escreva um texto relatando como os marinheiro atravessaram o oceano atlântico
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Resposta:
Em meados do século XX, o almirante brasileiro Amphilóquio Reis descreveu o batismo da linha do equador recorrendo a personagens e práticas de bordo:
o batismo do mar ... é uso antigo dos marinheiros, em meio de festas, [d]aquele que pela primeira vez transpõe a linha do Equador. Para isso os encarregados do batismo mascaram-se de Netuno, de Tempo e outras personagens; depois de várias perguntas e respostas, um marinheiro, com uma seringa ou mangueira, jorra sobre o neófito tanta água do mar quanto preciso para ficar bem batizado...
Embora afirme tratar-se de 'uso antigo dos marinheiros', Reis não o datou. As referências à festa, à presença de Netuno, às questões feitas aos tripulantes e ao despejo de água sobre os que cruzavam o equador pela primeira vez aparecem aqui como elementos do ritual. Reis registrou a antiguidade da prática e os elementos presentes na sua execução em meados do século XX, mas para conhecer os elementos e suas transformações, o historiador deve visitar outras fontes. Apresentarei aqui um inventário das descrições desse ritual, sem pretensões totalizantes.
Partirei da definição ampla de Burke para o termo ritual, referente à ação que expressa significados, "em oposição às ações mais utilitárias e também à expressão de significados através de palavras ou imagens". O batismo do equador demarcava a integração efetiva dos homens à comunidade marítima. O ingresso dos novatos se dava pelo reconhecimento da experiência no mundo do trabalho, e não pela atribuição de uma alcunha. O ritual ocorria numa zona determinada da terra e nos limites de uma comunidade profissional formada exclusivamente por homens, trabalhadores especializados que permaneciam muitos anos engajados. Para analisar o ritual, reuni evidências de sua persistência entre os marinheiros e da aprovação comunitária que o legitimava. Pouco usual, ele estimulava os curiosos de fora da comunidade a registrá-lo, mas não foi objeto de registro sistemático pelos próprios trabalhadores do mar.
Ginzburg empreendeu uma busca de semelhanças morfológicas nos rituais praticados em tempos e sociedades ancestrais para decifrar eventos da era moderna. Não é o caso, aqui, de esmiuçar tradições em tempos e lugares tão diversos: a longevidade do ritual de travessia da linha é mais curta, pode ser datada mais precisamente e está circunscrita ao Atlântico. Embora a cintura imaginária cruze toda a Terra, não encontrei menção ao batismo de marinheiros ocidentais quando passavam pela linha no Índico ou no Pacífico. Observei, em outra ocasião, que as descrições dos rituais de batismo na passagem do equador contidas nos relatos de viajantes se afiguram estranhas à nossa compreensão. Procuro, agora, ampliar o leque das fontes e o recorte temporal para revisitar o tema, com novas perguntas e em busca de novas respostas.
Debruçando-se sobre vestígios imemoriais, Ginzburg detectou tradições similares em tempos e lugares diferentes e que podem ter informado os inquisidores na construção intelectual do sabá (1991, p.96-101). Os estudiosos da Inquisição têm de contornar filtros ao lidar com a documentação produzida por homens que combatiam 'comportamentos desviantes'. Do mesmo modo, a cultura popular da Idade Moderna vem sendo estudada com base em materiais descritivos coletados por folcloristas do século XIX, fontes valiosas que precisam ser manejadas com cuidado para não repetir seus procedimentos paternalistas, marcados por um abismo de classe e feitas por observadores das 'antiguidades populares' divorciados do contexto.