Guerreiros, ouvi:
Sou filho das selvas,
Nas selvas cresci;
Guerreiros, descendo
Da tribo Tupi.
Da tribo pujante,
Que agora anda errante
Por fado inconstante,
Guerreiros, nasci;
Sou bravo, sou forte,
Sou filho do Norte;
Meu canto de morte,
Guerreiros, ouvi.
Aos golpes do imigo,
Meu último amigo,
Sem lar, sem abrigo
Caiu junto a mi!
Com plácido rosto,
Sereno e composto,
O acerbo desgosto
Comigo sofri.
Meu pai a meu lado
Já cego e quebrado,
De penas ralado,
Firmava-se em mi:
Nós ambos, mesquinhos,
Por ínvios caminhos,
Cobertos d’espinhos
Chegamos aqui!
Eu era o seu guia
Na noite sombria,
A só alegria
Que Deus lhe deixou:
Em mim se apoiava,
Em mim se firmava,
Em mim descansava,
Que filho lhe sou.
Ao velho coitado
De penas ralado,
Já cego e quebrado,
Que resta? — Morrer.
Enquanto descreve
O giro tão breve
Da vida que teve,
Deixai-me viver!
Não vil, não ignavo,
Mas forte, mas bravo,
Serei vosso escravo:
Aqui virei ter.
Guerreiros, não coro
Do pranto que choro:
Se a vida deploro,
Também sei morrer.
A partir do trecho apresentado, extraído do clássico
poema do indianismo brasileiro I-Juca Pirama,
julgue os itens a seguir.
a) No contexto da literatura brasileira do século XIX, era
incomum o recurso a protagonistas ameríndios em
poemas épicos e romances. Especialmente os autores
que se filiavam ao romantismo tenderam a dar destaque,
nos seus textos a heróis de proveniência europeia, como
forma de rejeitar o projeto de uma identidade brasileira,
bem como de restaurar os laços com a cultura europeia,
que haviam sido cortados desde a independência.
b) O refrão do poema — “Meu canto de morte,/ Guerreiros,
ouvi” — remete ao passado do personagem épico I-Juca
Pirama, como indica o emprego da forma verbal “ouvi”,
flexionada no pretérito do indicativo.
c) Ao utilizar como recurso de composição a narrativa em
primeira pessoa do singular, o autor potencializa o apelo
romântico do texto, fazendo que o drama do personagem
Tupi seja sublinhado pela perspectiva íntima, a partir da
qual os fatos são apresentados.
d) Para conferir dramaticidade ao momento de tensão em
que o índio Tupi se apresenta à tribo que o aprisionou, o
poeta utiliza esquema métrico e rítmico ágil, destacando-
se a redondilha maior e as rimas cruzadas.
e) O índio, nesse poema de Gonçalves Dias e nas demais
obras do indianismo romântico brasileiro, é representado
segundo técnica literária realista, por meio da qual se
pretende revelar o índio como legítimo dono das terras e
da identidade cultural do país.
f) Verifica-se, nas últimas estrofes apresentadas, que o
grande temor do personagem narrador é a morte, apesar
de a desdita que a vida reservou a ele e a seu pai ser
apresentada em forma de lamento.
g) O movimento romântico brasileiro, do qual o poema I-
Juca Pirama é produção exemplar, procurou estabelecer
as bases literárias da identidade cultural brasileira,
objetivando a superação do cosmopolitismo expresso
pela estética neoclássica, característica do Arcadismo.
h) Autores do modernismo brasileiro retomaram o tema do
índio moralmente forte como símbolo da nação, como se pode verificar na obra Macunaíma de Mario de Andrade
Soluções para a tarefa
I-JUCA PIRAMA
Este texto é uma espécie de síntese do indianismo de Gonçalves Dias seja pela concepção épico-dramática da bravura e da generosidade de tupis e timbiras, seja pela ruptura, ainda que momentânea, da convencional coragem guerreira, seja ainda pelo belíssimo jogo de ritmos que ocorre no texto. I-Juca Pirama significa "aquele que vai morrer" ou "aquele que é digno de ser morto". Em sua abertura, o poeta apresenta o cenário onde transcorrerá a história:
No meio das tabas de amenos verdores,
Cercadas de troncos - cobertos de flores,
Alteiam-se os tetos de altiva nação. (...)
São todos Timbiras, guerreiros valentes!
Seu nome lá voa na boca das gentes,
Condão de prodígios, de glória e terror!
Em seguida, inicia-se um ritual antropofágico: "Em fundos vasos d'alvacenta argila / ferve o cauim. / Enchem-se as copas, o prazer começa, / reina o festim." O jovem prisioneiro tupi, que vai ser devorado, resolve falar antes do desenlace, e com "triste voz" narra a sua vida desventurada.
