I. Cinquenta anos! Não era preciso confessá‐lo. Já se vai sentindo que o meu estilo não é tão lesto* como nos primeiros dias. Naquela ocasião, cessado o diálogo com o oficial da marinha, que enfiou a capa e saiu, confesso que fiquei um pouco triste. Voltei à sala, lembrou‐me dançar uma polca, embriagar‐ me das luzes, das flores, dos cristais, dos olhos bonitos, e do burburinho surdo e ligeiro das conversas particulares. E não me arrependo; remocei. Mas, meia hora depois, quando me retirei do baile, às quatro da manhã, o que é que fui achar no fundo do carro? Os meus cinquenta anos.
*ágil
II. Meu caro crítico,
Algumas páginas atrás, dizendo eu que tinha cinquenta anos, acrescentei: "Já se vai sentindo que o meu estilo não é tão lesto como nos primeiros dias". Talvez aches esta frase incompreensível, sabendo‐se o meu atual estado; mas eu chamo a tua atenção para a sutileza daquele pensamento. O que eu quero dizer não é que esteja agora mais velho do que quando comecei o livro. A morte não envelhece. Quero dizer, sim, que em cada fase da narração da minha vida experimento a sensação correspondente. Valha‐me Deus! é preciso explicar tudo.
Machado de Assis, Memórias Póstumas de Brás Cubas.
A passagem final do texto II – "Valha‐me Deus! é preciso explicar tudo." – denota um elemento presente no estilo do romance, ou seja,
(A) o realismo, visto no rigor explicativo dos fatos.
(B) a religiosidade, que se socorre do auxílio divino.
(C) o humor, capaz de relativizar as ideias.
(D) a metalinguagem, que imprime linearidade à narração. (E) a ironia, própria do discurso positivo
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O trecho trata tanto do processo crítico de envelhecimento, mas também sobre a dificuldade de compreensão do leitor, onde o narrador traz um tom de humor à sua narrativa, diminuindo a gravidade da situação exposta.
Em Memórias Póstumas de Brás Cubas este é um recurso utilizado com alguma frequência em outras passagens, trazendo o tom de humor a situações sérias.
A alternativa correta é a C – humor, capaz de relativizar as ideias.
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