Não cuides, Doroteu, que brandas penas
Me formam o colchão macio e fofo;
Não cuides que é de paina a minha fronha
E que tenho lençóis de fina holanda,
15 -- Com largas rendas sobre os crespos folhos;
Custosos pavilhões, dourados leitos
E colchas matizadas, não se encontram
Na casa mal provida de um poeta,
Aonde há dias que o rapaz que serve
20 -- Nem na suja cozinha acende o fogo.
Mas, nesta mesma cama, tosca e dura,
Descanso mais contente, do que dorme
Aquele, que só põe o seu cuidado
Em deixar a seus filhos o tesouro
25 -- Que ajunta, Doroteu, com mão avara,
Furtando ao rico e não pagando ao pobre.
Aqui... mas onde vou, prezado amigo?
Deixemos episódios que não servem,
E vamos prosseguindo a nossa história.
Apenas, Doroteu, o nosso chefe
65 -- As rédeas manejou, do seu governo,
Fingir-nos intentou que tinha uma alma
Amante da virtude. Assim foi Nero.
Governou aos romanos pelas regras
Da formosa justiça, porém logo
70 -- Trocou o cetro de ouro em mão de ferro.
Manda, pois, aos ministros lhe dêem listas
De quantos presos as cadeias guardam,
Faz a muitos soltar e aos mais alenta
De vivas, bem fundadas esperanças.
75 -- Estranha ao subalterno, que se arroga
O poder castigar ao delinqüente
Com troncos e galés; enfim ordena
Que aos presos, que em três dias não tiverem
Assentos declarados, se abram logo
80 -- Em nome dele, chefe, os seus assentos.
Aquele, Doroteu, que não é santo,
Mas quer fingir-se santo aos outros homens,
Pratica muito mais, do que pratica
Quem segue os sãos caminhos da verdade.
85 -- Mal se põe nas igrejas, de joelhos,
Abre os braços em cruz, a terra beija,
Entorta o seu pescoço, fecha os olhos,
Faz que chora, suspira, fere o peito,
E executa outras muitas macaquices
90 -- Estando em parte onde o mundo as veja.
Assim o nosso chefe, que procura
Mostrar-se compassivo, não descansa
Com estas poucas obras: passa a dar-nos
Da sua compaixão maiores provas.O povo, Doroteu, é como as moscas
180 -- Que correm ao lugar, aonde sentem
O derramado mel; é semelhante
Aos corvos e aos abutres, que se ajuntam
Nos ermos, onde fede a carne podre.
À vista, pois, dos fatos, que executa
185 -- O nosso grande chefe, decisivos
Da piedade que finge, a louca gente
De toda a parte corre a ver se encontra
Algum pequeno alívio à sombra dele.
Questões
1- Qual é a condição social do poeta? (Tomás Antônio Gonzaga)
2- Comparada sua condição com a do rico, qual o poeta prefere? Por quê?
3- Que tipo de relação o povo mantém com o governador?
Soluções para a tarefa
Respondido por
8
1- A condição social do poeta é de pobreza.
2- Prefere a sua porque na cama tosca e dura ele descansa contente.
3- O povo é subalterno ao governador.
2- Prefere a sua porque na cama tosca e dura ele descansa contente.
3- O povo é subalterno ao governador.
Perguntas interessantes