Não pensa nisto, Jorge. Pensa nos teus filhos. Pensa na Rosa Helena, no Zé. Pensa no Marquinhos, Jorge.
— Tenho medo de morrer, Zilda. Me envergonho disso, afinal, já vivi tanto, mas a verdade é que tenho medo de morrer. A morte é o fim. Não acredito na vida após o túmulo. Acho que na tumba acaba tudo. A carne se desprende dos ossos, os cabelos caem, fica a caveira à mostra. Isto é a morte, Zilda. Isto é que é a morte.
— Não pensa nisto, Jorge. Pensa na tua horta. Pensa nas galinhas, Jorge. Pensa numa galinha chocando os ovos, Jorge.
— Uma galinha com câncer, Zilda?
— Por que não, Jorge, por que não?
SCLIAR, Moacyr. Não pensa nisto, Jorge. In: A orelha de Van Gogh. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
O conto de Moacyr Scliar é reduzido aos elementos mínimos e essenciais.
Escreva uma pequena introdução narrativa para o texto de Moacyr Scliar, apresentando as personagens e criando um contexto para o diálogo. O narrador deve ser em 3a pessoa e onisciente.
Soluções para a tarefa
Introdução narrativa para o texto "A orelha de Van Gogh" de Moacyr Scliar, apresentando as personagens e criando um contexto para o diálogo:
Narrador onisciente geralmente fala na terceira pessoa e é aquele que conhece as personagens e narra a história com conhecimento do fatos ocorridos.
"A gente sabe. Nunca é fácil para ninguém, mas para Jorge estava muito complicado. Passada a vida em revista e lá estava Jorge muito aflito. Tinha que lidar com a dor. Dor de ser. Dor de ter. E só Jorge sabia o que.
Nessas horas, nem a horta, nem a turma do bolão, não...não...Jorge estava medroso de viver e de morrer. E era na conversa com a Zilda, a dos momentos mais felizes e de quem só ouvia os bons conselhos...que repetia sem fim a ladainha dos vivos."
Bons estudos!
Resposta:
Acentua, porque o leitor como que presencia o diálogo, como acontece no teatro, sem a intermediação do narrador.
Explicação:
TC online - Plurall