FLECHA NO ALVO (Walcyr Carrasco)
É incrível o número de pessoas sem rumo na vida. Há três meses cruzei com um amigo na rua, de short e tênis. Mal me cumprimentou e se despediu, com pressa. Era o horário da corrida. Aos 40 anos, decidira manter a forma física. Fazia duas semanas, trotava no Pacaembu no mínimo uma hora por dia. “Em breve estará bem magro” — invejei. Que nada! Dali a algum tempo o vi com a barriga inflada de cerveja.
— E o exercício?
— Parei. Resolvi retomar o piano.
Detalhe: havia deixado a música aos 14, 15 anos. Não entendi a urgência. Da próxima vez, seria outra novidade. Garimpa de emprego em emprego com a mesma falta de estabilidade. Já vendeu antiguidades, foi bancário, ensinou dança de salão, fez pesquisa de mercado. Não é o único caso. Um amigo já entrou em cinco faculdades. Nunca terminou nenhuma. Está no fim do segundo ano de um curso de arte dramática que dura três. Resolveu desistir.
— Quero fazer psicologia.
— Decidiu ser psicólogo agora?
— Não, é para me ajudar a entender os personagens.
— Se quer representar, por que não termina arte dramática?
— Com a psicologia vou atuar melhor.
Que argumento usar contra esse tipo de raciocínio? A pessoa que muda sempre de carreira ou mesmo de atividade não cresce profissionalmente, nem cria laços. É levada pelos ventos da vida. Nem sempre encontra trabalho. Um outro conhecido já foi vendedor de loja chique, produtor de eventos e candidato a deputado estadual nas últimas eleições. Perdeu. Sente-se um injustiçado.
— Não fiz uma boa campanha porque não tive apoio.
— Mas que apoio ia ter, se nunca fez política, nunca trabalhou em movimento social? Nada!
Um olhar ofendido me varou a testa. Há uma semana, na academia, um dos recepcionistas me contou: fez curso de enfermagem, tentou ser cantor sertanejo, estudou arte dramática, mas pensava tentar veterinária. Fui direto ao ponto.
— Você atira para muitos lados de uma só vez. Quem não tem grana de família precisa de foco!
Uma pessoa tem o direito de escolher o próprio caminho, ainda que o preço seja alto. Mas há quem viva pulando de galho em galho, mesmo depois de ter família. Uma conhecida pede algum emprestado todo fim de mês. Alguém sempre acaba dando uma força, por causa das crianças. Ela promete: em breve iniciará um grande negócio. De fato: perdeu uma grana tentando criar chinchilas, quando garantiam que isso faria fortunas. Antes tentou um restaurante vegetariano. Ultimamente receita florais de Bach, mas são poucos os clientes. A terapia anda fora de moda. Seu diploma de assistente social está guardado.
— Por que não tenta um emprego, presta um concurso?
— Ah, eu não sei trabalhar para os outros.
O pior é que, para si própria, sabe menos ainda! Frequente em uma grande cidade como São Paulo, esse tipo fascina-se pelo brilho de todas as profissões, negócios, atividades. Vive migrando. E o tempo passa. Hoje eu encontro amigos cheios de criatividade na juventude que se tornaram pessoas amargas, vivendo de trabalhos abaixo de sua capacidade.
Ainda acredito que na vida moderna é preciso ter foco. A vida tem milhares de possibilidades, mas é necessário apostar em uma. Muitos jovens se deixam atrair por modismos. Há algum tempo milhares queriam trabalhar com eventos. Antes foram os modelos. Agora, há um tsunami de candidatos a DJ. Principalmente nessa época em que tantos se preparam para iniciar uma faculdade, é essencial optar por uma carreira e ser firme na decisão. Com a mira de um guerreiro que atira a flecha e acerta no alvo.
(disponível em http://vejasp.abril.com.br/revista/edicao-2191/flecha-no-alvo)
1. O título do texto refere-se:
a) à dificuldade que as pessoas têm para conseguir um emprego;
b) ao receio que as pessoas possuem de alterar o foco da carreira desejada;
c) à falta de opção que a vida moderna oferece aos indivíduos;
d) à firmeza de decisão que o jovem contemporâneo manifesta;
e) à volubilidade das pessoas em optar por uma carreira definitiva.
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à dificuldade que as pessoas tem para conseguir emprego
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