Ao metro anterior, de dez sílabas poéticas, plástico e alegre, sucedem-se os versos de cinco sílabas, curtos, rápidos, sincopados. Estas variações contínuas indicam que o ritmo varia de uma parte do poema a outra, traduzindo a multiplicidade de situações do argumento.
Meu canto de morte
Guerreiros, ouvi:
Sou filho das selvas,
Nas selvas cresci;
Guerreiros, descendo
Da tribo tupi
Da tribo pujante,
Que agora anda errante
Por fado inconstante,
Guerreiros, nasci:
Sou bravo, sou forte,
Sou filho do Norte;
Meu canto de morte,
Guerreiros, ouvi.
O índio tupi no seu canto de morte lembra o velho pai, cego e débil, vagando sozinho, sem amparo pela floresta, e pede para viver:
Deixai-me viver! (...)
Não vil, não ignavo,*
Mas forte, mas bravo,
Serei vosso escravo:
Aqui virei ter.
Guerreiros, não choro;
Do pranto que choro;
Se a vida deploro,
Também sei morrer.
* Ignavo: preguiçoso.
O chefe timbira manda soltá-lo. Não quer "com carne vil enfraquecer os fortes". Solto, o jovem tupi perambula pela floresta até encontrar o pai. Este, pelo cheiro das tintas utilizadas no ritual, pelo apalpar do crânio raspado do filho, e por algumas perguntas sem resposta, desconfia de uma terrível fraqueza diante dos inimigos. Pede então que o rapaz o leve até a aldeia timbira. Lá chegando, exige, em nome da honra tupi, que a cerimônia antropofágica ritual seja completada e que o filho seja morto. Mas o chefe timbira recusa-se, acusando o guerreiro tupi de ter chorado covardemente diante de toda a aldeia. Neste momento, o velho cego amaldiçoa o seu descendente:
Tu choraste em presença da morte?
Na presença de estranhos choraste?
Não descende o cobarde do forte;
Pois choraste, meu filho não és!
Possas tu, descendente maldito
De uma tribo de nobres guerreiros,
Implorando cruéis forasteiros,
Seres presa de vis Aimorés. (...)
Sê maldito, e sozinho na terra;
Pois que a tanta vileza chegaste,
Que em presença da morte choraste,
Tu, cobarde, meu filho não és.
Mal termina a maldição, o velho escuta o grito de guerra do filho. Ouvindo o rumor da batalha, os sons de golpes, o pai percebe que o filho está lutando para manter a honra tupi, até que o chefe timbira manda seus guerreiros pararem, pois o jovem inimigo se batia com tamanha coragem que se mostrava digno do ritual antropofágico. Com lágrimas de alegria o velho tupi exclama: "Este, sim, que é meu filho muito amado!"
Como chave de ouro do poema, ocorre uma transposição temporal no seu último canto. O leitor fica sabendo que os acontecimentos dramáticos vividos pelos dois tupis já tinham ocorrido muito tempo e que tudo aquilo era matéria evocada pela memória de um velho timbira:
Um velho timbira, coberto de glória,
guardou a memória
do moço guerreiro, do velho Tupi!
E à noite, nas tabas, se alguém duvidava
do que ele contava,
Dizia prudente: - Meninos, eu vi!
OS TIMBIRAS
Além desses poemas indianistas, Gonçalves Dias tenta elaborar uma epopéia intitulada Os Timbiras. Era um projeto ambicioso: os índios substituindo os heróis gregos, numa Ilíada brasileira, tropical, com abundantes e coloridas descrições da flora e da fauna. A narrativa teria como eixo a formação e dispersão do povo timbira. A obra, contudo, fica inconclusa e os fragmentos elaborados são inexpressivos.
Sobre a literatura brasileira e o poema do indianismo Juca Pirama podemos julgar que as afirmativas são, respectivamente:
a) Incorreta.
O índio, na primeira fase do Romantismo, era colocado como protagonista com o objetivo de aplicar um sentido de pertencimento a terra. O indianismo e o nativismos eram elementos fortes na poesia.
b) Incorreta.
O verbo está flexionado na voz imperativa que indica para que os guerreiros possam ouvir.
c) Correta.
d) Incorreta.
É apresentado uma poesia com o uso de um redondilho menor que se apresenta por meio de sílabas.
e) Incorreta.
Gonçalves Dias é um poeta da época romântico e não um modernista como é afirmado.
f) Incorreta.
O personagem não apresenta medo da morte por isso era alternativa está incorreta.
g) Correta.
h) Incorreta.
O texto de Mário Andrade não apresenta o mesmo sentido quanto ao poema visto que é uma crítica a uma realidade brasileira que ocorria nesse momento.
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Espero ter ajudado.