Leia a seguir o trecho da crônica Policarpo Azêdo, 35 de Paulo Henriques Britto. Nela, o protagonista atravessa a cidade do Rio de Janeiro por causa de uma sacola esquecida por uma passageira do metrô.
Trinta e poucos minutos depois – não sei exatamente quantos, consultei o relógio quando chegamos à estação Sáenz Peña, mas como não tinha visto as horas no momento da partida não cheguei a conclusão nenhuma – 1saltei do metrô, emergi numa praça Sáenz Peña muito diferente da que eu guardava na memória, 2as únicas coisas que permaneciam iguais eram as montanhas da Tijuca ao fundo, e talvez o monumento ao radioginasta também, imagino que sim, não fui conferir, certamente não teria havido motivo para fazerem uma desfeita aos radioginastas e retirarem aquela homenagem a eles, quiçá a única existente no mundo, e saí em direção à rua Desembargador Policarpo Azêdo, que segundo o mapa ficava a uns oito ou nove quarteirões dali, talvez mais, mas eu não estava com pressa nenhuma, 3estava indo em direção a uma ruazinha desconhecida para mim e para a grande maioria da população da cidade, para não falar na humanidade; era um dia quente, nublado, as ruas estavam mais vazias do que eu esperava encontrá-las, e quanto mais me afastava da praça mais vazias elas iam ficando, de modo que senti estar mergulhando na Tijuca profunda, num daqueles bairros ou sub-bairros de nomes nostálgicos, Aldeia Campista, Andaraí, até que, 4dobrando uma esquina que parecia saída dos porões da minha infância, se é que a infância tem porões, entrei numa travessa estreita onde, se houvesse justiça no mundo, três ou quatro moleques descalços deveriam estar jogando bola, mas não, não havia ninguém na rua, verdadeiramente não há justiça neste mundo, que afinal é o único mundo que há. 5A rua Desembargador Policarpo Azêdo era bem pequena, muito menor do que seu próprio nome; num mundo em que houvesse não apenas justiça como também lógica, o nome dela seria travessa Dona Amélia ou rua do Sabão ou algo do mesmo calibre, jamais rua Desembargador Policarpo Azêdo, com circunflexo redundante e tudo; 6eu havia me enfiado num recanto da cidade aonde a reforma ortográfica de 1971 ainda estava por chegar. 7De saída não consegui encontrar o número 35, passei direto do 33 para o 37, os dois separados por um arco pequeno; 8o 37 era um prédio de três ou quatro andares de uma feiura indescritível, vá lá o clichê, quiçá o prédio mais feio de toda a cristandade, parecia ser só fundos, 9não era possível que os fundos dele tivessem mais cara de fundos do que aquela fachada, se fachada era; mas depois de algum tempo percebi uma placa meio descorada abaixo da placa do 37, que em caracteres não muito grandes dizia 35 fundos, e 10compreendi que, se passasse por debaixo daquela espécie de porta-cocheira para carruagens projetadas para anões, e certamente puxadas por pôneis, situada entre o 33 e o 37, eu haveria de encontrar, atrás do 33 e do lamentável 37, uma casa, a qual haveria de ser o 35.
Disponível em: . Acesso em: 10 mai. 2021.
Ideias contrárias são exploradas de diversas maneiras em textos, e a antítese representa uma delas. Entre os trechos destacados a seguir, assinale aquele que explora essa figura de linguagem:
A
saltei do metrô, emergi numa praça Sáenz Peña muito diferente da que eu guardava na memória (ref. 1).
B
as únicas coisas que permaneciam iguais eram as montanhas da Tijuca ao fundo, e talvez o monumento ao radioginasta (ref. 2).
C
A rua Desembargador Policarpo Azêdo era bem pequena, muito menor do que seu próprio nome (ref. 5).
D
eu havia me enfiado num recanto da cidade aonde a reforma ortográfica de 1971 ainda estava por chegar (ref. 6).
E
não era possível que os fundos dele tivessem mais cara de fundos do que aquela fachada (ref. 9).
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Respondido por
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Resposta:
E
Explicação:
eu acho que é isso
mais é isso
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